O MARAVILHOSO NATAL DE CHICO XAVIER


Os Espíritos amigos nos têm ensinado, por muitas vezes, que, ante o Natal, reformulamos os nossos votos de cristianização da nossa vida pessoal e coletiva, diante de Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem nossas vidas estão entregues em nome de Deus, Aquele que, em sua infinita misericórdia, nos conserva junto de Seu coração infinitamente amoroso, como tutelados no planeta terrestre, abençoando-nos, orientando-nos, tolerando-nos as fraquezas e encaminhando-nos para uma vida melhor. 

(...)

Por isso mesmo, o Natal é importante; continuará a ser importante. E embora muitas vezes cercado de incompreensões humanas, o Natal há de ser o coração de Nosso Senhor Jesus Cristo pulsando no mundo, assim como estamos vendo o coração maravilhoso de nosso Divino Mestre palpitando na alegria (...) em festiva comemoração para a passagem do natalício d'Aquele que é o maior amor das nossas vidas.

(Trecho da entrevista de Francisco Cândido Xavier, ao 
programa Pinga Fogo, na TV Tupi-SP, em 21.12.1971)


No inverno de 1945, época do feliz término da Segunda Guerra, o orador e médium baiano Divaldo Pereira Franco, no verdor dos seus 18 anos, acompanhou Chico Xavier, a pedido do mesmo, em visita a uma humilde casa na Lapinha, localidade a alguns quilômetros de Pedro Leopoldo (MG). O lar pertencia a D. Conceição e Lia, neta dela.

Conceição foi amiga de D. Maria João de Deus, mãe biológica de Chico. Dizia-lhe a genitora, que quando a necessidade material fustigava, a mãe lembrava-se de D. Conceição, pois os sofrimentos de D. Maria nunca foram maiores do que os daquela amiga mais carente.




Narrou-lhe Chico que, no Natal anterior, ao ouvir a alegre comemoração no lar vizinho, se sentiu solitário na ocasião. Então, semelhante a um "rei mago de táxi", muniu-se de "prendas" e dirigiu-se ao casebre das amigas carentes.


Ao avistar o tugúrio, testemunhou, com seus olhos de médium, uma luminosidade nimbando o local - fenômeno parecido deve ter ocorrido, há dois mil anos, àquele querido estábulo em Belém da Judá.


À porta encontrava-se, desencarnado, o Apóstolo Mineiro do Espiritismo: Eurípedes Barsanulfo. No entanto, sob a forma de uma de suas existências pretéritas, Rufus, cristão martirizado no ano 172 d.C (ver Ave Cristo, do Espírito Emmanuel, sob a psicografia de Chico Xavier. Por certo, Barsanulfo tinha algum vínculo com elas desde aquela época). O benfeitor saudou o médium:


- Seja bem-vindo, vamos celebrar o Natal de Jesus diante do infortúnio!


Chico só pôde levar parcos víveres: alguns biscoitos e uma bebida de chocolate preparada por ele. Contudo, por mais nababesco que fosse, nenhum banquete natalino superaria a luz espiritual emanada por aquela ceia extremamente simples.

Agora, naquele período frio do ano de 1945, o grande médium mineiro esclareceu Divaldo, que D. Conceição visitou-o espiritualmente (através de desdobramento durante o sono), enquanto estava psicografando no Centro Espírita Luiz Gonzaga.

A senhora, que apresentou-se em nobres vestimentas espanholas do século XVII, clamou por auxílio ao amigo médium. Fisicamente ela e a neta padeciam pela fome e doença. A ajuda era urgente, porque a "tarefa terrestre" de ambas, informou a própria, ainda não havia terminado (ler o passado de D. Conceição e Lia no final desse texto).



Três amigos da alta sociedade paulistana foram com Divaldo e Chico: o Sr. Francisco Pereira de Andrade (um dos diretores do Banco do Estado de São Paulo), a esposa dele e a irmã desta.

A choça situava-se no alto de um outeiro. Uma senhora nonagenária recebeu-os, era D. Conceição. Arroxeada de frio, estava descalça e coberta apenas com um fino vestido em farrapos. Podiam escutar o vento entrando pelas frestas, que parecia zombar daquela pobreza extrema.

- Ô, Seu Chico! Ontem à noite eu sonhei com vós. Sonhei que estava com vós lá no centro, e pedi, pelo amor de Deus, um pouco de comida! - disse sorridente D. Conceição.




Observando aquela velhinha tiritando de frio, e recordando o exemplo da lenda de São Martinho de Tours (que cortou parte de sua capa para cobrir um mendigo nu), a Senhora Andrade retirou o valioso casaco de pele e cobriu D. Conceição, que nem de longe imaginou o preço daquele traje.

Ouviu-se um barulho dentro. Era Lia, mulher por volta dos 40-50 anos, que jazia num catre feito de varas e palhas (quase uma manjedoura). Tinha o corpo físico deformado, com a exceção da cabeça. Cega, surda e muda, mas conseguia captar, mediunicamente, as vibrações salutares de Chico Xavier.



Não conseguindo controlar as funções fisiológicas, a mulher, emocionada, expelia vômitos e fezes. Ao retornar do recinto, onde fora atender a neta, D. Conceição exibiu repulsiva nódoa no casaco de pele causada por uma golfada de Lia. Chico, sempre bem humorado, ressaltou à Conceição que Lia havia "tirado o selo" do casaco.

Ao entrarem naquele quarto simplório, a avó retirou a surrada coberta de Lia, expondo, aos impressionados novos visitantes, um corpo retorcido e nu de apenas seis palmos de comprimento (c.1,32 metros). Porém, a pobre, feliz, ria em escarcéu.




Chico recobriu-lhe, afirmando que ela sentia pudor, e começou a cantar para acalmá-la. Depois, com tesouras, aparou as unhas e os cabelos desgrenhados de Lia. A canção de ninar de Chico, para o enternecimento de todos, levando-os às lágrimas, fizeram-na adormecer.

O condoído Sr. Pereira de Andrade, um dos provedores da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, propôs levar ambas para serem acolhidas na venerável instituição.

Chico, detentor de sabedoria inspirada pelo Alto, aconselhou-lhe com os olhos baços d'água:

- Andrade, Deus abençoe-lhe a prodigalidade! Mas se Deus colocou-as aqui, é porque elas devem expungir aqui.



Chico sentia que caso fossem transferidas, logo desencarnariam (sabia que uma "seguiria" a outra em menos dez dias, através de causas naturais). O amor entre elas era tão forte e unido, que uma "sustentava" a outra.

Entretanto, o médium propôs ao ilustre amigo que contratasse uma pessoa de confiança para auxiliar na limpeza, junto a um pequeno recurso pecuniário a fim de comprar apenas o necessário para não morrerem de fome.

O Sr. Pereira de Andrade anuiu, já que Chico, com seus parcos rendimentos, já auxiliava muitos outros irmãos necessitados.





***
Em março de 1946 (no ano anterior da fundação da Mansão do Caminho, em Salvador-BA), quando Divaldo retornou a Pedro Leopoldo, o amigo mineiro avisou-lhe que, dessa vez, as amigas haviam visitado Chico.


No Natal do ano passado, durante uma psicografia em reunião, o Espírito Dr. Bezerra de Menezes alertou Chico que Lia estava em processo de desencarne.

Chico rapidamente deixou o centro espírita e dirigiu-se, com um amigo, à Lapinha (sugestivo nome que nos relembra a lapa, onde nasceu o Menino Jesus). Seus "ouvidos mediúnicos" desde longe captaram vozes angelicais que entoavam:

- Ave Cristo, aqueles que irão viver a vida eterna homenageiam e saúdam-Te!



Chegaram no exato momento em que seres luzentes - o próprio Dr. Bezerra e uma plêiade de Espíritos amigos - resgatavam do combalido corpo o Espírito de Lia, livre da expiação no retorcido cárcere carnal.

Logo em seguida, a visão mediúnica de Chico ainda divisou um rasto de luz em direção do zimbório.

No dia seguinte, sepultaram os despojos de Lia. Por conselho do Dr. Bezerra, Chico levou consigo, para Pedro Leopoldo, a entristecida e saudosa D. Conceição, que foi instalada em modesto quarto alugado em viela próxima à casa do médium.


Como Chico havia previsto, oito dias após, Dr. Bezerra anunciou-lhe que a partida de Conceição ao Plano Espiritual havia chegado.


A Natividade (séc. XVII), dos irmãos Le Nain.

Nos primeiros dias de 1946, Chico vislumbrou, descendo do céu, verdadeiros diamantes sobre o humilde aposento de D. Conceição. Cânticos eram entoados por coro infantil.

Em meio às luzes, estava Lia, sob a forma perispiritual de encantadora senhora em vestes da nobreza espanhola de tempos remotos.

Divaldo lembrou-se que, na ocasião da visita que fizera ao casebre, Chico descreveu a face de Lia como sendo de uma donzela deslumbrante. 


Agora o bom mineiro comparava-a à personagem Gilda (interpretada pela atriz americana Rita Hayworth), cujo filme havia estreado recentemente (em fevereiro de 1946) nos EUA. 


Divaldo, contudo, observou que Chico, inocente, devia ter exagerado, pois o rosto de Lia era normal, e em nada lembrava a belíssima Gilda de Hollywood. 


Todavia, aquele médium quase cego - que sempre enxergou além das aparências - não havia exagerado em sua descrição anterior: a "verdadeira Lia" era, provavelmente, mais bela do que a sensual Gilda do cinema.

Diante do corpo trêmulo e moribundo da anciã, Lia desatou os últimos laços que uniam o Espírito da avozinha à frágil carne. Tomou D. Conceição nos braços e, depois de acenar ao médium benfeitor, elevou-se à Imortalidade.

Cinco anos mais tarde, ao ser lançado o livro Falando à Terra (ed. FEB), no qual estão mensagens psicografadas de diversos vultos - como Rui Barbosa, Medeiros e Albuquerque, e o grande espírita mineiro Cícero Pereira -, há também uma mensagem de D. Conceição, que, por fim, adentrou na Coorte dos Justos.



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O Passado de D. Conceição e Lia


Nos idos de 1870, época do boníssimo imperador brasileiro D. Pedro II e último período da escravatura, um rico fazendeiro residia em Curral D'el Rey - local onde, mais tarde, foi fundada a capital mineira: Belo Horizonte.

O fazendeiro apaixonou-se por uma moça de apenas quinze primaveras muito bela, pertencente também a uma favorecida família de proprietários de terras.

Os arcaicos costumes da época não davam oportunidades para que o casal de namorados se conhecesse melhor. A donzela só encontrou o rapaz em duas ocasiões: no noivado, na casa dos pais dela, e no casamento.




Infelizmente, logo na noite de núpcias, a jovem esposa percebeu que o marido era um sociopata, visto que a violentou. 


Com o passar do tempo, o ciúme mórbido dele chegou ao ponto de queimar as partes íntimas da esposa com brasa. 


Mesmo assim, a sofrida jovem tornou-se mãe e dedicou-se inteiramente à filha tão cara.

A menina cresceu e, entre os anos de 1890 e 1900, consorciou-se com outro fazendeiro e partiu. A mãe só retornou a rever a filha, para ajudá-la no parto da neta.

Quando a criança veio à luz, a parteira a apresentou à jovem mãe, a qual foi tomada por uma crise histérica: o bebê, apesar da cabeça normal, apresentava o corpo deformado.


Natividade (1597), de Federico Barocci.

A mãe, em loucura, tomou a criança, ainda ligada à placenta, e a jogou janela à fora. Felizmente estavam no térreo, e a queda do bebê foi amortecida pela relva.

A avó acudiu rapidamente a neta, seccionando ela mesma o cordão umbilical (muitos anos depois, a neta devolveria o favor, desatando o "cordão da vida carnal" da avó). Porém, também tomada pelo desvario, aos gritos correu com a criança mata a dentro, para não mais retornar ao seio familiar.

A avó era D. Conceição, a neta era Lia. Ambas deambularam por aldeias mineiras distantes, contando, às vezes, com o auxílio de almas caridosas, a exemplo de Chico Xavier, para não morrerem de fome. Por fim, estabeleceram-se na mansarda da Lapinha.



A mediunidade de Chico esclareceu que D. Conceição, em uma reencarnação pretérita, foi mãe de certo vulto histórico, na corte de Filipe II (1527-1598), ligado a vários crimes hediondos da Inquisição espanhola e Lia foi irmã de tal cruel vulto.

A poderosa família delatava, com inverdades, pessoas para serem levadas ao Tribunal do Santo Ofício, o qual despedaçava seus corpos mediante torturas, para que, assim, pudesse receber os bens desapropriados dos condenados.


Portanto, a história de Conceição e Lia alerta-nos sobre a responsabilidade de nossos pensamentos e atos perante os resgates reencarnatórios: a justa Lei de Causa e Efeito.


Francisco Cândido Xavier (1910-2002).

Fonte: Palestra de Divaldo Pereira Franco, em 27 de julho de 2002, no Auditório Araújo Vianna, Porto Alegre (RS).

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