ORIGENS E HISTÓRIA DA REPÚBLICA DO BRASIL



... estes quinhentos anos assistiram a transformações mirabolantes, mas o que não tem mudado nestes cinco séculos é que a colônia, depois o país, funcionaram sempre em favor de uma pequena minoria que está no topo da sociedade [...] e contra a imensa maioria da população.

[Ciro Flamarion Cardoso, professor titular de história da UFF, ao prefácio de História do Brasil, de Vicentino e Dorigo]

REFLEXÃO SOBRE A REPÚBLICA

Discute-se muito se os mocambos palmarinos, as missões guaraníticas ou as povoações cabanas podem ser chamadas de repúblicas. Mas certamente a república de Bernardo Vieira de Mello, em Pernambuco, a república dos inconfidentes mineiros e baianos (século XVIII), a república socialista utópica dos praieiros republicanos (século XIX) e a república revolucionária de esquerda clandestina (século XX) são exemplos de ideias republicanas que não se concretizaram. Já as transitórias repúblicas pernambucanas de Domingos José Martins e do frei Caneca, as transitórias repúblicas baianas do Guanais e do Dr. Sabino e as transitórias repúblicas farroupilhas no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina (século XIX) são exemplos de repúblicas de concretização efêmera. E há ainda os que falam numa "experiência republicana" durante a época das regências (século XIX). E, finalmente, se pode falar também nas repúblicas de curta duração e de caráter especialíssimo, como a república acreana (de Plácido de Castro), a república de Princesa, na Paraíba, e a república paulista constitucionalista (século XX).

Cabe perguntar se todas estas repúblicas que não foram pertencem à chamada história dos vencidos ou se são apenas dissidências na história dos vencedores.

[José Luiz Werneck da Silva, 06.05.1985]

O presente texto busca, através desse relato histórico sobre o surgimento da nossa República, trazer à pauta de discussão as causas da situação atual do país. 

Em uma época na qual a "globalização" traduz-se, dentre outros aspectos, em concentração de renda e abismo econômico e tecnológico entre nações mais desenvolvidas e menos desenvolvidas, ou centrais e periféricas, a análise sobre a construção do Brasil republicano expõe as raízes de nossas limitações históricas.

Segundo o jornalista e escritor do best-seller 1889 (Globo Livros, 2013), Laurentino Gomes, a falta de prestígio à Proclamação da República Brasileira se deve a forma como ela foi implantada. Há um afastamento entre o discurso republicano e a prática republicana.

A República foi instituída através de um golpe de Estado, e logo após foi instaurada uma ditadura militar com Deodoro e Floriano. Quando o regime passou para as mãos dos civis, o status quo do extinto Império permaneceu sem alterações radicais: aristocracia rural no comando do país, voto de cabresto, coronelismo e fraude eleitoral ainda existiam, a maior parte da população era analfabeta, os ex-escravos não possuíam apoio algum do Estado e sociedade civil etc.

Quando o conturbado período dos primeiros presidentes militares chegou ao fim, com a eleição do civil Prudente de Morais, verificou-se que a República brasileira mantinha uma prática monárquica: um chefe de Estado oriundo da tradicional aristocracia rural apoiado pelos antigos barões do café do falecido Império.


O desprestígio, portanto, vem da demora histórica da República em cumprir as promessas do discurso civil.

Esperamos que esse relato estimule as gerações futuras ao desenvolvimento de mudanças verdadeiras e profundas, que possam diminuir desigualdades e injustiças, como as exclusões sociais. As mudanças contemporâneas aboliram a casa-grande e a senzala, mas trouxeram a mansão e a favela. Lendo o presente relato, notamos que as oligarquias, tradicionais ou novas, ainda existem.

Sob as Barbas do Imperador: os Antecedentes

D. Pedro II na abertura da Assembléia Geral (3 de maio de 1872), de Pedro Américo.
Acervo do Museu Imperial, Petrópolis (RJ).


...um soberano de índole democrata, simples, honesto, trabalhador, generoso e sem afetação [...]. Aprendeu dezessete idiomas, dentre eles: inglês, francês, alemão, italiano, espanhol, latim, grego, árabe, hebraico, [sânscrito] e tupi [...]. Sabia ler os hieróglifos egípcios. Versado em ciências e artes, escreveu poesias, artigos e traduções. Fé de Ofício, produção de sua lavra, [...] revela sua fé de peregrina beleza cristã.

De 1848 em diante reinou a tranquilidade em todo Brasil, graças à colaboração pacificadora do Duque de Caxias. Deu todo o apoio à elite agrária do café, conseguindo com isso que o país fosse o maior produtor mundial, sendo a rubiácea a responsável por 88% da renda da economia nacional. Deve-se ressaltar que D. Pedro deu muito pouco ou nenhum apoio aos industriais, fazendo assim o desejo dos cafeicultores, de que o país se dedicasse apenas à agricultura e mantivesse ainda por muitos anos o braço escravo. Mesmo assim, ele conseguiu que o Brasil alcançasse considerável progresso e se projetou no conceito das nações civilizadas.

Dentre suas conquistas, algumas vencendo grandes resistências internas, ressaltamos as seguintes: supressão do tráfico de escravos em 1850, atendendo às pressões da Inglaterra; a construção da primeira estrada de ferro da América Latina, em 1854, iniciativa do Barão de Mauá; a primeira linha telefônica da América Latina, em 1879; os três convites para árbitro de importantes litígios internacionais [...].

[...] Em nenhum momento o Imperador usou de sua vasta cultura para solucionar [...] problemas, deixando tudo nas mãos de políticos que só complicaram ainda mais o frágil sistema do governo imperial.
[...]
O soberano filósofo tinha por predileção o estudo e a leitura. Suas feições morais o faziam repudiar os favoritos [da corte] e ter natural aversão pelos turibulários [bajuladores]. Compreensivo e equilibrado, colocava acima de tudo o dever.

[Trecho do artigo "Os 120 anos da morte de D. Pedro II, o maior brasileiro do século XIX", do Prof. Milton Teixeira, em Folha Cultural, Rio de Janeiro: edição nº 124, dez. 2011, pp. 8-9, com adições]

Fotos de D. Pedro II por volta do 61 anos (c.1887).


Em algumas cartas particulares que D. Pedro II enviava à Condessa de Barral, grande paixão do soberano, o regente confessa que preferia ser presidente da república do que imperador, porém imaginava que o Brasil ainda não estava preparado para tal mudança. Era um monarca de alma republicana.

D. Pedro II teve que amadurecer muito cedo, a fim de começar a governar o país com apenas 15 anos. O soberano brasileiro era conhecido internacionalmente. Visitava a Europa e as exposições universais, correspondia-se com personalidades, como Júlio Verne, Richard Wagner, Victor Hugo, Charles Darwin, Louis Pasteur e Graham Bell. A monarquia promoveu a imagem de um soberano comprometido com o progresso e o desenvolvimento científico, mas na prática reinava um país retrógrado, a exemplo dos milhões de escravos e analfabetos. Às vésperas da Proclamação da República era um imperador senil, doente (diabético) e cansado de ficar no trono por quase meio século.

O imperador visitou quase todos os cantos do país para promover algumas melhorias ao longo da sua regência. Porém, a modernidade (iluminação a gás, telégrafo, telefone, ferrovias, escolas públicas etc.) foi mais observada nas cidades onde a Corte residia, Rio de Janeiro e Petrópolis-RJ. As demais localidades pouco se desenvolveram desde a época da colonização. As primeiras universidades brasileiras, por exemplo, só surgiram nos anos de 1910 (durante a República).

Para garantir o trono, D. Pedro II tinha que agradar as tradicionais elites dominantes, que eram retrógradas: aristocráticas, agrárias, latifundiárias-monocultoras e escravocratas.

***
O Imperador empenhou-se em conciliar os interesses das elites. Adepto de rígida disciplina, perseguia os políticos acusados de "conduta moralmente irregular".

Considerava-se o funcionário público número 1 do Brasil, cumprindo com zelo suas obrigações burocráticas. Nas horas vagas, dedicava-se à leitura, granjeando fama de erudito e protetor de artistas e intelectuais, correspondendo-se no exterior com personalidades como Pasteur e Wagner.

Preferindo "governar e não reinar", D. Pedro amparou-se num regime parlamentar inspirado nos moldes ingleses. O Imperador nomeava o presidente do Conselho de Ministros, e este escolhia o Ministério, compondo o Poder Executivo. Nas eleições, restringindo o direito de voto e recorrendo à fraude, as elites agrárias compunham a Câmara, que desempenhava - junto com o Senado vitalício - o Poder Legislativo. Quando havia divergências entre o Gabinete e a Câmara, o Imperador dissolvia-os, exercendo o poder moderador [garantido pela Constituição de 1824].

Revezando gabinetes moderados de conservadores e liberais [dois partidos formados por uma mesma elite de fazendeiros, comerciantes, militares e profissionais liberais], reinou por quase cinquenta anos. A relativa estabilidade política de seu governo só seria abalada na década de 1870, quando o país começou a sentir os efeitos da Guerra do Paraguai.

[Nosso Século Brasil, vol. 1, p. 18, com adição e modificação] 

Entre 1864 a 1870, o longo Segundo Império ou Reinado (1840-1889) começou a sofrer abalos que levaram-no ao fim. Os artífices, como o esperado, foram os mais fortes setores da sociedade brasileira do século XIX.


Bandeira do Segundo Reinado (original do acervo do Instituto Histórico da Bahia) com bordados em ouro e prata. Notam-se que o losango amarelo, o fundo verde e os ramos de café e tabaco, antigas riquezas agrárias, ainda persistem na bandeira nacional e no brasão da República atual. Todos esses elementos surgiram oficialmente após a Independência (1822).

CANA: AÇÚCAR E CACHAÇA

Entre o século XVI e XIX, até serem substituídos pelo café, como principal produto agroexportador, o açúcar da cana era enviado à Europa e o tabaco era trocado por escravos negros na costa da África. A cana-de-açúcar, nativa da Ásia, foi trazida por Gonçalo Coelho em 1502. Além do açúcar, a cana produz a aguardente ou cachaça, que passou a ser considerada um símbolo de resistência nacional, já que, durante o período colonial, sua produção e comercialização foram restringidas para favorecer a aguardente portuguesa (bagaceira). Conta a história que Tiradentes, em seu último desejo, quis beber um pouco da cachaça Boavista, que até hoje é produzida nos alambiques da família dele.



O OURO NEGRO EM BEBIDA
(a história do café, da África e Arábia ao Brasil)

A bebida café é produzida através da infusão de sementes (previamente torradas e moídas, e que pode ser misturada com leite, açúcar e chocolate) do fruto da planta cafeeira (as principais espécies comerciais são a Coffea arabica e a Coffea canephora ou robusta) que é de origem africana. Os primeiros cultivos, há 1000 anos, originaram-se nas terras altas da Etiópia, já que a planta necessita de temperaturas tropicais amenas para desenvolver-se. A bebida sempre foi bastante procurada pela presença do estimulante cafeína (mesma substância encontrada no nosso nativo guaraná natural, e que já era apreciada há séculos por alguns indígenas brasileiros).

O café foi produzido e distribuído em escala comercial inicialmente pelos árabes. No século XVI, foi plantado nas montanhas do Iêmen e chegou à Europa com o nome "moca" (a primeira cidade árabe donde veio). No século seguinte, os holandeses encabeçaram o comércio mundial e plantaram em suas colônias nas Índias Orientais (Índia, Java etc.) e Ocidentais (Caribe e Guiana Holandesa). Logo a bebida estimulante "caiu no gosto" dos luso-brasileiros que residiam ou comercializavam na maior colônia de Portugal, o Brasil.

Os primeiros pés de cafeeiro brasileiros foram plantados no século XVIII por, segundo conta a tradição, Francisco de Melo Palheta, em 1727, no Pará. O militar paraense (uma marca brasileira de café, que ainda é comercializada, utiliza sobrenome dele) trouxe mudas e sementes da Guiana Francesa. A partir daí, o cultivo do café foi difundido timidamente no litoral brasileiro, rumo ao sul, até chegar à região do Rio de Janeiro, por volta de 1760.

Entretanto, sua produção em escala comercial para exportação ganhou força apenas no início do século XIX. Tal dimensão de produção cafeeira só foi possível com o aumento da procura do produto pelos mercados consumidores da Europa e dos EUA.

A produção do café no Brasil expandiu-se a partir da Baixada Fluminense e do Vale do Rio Paraíba, que atravessa as províncias do Rio de Janeiro e de São Paulo. A cafeicultura no Brasil beneficiou-se da estrutura escravista do país, sendo incorporada ao sistema "plantation", caracterizado basicamente pela monocultura voltada para a exportação, a mão de obra escrava e o cultivo em grandes latifúndios.



Nessa região do Brasil, a produção cafeeira beneficiou-se do clima e do solo propícios ao seu desenvolvimento. O fato de ser rota de transporte de mercadorias entre o Rio de Janeiro e as zonas de mineração contribuiu também para a adoção da lavoura cafeeira, já que parte das terras estava desmatada, facilitando inicialmente a introdução das roças de café e beneficiando o escoamento da produção através das estradas já existentes.

Os capitais iniciais para a produção do café vieram dos próprios fazendeiros e comerciantes, principalmente os que conseguiram acumular capital com o impulso econômico verificado após a vinda da Família Real ao Brasil, a partir de 1808.

No início, as sacas de grãos de café eram transportadas geralmente por mulas e jumentos. A construção de ferrovias para o transporte do café aumentou a velocidade do transporte e interligou algumas regiões do Império, principalmente após a expansão das lavouras para as terras roxas localizadas no chamado Oeste paulista, intensificada após a década de 1860. Tal situação levou ainda ao fortalecimento do Porto de Santos como principal local de escoamento da produção.

Em 1836 e 1837, a produção cafeeira superou a produção açucareira, tornando o café o principal produto de exportação do Império. Os grandes latifundiários produtores de café, os chamados “barões do café”, enriqueceram-se e garantiram o aumento da arrecadação por parte do Estado imperial.

Surgiram ainda os chamados comissários do café, homens que exerciam a função de intermediários entre os latifundiários e os exportadores. Além de controlarem a venda do produto, garantiam aos latifundiários acesso a créditos para a expansão da produção e também viabilizavam a compra de produtos importados.

O café foi, dessa forma, um dos principais esteios da sociedade brasileira do século XIX e início do XX. Garantiu o acúmulo de capitais para a urbanização de algumas localidades do Brasil, como Rio de Janeiro, São Paulo e cidades do interior paulista, além de prover inicialmente os capitais necessários ao processo de industrialização do país e criar as condições para o desenvolvimento do sistema bancário.

Fontes:

http://www.brasilescola.com/historia/o-cafe-no-brasil-suas-origens.htm


http://www.chabad.org.br/biblioteca/artigos/cafe/home.html


A monarquia foi por muitas décadas uma solução provisória para atender os interesses das elites dominantes do passado. Quando deixou de realizar seu papel de forma eficiente, foi substituída pelas mesmas elites que antes a defendiam.

O Abalo do Clero Católico

Tudo começou com o choque entre Igreja e Estado: a prisão dos bispos de Olinda e Belém, por não acatarem a norma de D. Pedro II (que era maçom) em manter membros da maçonaria nos setores eclesiásticos (prática proibida pelo Papa Pio IX). Os bispos foram logo anistiados, porém o acontecimento pôs muitos religiosos contra o Imperador. O clero nada mais fez para manter a monarquia.


Casamento de Escravos de um Família Rica (c.1820), de Jean Baptiste Debret.
A vida da sociedade brasileira passava obrigatoriamente pelas mãos da Igreja Católica, que por séculos foi a religião oficial do país. Grande parte da educação e administração pública esteve sob a responsabilidade do clero, como a oficialização de nascimentos (através dos batizados), casamentos e falecimentos, todos registrados em livros mantidos em paróquias e demais locais (após a proclamação da República, surgiu o Estado laico, separado da Igreja, responsável oficial de tais registros civis, através de cartórios). Muitos clérigos também detinham cargos públicos, os quais, por vezes, pouco se ocupavam com os ofícios religiosos. Por isso havia uma influência política decisiva deles sobre as demais autoridades e a população em geral (fiéis). Nessa época, fazia-se política nas homilias do púlpito.

MAÇONARIA, AS SOCIEDADES SECRETAS INFLUENCIANDO OS RUMOS DO BRASIL


Inspirado pelos ventos da Revolução Francesa, da independência da América do Norte e das Guerras Napoleônicas, que varreram por algum tempo da Europa o absolutismo, a Maçonaria brasileira tentava atrair o então príncipe regente. Se alguns elementos maçônicos sonhavam com a implantação da República no Brasil, a maioria achava que a independência definitiva de Portugal se daria de maneira menos traumática se contasse com a simpatia de dom Pedro (I), por isso buscou envolvê-lo na causa.

(...)

O Apostolado da Ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz foi fundado por José Bonifácio em 1822, com o objetivo de defender a integridade do Brasil e lutar por sua independência. Porém o propósito primordial era combater o grupo de Gonçalves Ledo, que, se a princípio havia aceitado a monarquia constitucional como caminho rápido para a separação, acalentava o sonho republicano.

(...)

... a Bucha (uma antiga facção maçônica fundada por alunos e mestres na Faculdade de Direito de SP), (era) a sociedade secreta que, para muitos, por quase cem anos ajudou a governar os destinos do Brasil.

(...)

Durante o Império, entre os “bucheiros”, havia políticos, artistas e intelectuais destacados, como Castro Alves, Álvares de Azevedo, o Barão do Rio Branco, o Visconde de Ouro Preto, entre outros. Após a queda do Império, em 1889, foi instituída uma comissão, apelidada de Comissão dos Cinco, encarregada do anteprojeto da Constituição Republicana.

(...)


Embora os ideais liberais levados para as Arcadas por Líbero Badaró e Júlio Frank tenham servido de norte para a criação da Bucha, inspirando seus membros a lutarem pelo abolicionismo e pela República, à medida que os ardores juvenis arrefeciam e seus integrantes passavam a pertencer ao establishment, alguns transformaram-se em conservadores, defendendo a monarquia e a escravidão.

Na República Velha, acredita-se, não havia ministro, juiz ou mesmo candidato à presidência da República que tomasse posse, ou fosse indicado, sem prévia deliberação do Conselho dos Divinos. A filantropia inicial, a ideia de ajuda mútua, acabou se corrompendo e desaguou no franco favorecimento para obtenção de cargos públicos. Segundo o professor Miguel Reale, em suas memórias: “Como toda sociedade secreta, [a Bucha] logo se degenerou em cadeia de privilégios, que começava na faculdade pela seleção dos catedráticos e terminava nos acordos ‘café com leite’ entre ex-alunos de São Paulo e Minas Gerais, sob a batuta do Senador [do Rio Grande do Sul] Pinheiro Machado, também diplomado pelas Arcadas, e que, sutilmente, preferia ser a eminência parda dos eventos republicanos”.

Nos primeiros 40 anos da República, do governo dos militares Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto à política do café com leite, bacharéis formados por uma das duas academias de Direito e membros da Bucha destacaram-se como ministros ou chefes do Executivo. Dos 14 presidentes eleitos da República Velha, oito eram da sociedade: Prudente de Morais, Campos Sales, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Venceslau Brás, Artur Bernardes, Washington Luís e Júlio Prestes, que não chegou a ser empossado por causa da Revolução de 1930.

(...)

Com a Revolução de 1930, que pôs fim à República Velha, chegou ao poder Getúlio Vargas. Data daí o declínio da Bucha. Adhemar de Barros, interventor do estado de São Paulo, teria colocado as mãos em uma lista parcial de membros da Bucha no final dos anos 30 e se apressou a apresentá-la a Getúlio. Segundo o político Carlos Lacerda, o presidente leu atentamente a lista e a devolveu para Adhemar, dizendo: “Não se pode governar o Brasil sem essa gente, o senhor que entre para a Burschenschaft (Confraria de Camaradas, em alemão, pois esse grupo maçônico paulista era inspirado nas confrarias alemãs)”.

(...)

Entre (...) membros (da confraria secreta E.S.P.A.R.T.A, um ramo da Burschenschaft criada nos anos de 1950), estariam proeminentes figuras acadêmicas, como Perseu Abramo, Florestan Fernandes e Fernando Henrique Cardoso, os dois primeiros fundadores do PT, e o último, do PSDB. Juntos, esses partidos têm se mantido há 20 anos no poder. Seus políticos, em alguns momentos, uniram-se a uma causa comum, como quando o então líder sindical Lula apoiou a campanha política de FHC para o Senado, em 1978, chegando, até, a representá-lo em alguns comícios.

A matéria completa: 
http://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/acervo/sociedades-secretas-brasil-lado-oculto-poder-806578.phtml#.VW760c9Viko


O Abalo dos Escravocratas

Em 1845, através da lei Bill Aberdeen, a Marinha britânica - a mais poderosa armada do século XIX - recebeu poderes para apreender qualquer navio negreiro que zarpava da África rumo ao Brasil. Essa foi a retaliação pela não renovação dos tratados de 1810, que garantiam amplas vantagens à Inglaterra no comércio com o Brasil.

A abolição da escravidão no Brasil foi muito desejada pelas nações industrializadas, visto que 80% da população era formada por cativos sem significativo poder de compra. Porém, o país ainda manteve a escravatura como principal mão-de-obra por muitas décadas, e, vergonhosamente, foi o último país americano a aboli-la.

Atendendo as pressões dos britânicos (donos das empresas instaladas no país que detinham a maior parte das exportações), o Governo Imperial Brasileiro assinou, em 1850, a Lei Eusébio de Queiroz, que cessou o abastecimento de escravos africanos para o Brasil.


Uma das primeiras fotografias do Palácio de São Cristóvão (c.1869-78), residência de D. Pedro II no Rio de Janeiro (RJ). Nela percebe-se que os escravos negros, cuidando do jardim, simbolizavam a base da força de trabalho do Império Brasileiro.

O nome do bairro carioca de São Cristóvão se deve à igrejinha dedicada ao santo erguida pela Companhia de Jesus junto à praia da Baía de Guanabara (hoje aterrada) habitada apenas por alguns pescadores. Com a expulsão dos jesuítas em 1759 e a chegada da Família Real em 1808, a região antes destinada à agricultura e à pecuária foi retalhada e dividida em chácaras, então adquiridas por ricos comerciantes. A Quinta pertencia ao riquíssimo comerciante português Elias Antônio Lopes, que havia feito erguer, por volta de 1803, um casarão sobre uma colina, da qual se tinha uma boa vista da parte mais interior da baía de Guanabara – o que deu origem ao atual nome da Quinta.
Fonte: http://diariodorio.com/nome-dos-bairros-do-rio-de-janeiro/


 Escravos na secagem do café no atual bairro carioca de Jacarepaguá, em 1882.


Fazenda de café na região do atual bairro carioca de Quintino (c.1865).

As fotos acima são provas das velozes e radicais mudanças do urbanismo que atingiram antigas zonas rurais do Rio de Janeiro-RJ, a partir do século XX.

Porém, o tráfico negreiro, apesar do franco declínio, continuava ilegalmente e entre as províncias (do decadente Nordeste para o Centro-Sul). O governo, então, aos poucos deu seguimento ao processo de libertação dos escravos com as leis do Ventre Livre (1871) e do Sexagenário (1885).

Em 1875, uma crise econômica mundial abaixou os preços do café, iniciando um período de instabilidade econômica e política, agravada pela enorme dívida com a Inglaterra, que havia emprestado capitais para financiar a Guerra do Paraguai. A crise enfraqueceu os poderes conservadores do Império e abriu caminho para futuras e significativas mudanças.

A Lei Áurea (1888) assinada pela filha do monarca, contrariou diversos membros da arcaica cafeicultura e demais elites agrárias escravistas, que não foram indenizadas após a libertação dos negros cativos.


A Princesa Isabel, católica fervorosa, mantinha relações estreitas com a Igreja, a qual na época divulgava o movimento ultramontanista (pensamento centralizador, que defendia o pleno poder papal, e era contrário às reformas nacionais, como por exemplo, a criação de Estados laicos). Caso ela subisse ao poder permanentemente, representaria, segundo alguns, grande obstáculo às mudanças civis. Os republicanos também acreditavam que a princesa era mero fantoche do marido, o estrangeiro Conde d'Eu (quando em viagem, o Conde enviava-lhe cartas instruindo detalhadamente o que fazer durante o dia, ordens que ela acatava).


Pena de ouro com estojo ofertada à Princesa Isabel pela assinatura da Lei Áurea.
Acervo do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro (RJ).

A Princesa Isabel aboliu a escravatura no Brasil como regente interina (D. Pedro II havia se afastado do trono em viagem à Europa). A norma tinha fins humanitários e econômicos (principalmente por parte dos países industrializados, que precisavam de mais mercados consumidores para vender seus produtos). A Lei Áurea, contudo, não aboliu a desumana exploração dos negros libertos, pois não determinou leis trabalhistas complementares (até hoje há pessoas trabalhando sob regime escravo ou semi-escravo). A escravidão do negro hoje é ideológica e velada.

Compreender o que está por trás da permanente degradação da imagem da população negra em todos os espaços sociais, em especial na propaganda e nas mídias em geral, não é tarefa simples. Os quase 400 anos de escravidão da população negra nos deixaram marcas profundas e presentes até hoje. O brilhante trabalho de Carlos Augusto de Miranda e Martins, intitulado “Negro, publicidade e o ideal de branqueamento da sociedade brasileira”, nos ajuda a compreender:

Fato é que, ao valorizar a cultura e o biótipo europeu ao mesmo tempo em que escamoteava e estigmatizava os componentes negros da sociedade, o Brasil acabou por criar um registro branco de si mesmo, estabelecendo um modelo de representação no qual os brancos passaram a concentrar todas as características positivas possíveis, enquanto o negro tornava-se a negação de tudo isso. E esse registro tornou-se um instrumento de dominação que atravessou o século e chegou, remodelado, aos dias de hoje: O aparelho ideológico de dominação da sociedade escravista gerou um pensamento racista que perdura até hoje.

Como a estrutura da sociedade brasileira, na passagem do trabalho escravo para o trabalho livre, permaneceu basicamente a mesma, os mecanismos de dominação inclusive ideológicos foram mantidos e aperfeiçoados 

(MOURA, 1988, p.23).

Isso significa, portanto, que a perpetuação de imagens negativas do negro durante o século XX contribuiu para a manutenção de uma hierarquização social não mais garantida pela escravidão, e sim por fatores econômicos.

O novo século assiste ao desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, que por nascerem já orientados pelos padrões eurocêntricos forjados no século XIX, acabaram por substituir os antigos instrumentos de performatização das representações sobre o negro, tornando-se, então, mecanismos atualizados de dominação.

Isso implicou também na atualização das representações. As imagens do escravo bom e fiel, do negro violento e degenerado e mesmo o exótico-bestial tão presentes na produção cultural oitocentista aparecem na mídia reelaboradas e transformadas, por exemplo, no trabalhador braçal, no criminoso, no sambista.

A mídia não somente atualiza a distância que separava, na escravidão, a elite do povo, mas nega, com seu exclusivismo, as identidades culturais afro-brasileira e indígena, as quais não têm acesso, em pé de igualdade, às programações televisiva e radiofônica 

(D´ADESKY, 2001, p. 93-94).

Fonte: http://negrobelchior.cartacapital.com.br/2013/09/16/puc-pr-vestibular-publicidade-e-racismo/

BRASIL, UMA HISTÓRIA INCONVENIENTE

Enquanto a população de negros nos EUA aumentava, por muito tempo, o número de negros no Brasil, apesar de ser maior em termos de importação, se manteve estável, visto que a expectativa de vida deles era mínima (os africanos traficados sobreviventes viviam em média seis anos, os nativos por volta de apenas 20 anos). 

Visão do período da escravatura brasileira por um documentário do canal de TV britânico BBC (programa Time Watch), lançado nas comemorações dos 500 anos do Descobrimento do Brasil (2000): https://www.youtube.com/watch?v=t821sT4AoUY

GENOCÍDIO NEGRO
O DEUS BRANCO QUE NOS PERDOE
Postado em 7 de junho de 2016
   
Por Luara Colpa*

Estamos em 2016, 128 anos pós Lei Áurea.

Há alguns meses cinco garotos foram brutalmente fuzilados, o que motivou a escrever este texto. Esta semana um garoto de 10 anos foi assassinado. Todos os dias eles são executados. Todos os dias. E o que tem em comum?
A negritude.

Estou a parir meu filho preto.

Na maca onde a enfermeira impaciente empurra minha barriga. Me livro da dor pensando em seu futuro. De uniforme e banho tomado ele desce a ladeira:

– Cuidado ao atravessar a rua! (Ele olha pra trás e sorri)

– Não esquece a merendeira hein filho? – Tá mãe!!

– Esteja bem vestido (para não te confundirem … com ladrão).

– Não erga a cabeça pro polícia. 

Vou franzindo a testa e abaixo o tom de voz:

– Ande com carteira de Trabalho no bolso e apresente-a sempre que abordado.

– Se quiser ter o cabelo colorido, será confundido com bandido. Se quiser homenagear seus ancestrais e fazer dreads e penteados, será chamado de vagabundo.

– Você poderá apanhar na cara – Por que mãe? Porque sim, Não revide

– Você sofrerá revistas vexatórias todas as semanas da sua vida. Porque sim.

– Você será chamado de macaco, “esse preto”, “de cor”.

– Não ande em grupos pra não ser confundido com arrastão.

– Estude filho, vão falar que as cotas o salvou, que é incapaz. Não dê ouvidos à eles.

– Se você se esforçar muito no trabalho, será chamado de “moreninho até que esforçado” e mesmo que te explorem e expurguem, e que seu salário seja menor que o de todos – usarão seu exemplo, pra justificar a Meritocracia canalha que nos imputam.

– Em qualquer furto na empresa você é o suspeito, filho. Sim.

– Você será mal visto o resto da sua vida na família da sua namorada branca. Porque sim também…

Sua mãe vai sofrer violência obstétrica no hospital. Porque é preta. Você vai nascer na contramão da vida. Porque alguma igreja um dia disse que não tínhamos alma.

Que nossa cultura era inferior, e mediram nossos dentes e nossas canelas. E nos deram um terço pra tentarmos nos redimir de termos nascido nessa cor.

Quando acharam oportuno, vestiram nossos turbantes e se apropriaram da nossa capoeira. Quando não nos queriam mais, nos forjaram “livres” na Lei do sexagenário. E então fomos expulsos da escravidão para a escravidão real.

Aqui estamos. Somos a história dos centros urbanos, filho. Fomos expulsos do modelo de cidade e do convívio entre pessoas. Nunca fomos pessoas.

Em 2012, 56.000 pessoas foram assassinadas no Brasil. Destas, 30.000 são jovens entre 15 a 29 anos e, desse total, 77% são negros. A maioria dos homicídios é praticado por armas de fogo, e menos de 8% dos casos chegam a ser julgados.
[Anistia Internacional]

Da periferia pra periferia seguimos, expurgados.

Não nos perguntaram onde construímos nossa vida, nossa raiz. Somos sem estória. A cada despejo fomos para a região metropolitana que nos colocavam. Em cada plano de habitação que meia dúzia de engomados brancos escreveram, fomos encaixotados nos predinhos de 40m². Bem longe. Longe dos olhos dos gringos.

Taparam nossas casas com tapumes pra Copa do Mundo. Botaram camburão na nossa quebrada, pra nos lembrar que desde “o fim” da escravidão, não sabem o que fazer pra tampar nossa existência.

Vão te dizer que mesmo em Estado de Sítio, você tem direito à ir e vir no seu país (que seus ascendentes construíram lajota por lajota.. paralelepípedo por paralelepípedo).

Mas você será executado à luz do dia filho. Na porta de casa. E eu vou lavar seu sangue.

Você será metralhado, “confundido”. Você e seus amigos pretos. Porque sim. Porque fazem parte da parcela da população que tem que ter regras pra estar vivo. Que é achincalhado desde o nascimento.

Nos exterminarão todos os dias, todos os dias “um crime isolado”.

E jogarão a culpa no policial noiado, no indivíduo sob pressão, na legítima defesa. A sociedade não reconhecerá que são todos cúmplices da sua morte.

Eles estão certos, agem em “legítima defesa”. Te avisei pra não sair sem a carteira de trabalho filho. Aliás, nem deu tempo de mostrar né? Te avisei pra não encarar o polícia…. Também não precisou. É, não deu tempo.

Vamos entrar pra estatística filho.

Eles só têm a televisão. Só tem a visão longínqua e deturpada do que somos. Eles desligarão a TV quando incomodar. Eles não sabem de mim, nem de você.

Só mais uma mulher sozinha parindo sob violência.

Só mais um preto metralhado. O Deus branco que nos perdoe, somos sem alma.

#Podiasermeufilho.


Gravura sobre transporte de escravos negros no século XIX.


Foto sobre o transporte de cidadãos suspeitos - todos negros - pela polícia militar do RJ nos anos de 1980 (fotógrafo: Luiz Morier).

Quando alguém erroneamente defende os europeus do processo escravista ocorrido entre os séculos XV e XVIII dizendo que “os africanos escravizavam os inimigos, que eram os próprios africanos de outras tribos!”, ele está cometendo dois erros: o primeiro é defender ou tentar justificar a escravidão, e o segundo é desconhecer a escravidão que ocorria dentro do continente africano entre as tribos que porventura guerreavam.

Ela existiu entre as tribos africanas? Sim, não podemos negar. Mas era uma escravidão bem diferente da praticada no Brasil. Os negros capturados e levados para a tribo vencedora tinham que trabalhar e lutar pela tribo, mas também tinham direitos, podendo até casar-se com um membro da tribo vencedora. Não havia a agressão gratuita observada do outro lado do oceano, muito menos a falta dos direitos sociais pertencentes aos outros membros da tribo.

Isso mudou quando os europeus começaram a aculturar as tribos africanas.

Esclarecimentos sobre Zumbi dos Palmares diante dos seus detratores que promovem um falso revisionismo histórico (em verdade, racismo velado):
https://www.geledes.org.br/zumbi-e-o-revisionismo-nada-historico/

A desvantagem histórica do negro em relação ao branco explicada por Darcy Ribeiro:

"As atuais classes dominantes brasileiras, feitas de filhos e netos de antigos senhores de escravos, guardam, diante do negro, a mesma atitude de desprezo vil. Para seus pais, o negro escravo, o forro, bem como o mulato, eram mera força energética, como um saco de carvão, que desgastado era facilmente substituído por outro que se comprava. Para seus descendentes, o negro livre, o mulato e o branco pobre são também o que há de mais reles, pela preguiça, pela ignorância, pela criminalidade inatas e inelutáveis. Todos eles são tidos consensualmente como culpados de suas próprias desgraças, explicadas como características da raça e não como resultado da escravidão e da opressão. Essa visão deformada é assimilada também pelos mulatos e até pelos negros que conseguem ascender socialmente, os quais se somam ao contingente branco para discriminar o negro-massa.

A nação brasileira, comandada por gente dessa mentalidade, nunca fez nada pela massa negra que a construíra. Negou-lhe a posse de qualquer pedaço de terra para viver e cultivar, de escolas em que pudesse educar seus filhos, de qualquer ordem de assistência. Só lhes deu, sobejamente, discriminação e repressão."


Fonte: http://socialistamorena.cartacapital.com.br/darcy-ribeiro-explica-a-desvantagem-historica-do-negro

http://henriquevieirapsol.files.wordpress.com/2013/11/infografico_20nov.jpg

Aqui excelente resumo do destino dos negros após a Abolição no site do IPEA:
http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2673%3Acatid%3D28&Itemid=23

Eis mais um resumo de Darcy Ribeiro em O povo brasileiro:
http://socialistamorena.cartacapital.com.br/darcy-ribeiro-explica-a-desvantagem-historica-do-negro/

A adoção de cotas raciais pelas universidades brasileiras responde a uma demanda histórica da população negra por políticas de equidade racial, ampliando a democratização do acesso ao ensino superior: 
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/08/resposta-folha-de-s-paulo-cotas-sim.html

MUCAMAS NO SÉCULO XXI

Quando lembramos que o fim da escravidão [...], o advento da República, e a própria democracia não significaram mudanças nas estruturas do status quo, tampouco oportunidades iguais e justiça à população negra brasileira, ainda há quem chame de exagero, critique tais afirmações e acuse o movimento negro e quem defende políticas reparatórias de “vitimistas”.

Poucas vezes meios de comunicação da chamada “grande mídia” brasileira abrem espaços para a demonstração de quão a sociedade está muito mais próxima da escravidão do que de uma democracia real. [...].

Empregadas no trabalho doméstico, exploradas no trabalho infantil e escravas sexuais dos patrões, homens brancos. Esta é a realidade vivida por muitas crianças e, ao que parece, desde sempre, ao lado do poder central do país.

Ler mais em: http://negrobelchior.cartacapital.com.br/meninas-negras-sao-feitas-escravas-domesticas-e-sexuais-na-regiao-central-do-brasil/

O JOGO CRUEL DO RACISMO
Acabo de descobrir horrorizado o que significa a expressão "jogar a negra", ou seja, a partida de desempate em uma competição. Significa literalmente apostar a negra escrava. O vencedor ganhava direito sexual a ela, isto é, de estuprá-la.
É, ainda temos um longo caminho a percorrer. 
Túlio Villaça, via Facebook, em 16/03/2016.

BABÁ: A COR BRANCA DA INFERIORIDADE

Em 2015, o Ministério Público de SP investigou casos de preconceito sobre a exigência do uso de roupa branca pelas babás em clube de elite. Leiam trechos do depoimento da ex-babá Silvana Félix ao #SalaSocial da BBC Brasil e vejam se não há ainda um ranço da época das AMAS-SECAS ou MÃES PRETAS escravas.

Tem preconceito? Tem. Mas é no clube, no restaurante, em tudo quanto é lugar. A tendência é se sentir diminuída. Uma vez, acompanhei a família para a qual trabalhava num almoço de batizado. Os patrões disseram para eu ir para a cozinha para arrumar meu almoço e chamei outra babá para ir comigo. Quando chegamos à cozinha, fomos escorraçadas pela dona da casa, que dizia que aquela não era a hora da gente comer, que estávamos atrapalhando.

Depois, ela levou um prato só para nós duas, com dois garfos. Foi humilhante demais. Disse que não queria comer, e ela me achou petulante. A outra babá começou a chorar. Minha patroa depois me pediu desculpas, mas a outra babá acabou sendo demitida.



Não se trata de aceitar ou não. Por exemplo, quando não falaram o nome das babás da Angélica*. A gente não tem nome. Esse mundo de babá é assim. Faz parte entender que neste mundo de ricos e babás é assim. Graças a Deus sei meu lugar. Já fui para vários hotéis e, enquanto os patrões comiam, eu comia sozinha em outro lugar.

O uniforme deixa claro que você é serviçal. Serviçal é serviçal. Patrão é patrão. A roupa nos marca. É a mesma coisa no shopping. As patroas gostam de desfilar no shopping com a babá. Ela está pagando por isso e dá status. Não fica bem diante das amigas desfilar com a babá com roupa normal. Já trabalhei para patroa de 20 e poucos anos que exigia que a chamasse de dona ou senhora. Era muito estranho chamar alguém tão mais novo desta forma.

*Apresentadora de TV que sofreu acidente aéreo, sem vítimas fatais, junto com a família e duas babás anônimas para a Mídia.

Fonte: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/06/150618_baba_rb_ss

PELO FIM DA GLOBELEZA
Uma discussão sobre a mulher negra ou MULATA antes, durante e depois do carnaval


... precisamos identificar o problema contido no termo “mulata”. A palavra de origem espanhola vem de “mula” ou “mulo”: aquilo que é originário do cruzamento entre espécies. Mulas são animais nascidos do cruzamento dos jumentos com éguas ou dos cavalos com jumentas. Trata-se de uma palavra pejorativa que indica mestiçagem, impureza. Mistura imprópria que não deveria existir [mulas são consideradas por alguns "aberrações" por serem naturalmente estéreis, ou seja, a Natureza procura não reproduzir tal "erro"].

Empregado desde o período colonial, o termo era usado para designar negros de pele mais clara, frutos do estupro de escravas pelos senhores de engenho. Tal nomenclatura tem cunho machista e racista e foi transferido à personagem globeleza, naturalizado. É uma memória triste dos 354 anos de escravidão negra no Brasil.


A mulher negra exposta como Globeleza segue, inclusive, um padrão de seleção estética próxima ao feito pelos senhores de engenho ao escolher as mulheres escravizadas que queriam perto de si. As escravas consideradas “bonitas” eram escolhidas para trabalhar na casa-grande. Da mesma forma, eram selecionadas as futuras vítimas de assédio, intimidação e estupro.

Desde o período colonial, mulheres negras são estereotipadas como sendo “quentes”, naturalmente sensuais, sedutoras de homens. Essas classificações, vistas a partir do olhar do colonizador, romantizam o fato de que essas mulheres estavam na condição de escravas e, portanto, eram estupradas e violentadas, ou seja, sua vontade não existia perante seus “senhores”.

Trecho do artigo de Djamila Ribeiro, mestre em Filosofia Política pela Unifesp e feminista negra, com adição.


Leia mais em: http://azmina.com.br/2016/01/nao-queremos-mais-protagonizar-o-imaginario-de-quem-busca-turismo-sexual/


NOVE EXPRESSÕES POPULARES com origens ligadas à 
ESCRAVIDÃO e você nem imaginava

Pois muitas das expressões que usamos no dia a dia, e que hoje comunicam somente seu sentido funcional – aquilo que atualmente a frase “quer dizer” – são originarias de um vergonhoso e longo período da história do Brasil: a escravidão.

1. Tem caroço nesse angu

A expressão, que significa que alguém estaria escondendo algo, tem sua origem em um truque realizado pelos escravos para melhor se alimentarem. Se muitas vezes o prato servido era composto exclusivamente de uma porção de angu de fubá, a escrava que lhes servia por vezes conseguia dar um jeito de esconder um pedaço de carne ou alguns torresmos embaixo do angu. A expressão nasceu do comentário de um ou outro escravo a respeito de certo prato que lhe parecesse suspeito.

2. A dar com pau

“Pau” é um substantivo utilizado em algumas expressões brasileiras, e tem sua origem nos navios negreiros. Muitos negros capturados preferiam morrer a serem escravizados e, durante a travessia da África para o Brasil, faziam greve de fome. Para resolver a situação, foi criado então o “pau de comer”, uma espécie de colhe que era enfiada na boca dessas pessoas aprisionadas por onde se jogava a comida (normalmente angi e sapa) até alimenta-los enfim. A população incorporou a expressão.

3. Disputar a nega

Essa expressão, que significa disputar mais uma partida de qualquer jogo para desempatá-lo, possui sua origem não só na escravidão, como também na misoginia e no estupro (o que espanta que até hoje seja utilizada com tanta naturalidade). Sua história é simples e intuitiva: quase sempre, quando os senhores do passado jogavam algum esporte ou jogo, o prêmio era uma escrava negra.

4. Nas coxas

A origem da expressão, que quer dizer algo mal feito, realizado sem capricho, é imprecisa, e não há consenso sobre se ela viria de fato do período da escravidão. De todo modo, há vertente mais popular afirma que a expressão viria do hábito dos escravos moldarem as telhas em suas coxas que, por possuírem tamanhos e formatos diferentes, acabavam irregulares e mal encaixadas.


Escravos trabalhando em mina antes de 1888 (registro raro).

5. Espírito de porco

Ainda que a origem da expressão venha da injusta má fama associada ao animal, por uma ideia de falta de higiene, sujeira e impureza, tal má fama é oriunda de princípios religiosos. Durante o período escravocrata, os escravos se recusavam e eram obrigados a matar o animal, para que servisse de alimento. A recusa vinha porque se acreditava que o espírito do animal abatido permaneceria no corpo de quem o matasse pelo resto de sua vida e, para complementar tal crença, a incrível semelhança que o choro do porco possui com um lamento humano tornava o ritual ainda mais assustador.

6. Para inglês ver

Essa expressão tem sua origem na escravidão, e também no mal hábito ainda atual brasileiro de aprovar leis que não “pegam” (que ninguém cumpre e nem é punido por isso). Em 1830, a Inglaterra exigiu que o Brasil criasse um esforço para acabar com o tráfico de escravos, e impusesse enfim leis que coibissem tal prática. O Brasil acatou a exigência inglesa, mas as autoridades daqui sabiam que tal lei simplesmente não seria cumprida – eram leis existentes somente em um papel, “para inglês ver”.

7. Bucho Cheio ou Encher o bucho

Expressão mais comuns em Minas, eram usadas tanto pelos escravos quanto por seus exploradores, evidentemente que com outra conotação da que se usa hoje. Atualmente significando estar bem alimentado, de barriga cheia, na época significavam a obrigação que os escravos que trabalhavam nas minas de ouro possuíam de preencher com ouro um buraco na parede, conhecido como “bucho”, para só então receber sua tigela de comida.

8. Meia tigela

A partir da expressão anterior, a história segue, dando origem a expressão “meia tigela”, que significa algo sem valor, medíocre, desimportante. Quando o escravo não conseguia preencher o “bucho” da mina com ouro, ele só recebia metade de uma tigela de comida. Muitas vezes, o escravo que com frequência não conseguia alcançar essa “meta” ganhava esse apelido. Tais hábitos não eram, porém, restritos às minas, e a punição retirando-se parte da comida era comum na maioria das obrigações dos escravos.

9. Lavei a égua

Por fim, a expressão “lavar a égua”, que quer dizer aproveitar, se dar bem, se redimir em algo, vem também da exploração do ouro, quando os escravos mais corajosos tentavam esconder algumas pepitas debaixo da crina do animal, ou esfregavam ouro em pó em sua pele. Depois pediam para lavar o animal e, com isso, recuperar o ouro escondido para, quem sabe, comprar sua própria liberdade. Os que eram descobertos, porém, poderiam ser açoitados até a morte.

Fonte: http://www.mundoamazonia.com.br/arquivos/9-expressoes-populares-com-origens-ligadas-a-escravidao-e-voce-nem-imaginava/


HEROÍNAS NEGRAS redescobertas
Por Jarid Arraes



... Na televisão, os imperadores viram protagonistas de minisséries, enquanto os atores e atrizes negros são reduzidos a papéis de escravos sem profundidade. Grandes lutadores como Zumbi dos Palmares, Dragão do Mar e José Luiz Napoleão, são pouco mencionados. Aliás, eles são lembrados apenas no mês de novembro, em razão do Dia da Consciência Negra; mas as mulheres negras, que contribuíram de tantas formas na luta contra a escravidão e nas conquistas sociais do Brasil, nem sequer são mencionadas.

... Por conta disso, as garotas negras crescem achando que não há boas referências intelectuais e de resistência nas quais possam se espelhar. Para descobrir seus referenciais, é preciso que se mergulhe em uma pesquisa individual, muitas vezes solitária, juntando peças de um enorme quebra-cabeça para no fim descobrir que pouquíssimo foi registrado a respeito de mulheres como Dandara dos Palmares ou Tereza de Benguela – importantes líderes quilombolas.

Mesmo com os esforços racistas para apagar a história das mulheres negras, racismo nenhum será capaz de enterrar a memória de ícones como Luísa Mahin e Tia Simoa.

... Até o momento, tenho vários cordéis biográficos que contam as trajetórias de Aqualtune [avó materna de Zumbi] e Carolina Maria de Jesus, além de outras já citadas nesse texto.

- Para conhecer meus cordéis biográficos e feministas, visite: www.jaridarraes.com/cordel

Fonte: http://www.revistaforum.com.br/questaodegenero/2015/04/17/heroinas-negras-na-historia-brasil/

Após a Abolição, existiram outras heroínas negras (pouco ou nada conhecidas pelas páginas da História oficial) salvadoras da memória cultural do povo afro-brasileiro. Talvez a mais famosa delas tenha sido a Tia Ciata, a "madrinha do samba". Vide mais adiante.

O Abalo dos Militares

Após a Guerra do Paraguai (1865-1870), o Exército brasileiro retornou mais organizado e fortalecido no contexto político e armamentista. Os militares não suportavam mais o retrógrado Estado monarquista e escravista, que os desvalorizava. Após a guerra, a monarquia deu motivos para o desgaste entre ela e os militares: os soldos foram congelados, o efetivo do Exército foi diminuído, o prestigio político dos oficiais veteranos caiu etc.

Desejavam modernizar a nação instaurando uma república.


A Batalha do Avaí (1877), de Pedro Américo.
Acervo do Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro (RJ).
A Guerra do Paraguai foi um grande desafio ao Exército Brasileiro, no início pequeno, desorganizado, pouco armado e despreparado em comparação aos paraguaios. Graças a esforços próprios (e com o auxílio de armamentos britânicos, comprados a peso de ouro pelo Império, fato que elevou bastante a dívida externa), os brasileiros conseguiram superar as grandes limitações e saíram do conflito como uma poderosa força militar do continente sul-americano. A maior parte das baixas do Brasil foi formada por negros, que se alistaram, a fim de conseguir a alforria, ou, por obrigação, ao tomar o lugar dos filhos convocados dos senhores.


O Exército imperial, que até então recrutava seus escalões superiores na elite escravocrata, teve de abrir seus quadros a outras parcelas da população, recrutando filhos de uma nascente classe média para posições de comando, e milhares de negros alforriados para os escalões inferiores, o que o tornou permeável às ideias abolicionistas e republicanas. A própria organização do Exército imperial foi alterada no esforço de guerra, pois antes ele não passava de um desarticulado corpo de milícias regionais. Tornou-se preciso unificá-lo, dando-lhe âmbito nacional.

[Nosso Século Brasil, vol. 1, p. 19, com modificação]

Ademais, os militares eram proibidos de se manifestarem político e publicamente, sob a ameaça de serem punidos, inclusive com prisão. Tais punições eram reprovadas por diversos oficiais, entre eles estava o Marechal Deodoro da Fonseca. Em 1886, por se recusar a punir um subordinado - o Tenente-coronel Sena Madureira (que criticou o governo na imprensa) - Deodoro foi deposto do cargo de presidente e comandante de armas da província do Rio Grande do Sul. O fato abalou a fidelidade do Marechal ao Império, e reverberou em sua decisão em prol da Proclamação da República, três anos depois.


Tenente-coronel Antônio de Sena Madureira (1841-1889).
Oficial, nascido em Recife (PE), veterano da Guerra do Paraguai e um dos estopins da Proclamação da República. Hoje há uma cidade no Acre em seu nome. 

O Abalo dos Novos Setores Sociais


A segunda metade do século XIX deu início a expansão da cafeicultura no Sudeste. Para suprir a falta de mão de obra escrava, os latifundiários e o governo passaram a investir na importação de trabalhadores assalariados, sobretudo da Europa. Territórios correspondentes à Itália e Alemanha atuais (que, seguidos das nações eslavas, forneciam o maior contingente de imigrantes) estavam sofrendo violento processo de unificação.

Expulsos de suas terras pelas guerras, famílias de camponeses e operários vieram para o Brasil em busca de trabalho. Esses trabalhadores diferenciados foram determinantes ao processo tardio de industrialização, que influenciou a derrubada da monarquia.


Foto de fazenda de café paulista com trabalhadores livres, principalmente de imigrantes (séc. XIX-XX).
No Segundo Reinado, a economia do país (essencialmente agrária e voltada à exportação) deixou de focar nos arcaicos engenhos de cana (sobretudo do litoral nordestino), fazendas de algodão e tabaco, e dirigiu-se aos mais rentáveis cafezais (mais uma monocultura em latifúndios) do interior fluminense e paulista.

Os setores médios urbanos (antecessores da classe média do século XX) não detinham participação política e viam no republicanismo oportunidades para serem eleitos a cargos políticos e votarem, já que o voto durante o Império era censitário: os eleitores deveriam ter um alto nível de renda (elitização do poder).

Contudo, não havia uma harmonia ideológica dentro do movimento republicano no final do período monárquico. Os propagandistas do Rio de Janeiro, por exemplo, eram formados por jornalistas, diplomatas, advogados, professores, autores, enfim, intelectuais que não conseguiam votos necessários para se elegerem.


A foto da revista Fon-Fon, de 1909, retrata os intelectuais da classe média urbana do início do século XX na calçada de um café. Alguns nomes ilustres (não estão na foto): Coelho Neto (literatura), Medeiros de Albuquerque (política) e Thomaz Lopes (diplomacia).

A república se impôs menos pela força dos ideais republicanos e mais pelo enfraquecimento da monarquia. Diversas câmaras municipais do país propuseram um plebiscito para saber qual herdeiro ao trono substituiria D. Pedro II após a morte, já que não confiavam na regência de uma mulher: a Princesa Isabel; propuseram até mesmo colocar a opção da instauração de uma república.

Interessante saber que dois dos "patriarcas da República", Rui Barbosa e Joaquim Nabuco, eram mais federalistas (descentralização do poder imperial para dar autonomia às províncias) do que republicanos até a época da Proclamação.



O Manifesto Republicano de 1870 

Logo após o fim da Guerra do Paraguai, uma declaração publicada 19 anos antes de proclamação da República, pelos membros dissidentes do Partido Liberal, liderados por Quintino Bocaiúva e Joaquim Saldanha Marinho foi lançado no jornal A República.

Decidiu-se formar um Clube Republicano no Rio de Janeiro, com o ideário de derrubar da Monarquia e estabelecer a República. O manifesto veio a público em 03.12.1870, no primeiro número do periódico A República, Rio de Janeiro, propriedade do Clube Republicano. Com colaboração e redação de Quintino Bocaiúva, Aristides Lobo, Salvador de Mendonça, Lafayette Rodrigues Ferreira, e Luiz Barbosa da Silva, entre outros. Este último tornou-se o seu redator principal e proprietário em agosto de 1871.

Embora a folha A República tenha sobrevivido por apenas 4 anos, ficou marcada na história, para sempre, já no seu número 1, devido à audácia daqueles jornalistas que, unidos a um seleto grupo de intelectuais republicanos, alcançaram a marca de 58 indivíduos que assinaram o histórico.



***
Em 1873, surgiu o Partido Republicano Paulista (PRP, que não era exatamente um partido oficialmente estabelecido mas uma espécie de agremiação política) demonstrando o descompasso entre a modernização do Oeste paulista e o imobilismo burocrático do poder centralizado na Corte do Rio de Janeiro. Diversos cafeicultores da província de São Paulo utilizavam ferrovias e mão-de-obra assalariada na produção, aliados ao começo do interesse pela industrialização. Assim sendo, os abastados paulistas do café aderiram à causa republicana, que buscava uma federação: autonomia aos Estados-membros.

Em 1875, cinco anos após o fim da Guerra do Paraguai, para prestigiar Duque de Caxias, o imperador quebrou a alternância de poderes entre os dois partidos, Conservador e Liberal, e nomeou, novamente, o grande herói militar (conservador) presidente do Conselho de Ministros. O ato criou uma cisão no Partido Liberal, que culminou, anos depois, com o fortalecimento da ala republicana no seio político da monarquia.

Nos anos que antecederam a Proclamação, membros das elites das províncias de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e outras articularam movimentos republicanos no país.

A grande e rápida adesão ao Estado republicano por pessoas ligadas diretamente à monarquia, a exemplo do preceptor dos filhos da Princesa Isabel, o Barão de Ramiz, demonstra como o Império já havia caducado.

Em 15 novembro de 1889, quase ninguém se propôs a defender a moribunda monarquia. O romper da República brasileira era inevitável.

Nasce a República: a Proclamação


Detalhe de O Último Baile da Ilha Fiscal (1905), de Aurélio de Figueredo.
Acervo do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro (RJ).

O último baile do Império, ocorrido em 09 de novembro de 1889, seis dias antes da Proclamação da República, foi oferecido pelo Visconde de Ouro Preto à nação chilena e seus comandantes e oficiais, através do encouraçado Almirante Cochrane, que se encontrava atracado na Baía de Guanabara. O evento ocorreu como forma de agradecimento à recepção do navio brasileiro, quando este esteve no Chile. No céu, vemos as alegorias da monarquia (representada por clérigos e nobres sob um baldaquino, à direita) se dirigindo ao poente, enquanto que, junto com a alvorada (no alto, à esquerda), aproximam-se as alegorias da república portando a atual bandeira nacional.

D. Pedro II e a família não eram afeitos aos bailes e festividades de luxo. Por isso, alguns diziam que a Corte aparentava um eterno clima de luto. Eis porque a anunciação de uma festa oficial do Império causou tamanho alvoroço na sociedade da época, pois era um evento raro, para o qual poucos foram convidados (em maior número, aristocratas). No entanto, a família imperial permaneceu pouco tempo na ilha. Reza a lenda que o Imperador, logo ao desembarcar, teria tropeçado ou escorregado, porém sendo de imediato amparado. Fato que o fez dizer com bom humor: "a monarquia tropeça, mas não cai!" (caiu em menos de uma semana).

Curiosamente, de acordo com o diário de uma das filhas, Benjamin Constant, após deixar a reunião conspiratória no Clube Militar, e devido a insistência da família, alugou um barco para levar a família a fim de observar o baile de perto.


A Ilha Fiscal (antiga Ilha dos Ratos), uma pequena elevação rochosa próxima ao principal porto da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, foi utilizada como posto alfandegário durante a última fase do Segundo Reinado. O palacete, que foi inaugurado em 27 de abril de 1889, é um projeto arquitetônico de Del Vecchio. D. Pedro II, desejando que a construção não contrastasse com a paisagem de fundo da Serra do Mar, chamou o palacete de "delicado relicário, digno de uma brilhante joia!"

No final de 1888, D. Pedro II, já enfraquecido fisicamente pelo envelhecimento precoce, nomeou para Presidente do Conselho de Ministros (uma espécie de primeiro-ministro no parlamento da monarquia constitucional) o Visconde de Ouro Preto. Este lançou um projeto de reformas políticas inspirado em ideias republicanas, a fim de tentar salvar a monarquia. Porém, o Parlamento, repleto de deputados tradicionalistas desejosos em manter seus privilégios, recusou o projeto. A crise gerou o fechamento do Legislativo e a convocação de novas eleições.


Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Visconde de Ouro Preto (1836-1912)
Político monarquista mineiro. Quando Ministro da Fazenda, criou um imposto sobre a passagem dos bondes, fato que deflagrou, na Corte do Rio de Janeiro, a popular Revolta do Vintém (1880).


Nos últimos quinze anos de seu reinado, D. Pedro II aferrou-se à disciplina burocrática, procurando abster-se de decisões. Os novos tempos traziam mudanças que ele não conseguia acompanhar. [...].

D. Pedro II tentava acompanhar essas mudanças e ao mesmo tempo manter-se fiel à elite. Mas seu desempenho era tímido [...].

[...] A mais importante parcela da elite, a que se modernizava voltando-se para a indústria e o comércio, já não confiava nele [...]. E no Exército surgiram protestos contra o atraso do regime e contra os baixos soldos.

[Nosso Século Brasil, vol. 1, p. 24]

Os propagandista republicanos na Corte do Rio de Janeiro, como Benjamin Constant, Rui Barbosa, Lopes Trovão, Silva Jardim, Saldanha Marinho, Aristides Lobo e Quintino Bocaiuva, defendiam ideais civis (acabar com os privilégios da aristocracia, liberdade de expressão, direito de voto direto, educação gratuita para todos, aumentar a participação do povo no processo político, acabar com os latifúndios e promover a reforma agrária etc.) e bradavam o republicanismo através da imprensa, que durante o Império de D. Pedro II gozava de ampla liberdade (para a infelicidade da monarquia).

Os grupos republicanos organizados não se entendiam, o que dificultava a obtenção de mais votos e vagas para o parlamento monárquico. Os intelectuais dos setores médios e urbanos, as demais seções republicanas nas casas legislativas do Império - cafeicultores paulistas, jovens militares positivistas cariocas liderados por Benjamin Constant, e positivistas do Rio Grande do Sul de Júlio de Castilhos - divergiam sobre os rumos que a república deveria tomar. Por isso todos convergiram para o golpe de Estado em novembro de 1889.

Os antecedentes do "golpe da Proclamação" surgiram quando republicanos espalharam o boato que o Império iniciaria uma violenta repressão ordenando a prisão de vários oficiais do Exército, incluindo Deodoro e Benjamin Constant, feroz opositor da monarquia.

Em 15 de novembro de 1889, o Marechal Deodoro NÃO proclamou, naquele momento, a República, mas apenas destituiu o gabinete do Visconde de Ouro Preto.


Foto nítida do Marechal Manoel Deodoro da Fonseca (1827-1892).

O ARTÍFICE SECRETO DA PROCLAMAÇÃO: UM TRIÂNGULO AMOROSO

Diferente de D. Pedro II, o Marechal, alagoano, possuía traços físicos mestiços, típicos da maior parte do povo brasileiro. Apresentava-se, oficialmente, com suas condecorações de herói de guerra.

Até às vésperas da Proclamação, Deodoro não simpatizava com os ideais republicanos no Brasil, pois achava que a República levaria o país à desgraça (analisando a instabilidade de diversos países republicanos da América Espanhola).

A mudança das intensões em Deodoro apenas ocorreu na madrugada do dia 15 para o 16 de novembro de 1889, e tinha também motivos particulares. Pois chegara a notícia que D. Pedro II teria chamado para compor a nova presidência do parlamento, no lugar do Visconde de Ouro Preto, o senador liberal gaúcho Gaspar Silveira Martins: adversário político de Deodoro na província do Rio Grande do Sul, na qual foi governador, e "conquistador do coração" da Baronesa de Triunfo (bela mulher gaúcha por quem o marechal foi apaixonado).

Assim sendo, Deodoro poderia ter pensado "se Silveira Martins será o novo presidente do Conselho, que seja proclamada a incerta República!"

No dia 15 de novembro de 1889 (uma quinta-feira), houve somente a derrubada do Conselho de Ministros do Império. A Proclamação da República aconteceu mesmo no dia 16.

Na noite de 14 de novembro de 1889, unidades militares estacionadas no bairro carioca de São Cristóvão rebelaram-se. Ao alvorecer, marcharam para o centro da cidade. Sob o comando do Marechal Deodoro, as unidades se uniram às do Quartel Central do Exército (atual Palácio Duque de Caxias) que ficava próximo.

O Marechal Cândido Rondon (1865-1958), na época um jovem oficial que testemunhou o fato, escreveu em suas memórias que Deodoro bradou "viva o Imperador!" ao entrar com suas forças no pátio do Ministério da Guerra (no Campo de Santana, centro do Rio). Deodoro também afirmou que apresentaria uma nova lista de ministros para a aprovação de D. Pedro II.

Portanto, o "fundador" da República do Brasil, apenas intencionava, em primeiro momento, derrubar um gabinete de ministros do Segundo Reinado - dentro do contexto da "questão militar" (vide o assunto) -, não o Império.

Deodoro, através de um golpe de Estado, deu por proclamada a República do Brasil, mesmo frente ao desconhecimento da maior parte da população, que pensava se tratar de uma simples parada militar (a época é comicamente representada no conto O Velho Lima, de Artur Azevedo). À tarde, na Câmara Municipal, José do Patrocínio oficializou a República.


O atual Museu Nacional de História Natural da UFRJ já foi o Palácio ou Paço Imperial de São Cristóvão ou da Quinta da Boa Vista. No local, residiram, desde D. João VI, todos os regentes do país.

Proclamação da República (1893), de Benedito Calixto. 
Acervo da Pinacoteca Municipal de São Paulo (SP).
Diferente do que foi retratado nas pinturas heroicas, o Mal. Deodoro NÃO estava fisicamente presente no desfile das tropas no dia da Proclamação, horas após destituir o Visconde de Ouro Preto, pois retornou convalescente à sua residência. Na madrugada anterior sofria no leito por problemas cardiorrespiratórios, mas surpreendentemente melhorou de saúde na madruga entre os dias 14 e 15 de novembro.

Os conspiradores republicanos, encabeçados por Benjamin Constant, anteciparam o golpe contra o Império temendo que o chefe militar mais respeitado do Exército, viesse a falecer antes. Por saberem de sua saúde frágil, deram a Deodoro uma montaria mansa - um cavalo baio e velho - para que não houvesse o perigo de ser derrubado.

Deodoro da Fonseca residia na região do Campo de Santana, atual Praça da República, onde hoje está seu museu: Casa de Deodoro (na foto).


Pintura de 1817 mostrando a extinta Igreja de Sant'Anna, no fundo ao centro, no local onde hoje está a Estação Ferroviária da Central do Brasil. Atrás, vemos o Morro da Providência ainda bastante arborizado.
  
A Proclamação da República aconteceu no espaçoso Campo de Santana (nomeado assim por causa da igrejinha) ou da Aclamação (em homenagem à aclamação de D. Pedro I, em 1822), na região dos Cajueiros: área limítrofe, ao norte, entre a zona urbana e rural da cidade, que até o século XVIII era repleta de cajueiros. A região situa-se nos arredores da atual Praça da República, da Central do Brasil e do Quartel-General do Comando Militar do Leste (Palácio Duque de Caxias), Rio de Janeiro (RJ).


 Festa do 5º ano da Proclamação aliada à posse do presidente Prudente de Morais, Praça da República (1894).


Praça da República na década de 1890 (à direita, vemos o ainda arborizado Campo de Santana, a maior área verde do Centro do Rio).


Jardins do Campo de Santana "recém-inaugurado" (1897).

A notícia forçou o retorno de D. Pedro II, que estava na cidade serrana de Petrópolis (RJ): estada de veraneio da Família Imperial. O Imperador e seus parentes tiveram que deixar o país em 24 horas em exílio à Europa. O regente recém-deposto recusou rico auxílio oferecido pelo Tesouro (pediu apenas um saco cheio da “terra que tanto amava”, a fim de cobri-lo ao baixar da campa). Deodoro e demais republicanos, que muito lhe deviam, sobretudo pelo apoio filantrópico dado aos estudos, preferiram não comparecer à despedida do ex-monarca.


Gravura da Família Imperial. Principais membros: D. Pedro II (em pé, de barba branca), a Imperatriz D. Teresa Cristina (sentada ao canto direito), a Princesa Isabel (ao lado do Imperador) e o Conde d'Eu (em pé, ao lado da Princesa).

Quando recebeu a notícia da derrubada do Visconde de Ouro Preto e a ameaça da instauração de uma república, D. Pedro II estava em sua estada de veraneio em Petrópolis (agradável cidade serrana fluminense onde a família imperial fugia do forte calor do verão carioca). Enquanto descia a serra fluminense, na tarde do dia 15, em trem particular, teria dito com os olhos nos periódicos da época: "eu conheço os brasileiros, isso vai dar em nada!" (como podemos ver, desde o baile na Ilha Fiscal, o Último Imperador do Brasil era ruim em prognósticos).

Ao chegar no Paço Imperial (na atual Praça XV de Novembro, no Centro do Rio), demorou para convocar o Ministério e o Conselho de Estado (o que ocorreu somente na madrugada de 16 de novembro). Nessa reunião tomou a infeliz decisão de nomear Silveira Martins como presidente do Conselho de Ministros. À essa altura, o monarca já era refém das forças republicanas golpistas que ocuparam o Paço.

A Proclamação da República ocorreu de maneira quase pacífica e sem derramamento de sangue. O responsável pela segurança (extinto posto de ajudante-geral do Exército) do gabinete do Visconde de Ouro Preto era Floriano Peixoto, um dos articuladores do golpe, que não ofereceu resistência às forças armadas que tomaram o gabinete.

A única vítima oficial do golpe que derrubou o Império foi o Barão de Ladário, Ministro da Marinha Imperial, que resistiu à voz de prisão dada pelos republicanos e recebeu um tiro nas nádegas (mais tarde tornou-se senador da República por duas vezes).


Um dos poucos que tentou defender o Império pegando em armas foi o comandante da província da Bahia, o general Hermes Ernesto da Fonseca (1824-1891), que suspendeu a mobilização militar, juntamente com tropas do Pará, quando soube que quem liderava o golpe republicano era Deodoro, irmão dele. Esse comandante era o pai do marechal homônimo e futuro presidente da república de 1910 a 1914.


A última fotografia da família imperial no Brasil - 1889. Petrópolis RJ


No dia 16 de novembro de 1889, o Imperador recebeu um documento do comandante da Cavalaria aconselhando seu exílio. No mesmo dia redigiu a resposta. Eis o trecho final: Ausentando-me, pois, eu com todas as pessoas da minha família, conservarei do Brasil a mais saudosa lembrança, fazendo ardentes votos por sua riqueza e prosperidade [Nosso Século Brasil, vol. 1, p. 24].


Seu desmedido amor ao Brasil foi tão intenso quanto a dedicação que lhe devotou no labor extenuante e no esforço empenhado nos seus 49 anos de governo. No exílio, jamais criticou os republicanos que lhe tiraram a coroa [Trecho do artigo "Os 120 anos da morte de D. Pedro II, o maior brasileiro do século XIX", do Prof. Milton Teixeira, em Folha Cultural, Rio de Janeiro: edição nº 124, dez. 2011, p. 9, com adição].

O jornalista Quintino Bocaiuva foi o único civil a cavalgar ao lado dos militares Deodoro e Benjamin Constant em 15 de novembro, e também o responsável pelo primeiro e lamentável ato de censura do governo provisório: proibiu que o discurso de despedida do ex-Imperador fosse publicado na imprensa.

No exílio, na Europa, sempre alimentou a esperança de retornar ao Brasil. A morte da esposa em Portugal, poucas semanas após aportar, em dezembro de 1889, fez sua saúde declinar aos poucos até falecer no modesto Hotel Bedford, em Paris, de pneumonia causada pelo inverno nevoso ao qual não estava acostumado (apesar de já ter viajado ao continente europeu antes).

O mais conhecido soneto do ex-Imperador (passou a assinar apenas como Pedro de Alcântara), escrito no exílio, exprime bem seus sentimentos de exilado à força por compatriotas a quem auxilou de diversos momentos.


Ingratos

Não maldigo o rigor da iníqua sorte, 
Por mais atroz que fosse e sem piedade, 
Arrancando-me o trono e a majestade, 
Quando a dous passos só estou da morte. 

Do jogo das paixões minha alma forte 
Conhece bem a estulta variedade, 
Que hoje nos dá contínua f'licidade 
E amanhã nem — um bem que nos conforte. 

Mas a dor que excrucia e que maltrata, 
A dor cruel que o ânimo deplora, 
Que fere o coração e pronto mata, 

É ver na mão cuspir a extrema hora 
A mesma boca aduladora e ingrata, 
Que tantos beijos nela pôs — outrora.

Do livro Poesias completas de D. Pedro II: originais e traduções, sonetos do exílio, autênticas e apócrifas. Prefácio de  Medeiros e Albuquerque, 1932, RJ. Poema integrante da série Produções Apócrifas: Sonetos do Exílio.


Qualquer presidente vira imperador, é isso que eles 'tão querendo! (...) É a turma da melancia, verde por fora e vermelho por dentro. (...) Por fora, a democracia: verde como a esperança. Mas por dentro, eles 'tão fervendo pra mandar em tudo. 'Tão tudo com o rei na barriga, Pedrão!

[Trecho de fala do personagem Arlindo com D. Pedro II na comédia cinematográfica (chanchada) O Gato de Madame, 1956, de Amácio Mazzaropi]

Os Moldes Republicanos

Após a morte da monarquia, logo ficaram bem mais evidentes divergências anteriores entre forças republicanas, sobretudo entre cafeicultores paulistas e militares, visto que cada qual apresentava projetos político-ideológicos de governo distintos. Os primeiros anos da República, de 1889 a 1894, foram marcados por governos militares fortes, a fim de evitar possíveis contragolpes monárquicos. Antes de novembro de 1889, já existiam três projetos republicanos principais:

O Projeto Liberal

Encabeçado pela elite do café paulista a favor da descentralização do poder ou federalismo republicano (autonomia relativa aos Estados-membros inspirada no modelo estadunidense). Além disso, achavam que o Estado deveria apenas administrar os interesses privados (liberalismo). Desejavam que, em São Paulo, os latifundiários cafeicultores pudessem gerir a economia, inclusive sob o ponto de vista da administração pública. Tal ideal prevaleceu na maior parte da República Velha (1889-1930). As "sedes" desses liberais paulistas, inspirados no republicanismo dos EUA, ficavam sobretudo em Itu, Campinas e Rio Claro.


Embarque de sacas do café paulista no porto de Santos (início do séc. XX).
Trem transportando o café paulista (séc. XIX-XX).

O Projeto Jacobino ou Popular

Modelo defendido por parcelas da população urbana, incluindo uma baixa classe média (pequenos comerciantes e funcionários) e setores urbanos eruditos (jornalistas e profissionais liberais como médicos, advogados e professores). Inspirados nos jacobinos, da Revolução Francesa de 1789, exigiam o sufrágio universal (voto direto), visavam os interesses populares e não apenas os da alta burguesia (de projeto liberal), e desejavam que a maior parte da população participasse da administração pública.


A Liberdade guiando o Povo (1830), de Eugène Delacroix.
Acervo do Museu do Louvre, Paris.
O nome "jacobino" surgiu devido às reuniões secretas do Clube Jacobino, situado num convento dominicano da rua Saint Jacques, Paris. Muitos dos integrantes eram das classes populares e combatiam o Antigo Regime (representado pelo alto clero e a nobreza). Na época da 1ª República Francesa, o partido jacobino foi composto por revolucionários mais exaltados (daí o sinônimo de "radical" para jacobino).

O Projeto Positivista

Baseado na filosofia do francês Auguste Comte, esse projeto tinha aceitação ampla dentro do Exército Brasileiro daquele período, sobretudo entre os jovens oficiais das escolas militares. Acreditava-se que o progresso deveria ser alcançado a qualquer custo (inclusive utilizando a força), mas sempre dentro da ordem, daí o papel do Estado como promotor de um governo forte e bem centralizado. Em verdade, ditava uma “ditadura republicana”. Os principais encabeçadores do positivismo brasileiro eram o professor, militar e político carioca Benjamin Constant, e o jornalista e político gaúcho Júlio de Castilhos (1860-1903).


Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (1798-1857).
O criador do positivismo, a exemplo de muitos dos seus admiradores brasileiros, estudou (sem graduar-se) num instituto militar de ensino técnico superior (École Polytechnique, de Paris). Sua doutrina só foi mais aceita no Brasil. Fundou também a Religião da Humanidade, que ergueu alguns templos seculares também aqui. Sua racionalidade não o salvou de crises mentais tratadas pela psiquiatria (chegou a ser internado).

A República da Espada (1889-1894)

O Palácio Itamaraty do Rio de Janeiro, próximo à Praça da República, foi a sede do primeiro governo republicano.
Erguido em 1855 para ser a residência do Conde de Itamaraty, esse imóvel de estilo neoclássico foi comprado em 1889 pela recém-formada república. Em 1897, a sede do governo foi transferida para o Palácio do Catete e o local passou a sediar o Ministério das Relações Exteriores (até a inauguração do palácio homônimo em Brasília em 1970).

O primeiro governo militar da República foi tão conturbado e desprovido de experiência quanto a uma gestão pública estável, que durante uma reunião ministerial, durante calorosa discussão, o presidente Deodoro desafiou o ministro Benjamin Constant para um duelo com armas de fogo (e evidentemente foi logo dissuadido).

O projeto positivista prevaleceu durante os primeiros cinco anos da República Brasileira (responsável pela inscrição “Ordem e Progresso” na Bandeira Nacional). O positivismo brasileiro foi forjado nas instituições de ensino militar (únicos centros de ensino técnico superior do país na época), sobretudo na instituição da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro (RJ). Nesta academia, Benjamin Constant definiu a ideia peculiar do cidadão positivista: os direitos civis e sociais nunca deveriam surgir a partir da livre manifestação dos indivíduos, seja no contexto legal (parlamento) ou revolucionário, pois cabia somente ao Estado promover o progresso.


Foto de c.1888 da Escola Militar da Praia Vermelha. O longo prédio foi derrubado e atualmente há, em cada canto da praia, o Instituto Militar de Engenharia (IME) e a Escola de Comando e Estado Maior do Exército (ECEME).

Foto de 1889 do engenheiro militar, professor de matemática, político e principal filósofo positivista brasileiro Benjamin Constant Botelho de Magalhães (1836-1891), que assumiu a pasta do Ministério da Guerra do governo provisório de Deodoro da Fonseca. Apesar de veterano da Guerra do Paraguai, pela foto percebe-se que estava pouco confortável em seu uniforme. Recebeu dos pais o nome do ilustre político, escritor e pensador franco-suíço (Henri-Benjamin Constant de Rebecque), de quem herdou a afinidade de ser mais filósofo do que militar. Faleceu no mesmo ano da morte de D. Pedro II e no ano anterior a do amigo Deodoro.


Os positivistas da mocidade militar carioca seguiam o coração do pensamento de Comte. Defendiam que a sociedade deveria evoluir para analisar os fenômenos sociais para traçar planos de reforma nela. 

Entretanto, como nem todos estavam pareados com esse ideal reformador, imaginavam que era necessária uma elite positivista, dominante e forte, tutelar a república até que todos os membros da sociedade se credenciassem a conduzir os próprios destinos, ou seja, alcançassem o mesmo nível de "adiantamento" da elite.

Tal ideia permeou diversos outros governos republicanos, sobretudo os ditatoriais, que se colocavam no lugar dessa elite positivista.

No período de crise do governo de Deodoro, em novembro de 1891, pouco antes do fechamento do Congresso e renúncia do marechal, houve um projeto de Quintino Bocaiuva para eleger Benjamin Constant o verdadeiro fundador da República Brasileira.

Os Primeiros e Difíceis Passos da Jovem República

O conceito de governo republicano moderno (diferente dos modelos greco-romanos da Antiguidade) era relativamente recente. Apesar da república moderna ter surgido nos EUA em 1776, apenas ao longo do século XIX, após a Revolução Francesa de 1789, esse modelo foi sendo aperfeiçoado.


O conceito de governabilidade que Deodoro tinha como parâmetro era o do Império Brasileiro. Imaginava que o presidente republicano deveria possuir um poder moderador para dissolver o congresso nacional, a intervenção do chefe de Estado nas instituições para manter o equilíbrio entre os poderes (pitorescamente, o conceito do "poder moderador" foi criado por Benjamin Constant de Quebec, de quem o ilustre positivista brasileiro herdou o nome).

O Marechal Deodoro subiu ao poder do Governo Provisório (1889-1891) cercado de militares positivistas. Tais auxiliares viam com desconfiança os políticos e servidores civis, apelidados por eles de “casacas” (pela vestimenta que usavam), os quais eram considerados corruptos e antipatrióticos.

A formação de Deodoro tinha pouca preparação político-administrativa, pois o Marechal era um oficial troupier, isto é, sua carreira foi formada mais marchando entre as tropas, do que nos bancos das escolas ou gabinetes miliares. Dessa forma, levou para o governo uma rígida disciplina, pois, apesar de ter boa índole, estava acostumado a ordenar e ser prontamente obedecido. Tal autoritarismo descontentava os setores civis, principalmente os poderosos cafeicultores paulistas.

Logo no início, o Encilhamento, com Rui Barbosa na pasta do Ministério da Fazenda, levou o governo a uma crise econômica sem precedentes. Foi uma tentativa ingênua de estimular a industrialização nacional (intenção que desagradou os cafeicultores e demais elites agrárias tradicionais), pois consistia em emitir livremente papel-moeda, inclusive sem lastro em ouro, a fim de desenvolver o consumo e os investimentos industriais, mas a medida levou à especulação financeira generalizada e à alta inflação.


Rui Barbosa de Oliveira (1849-1923).
Jurista, escritor, diplomata, filólogo e político baiano. Conheceu grandes vultos na juventude como Castro Alves e José Bonifácio (o Moço). Apesar da grande afinidade às Leis e diplomacia internacional, pouco experiência tinha com economia pública. Tentou eleger-se presidente da República várias vezes sem obter sucesso (talvez, em parte, devido à "nódoa" deixada pelo Encilhamento). 


A foto mostra uma confusão formada por investidores falidos à porta dum banco no centro do Rio de Janeiro (RJ).
"Encilhar" é o ato de colocar a cilha (cinta) na cavalgadura para prender a sela ou a carga. No hipódromo, trata-se do preparativo para entrar com o cavalo na pista. Analogamente, o verbo remetia à agitação que dominavam os jóqueis durante as corridas e à jogatina (apostas). O mesmo aconteceu com a política econômica do governo.

Porém, Deodoro conseguiu determinar, entre outras coisas, a extinção das instituições imperiais garantidas pela Constituição de 1824, o banimento da Família Imperial, a separação entre Igreja e Estado, a cidadania a diversos estrangeiros residentes no Brasil (a exemplo dos imigrantes italianos, trabalhadores assalariados das fazendas de café paulistas) e a convocação de Assembléia Constituinte para setembro de 1890.

A 1ª Constituição republicana, de 1891, denominou o país de "República dos Estados Unidos do Brasil", baseando-se no modelo estadunidense (o atual nome “República Federativa do Brasil” foi dado pela Constituição de 1967). Deixou como herança algumas determinações que chegaram à Magna Carta atual, como o federalismo, a autonomia relativa entre os Três Poderes e a elaboração dos Códigos Civil e Penal pelo governo federal.


Novos Símbolos Nacionais: Bandeira e Hino Republicanos


Bandeira encomendada por Rui Barbosa, líder dos civis republicanos. Perdurou apenas de 15 a 19 de novembro de 1889. Nítida inspiração do pendão nacional estadunidense. A 1ª bandeira da República serviu de base aos pendões estaduais de Goiás, Piauí e Sergipe.

Aliás, o Brasil denominou-se República dos Estados Unidos do Brasil não por acaso (esse nome durou de 1891 a 1946, depois passou a ser apenas Estados Unidos do Brasil até 1967, quando mudou para o nome atual de República Federativa do Brasil).

A queda da Monarquia era amplamente desejada pelos EUA porque o Brasil, maior pais da América Ibérica, sendo Monarquia não tinha como fazer parte de um sistema de repúblicas que os EUA ambicionavam pilotar. Saiba mais no artigo: http://jornalggn.com.br/noticia/a-proclamacao-da-republica-e-a-acao-dos-eua

A inscrição da Bandeira foi inspirada nas palavras de Comte: 
O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim.





A música do Hino Nacional Brasileiro foi composta em 1822, ano da independência do país, por Francisco Manuel da Silva (1795-1865), mas a letra cantada atualmente, oficializada em 1909, de autoria de Joaquim Osório Duque Estrada (1870-1927), só recebeu a forma atual em 1922, no centenário da Independência, por decreto do presidente Epitácio Pessoa.

O hino nacional foi tocado pela primeira vez, apenas instrumentalmente, em 1831, nove anos após a Independência, e só recebeu letra 78 anos depois. De 1500 ao século XIX, o Brasil não possuía um hino genuinamente nacional. Como em Portugal, cantava-se o hino ao rei, que era mudado sempre que um monarca falecia e outro era coroado.

Francisco Manuel da Silva escreveu os primeiros compassos no balcão de um armarinho que existia na rua Senhor dos Passos esquina com a rua Regente Feijó, no centro da cidade do Rio de Janeiro. Tal casa comercial era ponto de encontro de cultuadores de música ouvidas na época do Império, como Zacarias da Cunha Freitas (cantor e cônego da capela imperial), o poeta Laurindo Rebelo (vulgo Lagartixa), Bento Fernandes das Mercês e José Rodrigues Cortes (ambos músicos da corte), e o proprietário do estabelecimento, o clarinetista amador José Maria Teixeira.

Diversas tentativas para acrescentar um texto à música de 1822 foram feitas sem sucesso. Após a Proclamação da Independência, D. Pedro I cometeu desmandos autoritários que descontentaram muitos brasileiros, sobretudo os liberais. Em 1831, o imperador abdicou e Manuel da Silva, discípulo de José Maurício e Neukomm, refez o hino. Os versos originais eram um grito de rebeldia da pátria livre da tutela portuguesa: as primeiras linhas, ressentidas, insultavam os portugueses; as demais pecavam pelas bajulações ao imperador.

A melodia do Hino Nacional durante a monarquia recebeu duas letras em cada respectivo Reinado. EIS A MÚSICA E LETRA ANTERIORES DO HINO NACIONAL ATUAL, O DA COROAÇÃO DE D PEDRO II (1841): http://www.youtube.com/watch?v=F0sO34KCktQ

Logo após a Proclamação da República, foi aberto um concurso para a escolha de novo hino. Foi escolhida a música de Leopoldo Miguez, com letra de Medeiros e Albuquerque. Entretanto, por causa da repulsa do público (inclusive do Mal. Deodoro) - que há tempos simpatizava com a antiga melodia - o hino de Miguez tornou-se o da Proclamação da República. A letra de Duque Estrada, em versos dodecassílabos de estilo parnasiano (estética poética em voga na época da composição), havia vencido um concurso nacional para tal fim em 1906.

Eis a letra original antes das modificações de 1922 (o Hino Nacional ficou por 20 anos sem letra oficial, executava-se apenas a parte instrumental):


I
Ouviram do Ipiranga as margens placidas
Da Independência o brado retumbante,
E o sol da liberdade, em raios fulgidos,
Brilhou no céu da pátria nesse instante.

Se o penhor dessa igualdade
Conseguimos conquistar com braço forte,
Pelo amor da Liberdade
Desafia o nosso peito a própria morte!

Ó Pátria amada,
Idolatrada,
Salve, salve!

Brasil, um sonho intenso, um raio vívido
De amor e de esperança à terra desce.
Escudo em teu céu azul, risonho e limpido,
A imagem do Cruzeiro resplandece.

Gigante pela própria natureza,
És belo, és grande, impávido colosso,
E o teu futuro espelha essa grandeza!
Terra adorada
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos de teu flanco és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!

II
Deitado eternamente em berço esplendido,
Entre as ondas do mar e o céu profundo,
Fulguras, ó Brasil, joia da América
Iluminada ao sol do Novo Mundo!

Do que a terra mais garrida,
Teus risonhos, lindos campos tem mais flores,
"Nossos bosques têm mais vida,"
"Nossa vida," no teu seio, "mais amores!"

Ó Pátria amada,
Idolatrada,
Salve, salve!

Brasil! Seja de amor eterno símbolo
O pavilhão que ostentas estrelado,
E diga o verde louro dessa flamula:
Paz no futuro e gloria no passado.

Mas da Justiça erguendo a clava forte,
Verás que um filho teu não foge à luta
Nem teme, quem te adora, a própria morte,
Terra adorada
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos de teu flanco és mãe gentil,
Pátria amada,
Brasil!

Fonte: http://imperiobrazil.blogspot.com.br/2010/08/hinos-do-brasil.html

O maior avanço democrático da nova Magna Carta foi o fim do voto censitário, permitindo, assim, o tão aguardado sufrágio universal. No entanto, também havia enormes diferenças, como a vedação ao direito de voto às mulheres e analfabetos, e o voto aberto ou não secreto. Além disso, o 1º presidente da República, com mandato de 4 anos, foi eleito indiretamente pela Assembléia Constituinte. Isso ocorreu com Deodoro. O 1º presidente, embora autoritário por hábito, deveria, por lei, se submeter a um congresso controlado pela oligarquia do café.


Juramento Constitucional (c.1891), de Aurélio Figueiredo.
Acervo do Museu da República, Rio de Janeiro (RJ).
Alguns vultos da pintura: Deodoro da Fonseca (fardado e com o livro do juramento a mão) toma posse da Presidência da República. À direita dele (também de farda) o vice, Floriano Peixoto. No canto esquerdo do quadro (logo abaixo de Floriano), José do Patrocínio. Ao lado esquerdo de Deodoro, presidindo a mesa, Prudente de Morais.

Os choques de interesses foram inevitáveis. Tentando serenar os ânimos, o presidente convocou para a pasta da Fazenda uma velha figura ligada às elites agrárias: o Barão de Lucena.


A escolha foi infeliz, pois Lucena chefiou a Guarda Nacional monarquista. Tanto militares positivistas quanto cafeicultores paulistas, temeram um possível retorno à monarquia, através de outro golpe de Estado.


Frente à oposição aberta, Deodoro fechou o Congresso e ordenou a prisão de opositores. No entanto, os principais oposicionistas (entre eles os futuros presidentes civis ligados aos cafeicultores paulistas, Prudente de Morais e Campos Sales) escaparam do cárcere e articularam um contragolpe.


Henrique Pereira de Lucena, o Barão de Lucena (1835-1913).
O pernambucano Lucena personificou para Deodoro "o tiro que saiu pela culatra".

Alguns Estados-membros pegaram em armas. O vice-presidente, Marechal Floriano Peixoto, organizou também uma resistência no Exército. Trabalhadores da Estrada de Ferro Central do Brasil fizeram uma greve política (talvez a 1ª desse tipo do Brasil) em oposição ao Presidente. A Marinha, sob o comando do Almirante Custódio de Melo, atracou navios de guerra na Baía de Guanabara com os canhões apontados para a cidade.


Temendo uma carnificina (“dar mais viúvas ao país”, como afirmou na ocasião), Deodoro renunciou em novembro de 1891, cerca de nove meses após tomar posse: a presidência da Pátria foi-lhe uma “gestação complicada”.


Faleceu no ano seguinte de causas ligadas aos problemas respiratórios, que o acompanhavam há anos (seu ex-antagonista e amigo, D. Pedro II, antecedeu-lhe no mês após a renúncia, no exílio, em Paris).

Diferente de Deodoro, Floriano Peixoto, o Marechal de Ferro, chegou ao fim do mandato (de forma inconstitucional) com o derramamento do sangue de patrícios, a exemplo da Revolta da Armada, de 1893 a 1894 (período retratado por Lima Barreto em O Triste Fim de Policarpo Quaresma) e da Revolução Federalista, de 1893 a 1895.


Marechal Floriano Vieira Peixoto (1839-1895).
Militar conterrâneo de Deodoro, alagoano (12 anos mais jovem). Ascendeu rapidamente na carreira militar ao destacar-se ainda jovem na Guerra do Paraguai. Dentre outros cargos, foi presidente da província de Mato Grosso. Na época da Proclamação da República, esteve responsável pela segurança do gabinete do Visconde de Ouro Preto (quando recusou-se a prender os revoltosos invasores, alegando que não eram paraguaios, mas "irmãos da pátria").

Tornou-se o 2º Presidente da República com a renúncia de Deodoro. Contudo, desobedeceu a Constituição de 1891, que determinava eleições presidenciais em caso de renúncia do chefe de Estado. Pela extrema violência que empregou ao calar os adversários (inclusive com inúmeras prisões e execuções secretas e sem julgamento), foi apelidado de "Marechal de Ferro". Pela aparência enigmática, foi chamado também de "A Esfinge" (a qual "devorou" diversos inimigos seus). Após derrotar a Revolução Federalista em Santa Catarina, a capital, antiga Ilha do Desterro, passou a chamar-se Florianópolis.

Um dos poucos atos realmente populistas de Floriano foi a diminuição dos impostos sobre os alimentos, fato que diminuiu os preços deles. Porém, juntamente com melhorias urbanas que só beneficiaram a capital federal, era apenas uma forma de "presentear" o povo, pois este não tinha acesso ao poder.

Depois de passar a presidência ao civil Prudente de Morais, faleceu no ano seguinte, na calmaria de sua propriedade no interior do Estado fluminense.

...morreu às 17horas do dia 29 de junho de 1895 na Fazenda Paraíso, em Barra Mansa, de uma esclerose hepática hipertrófica. Segundo atestado passado pelos médicos Pedro Nolasco Buarque de Gusmão, Carlos Augusto de Oliveira e Manoel Fernandes da Silva. Seu corpo foi embalsamado e trasladado para o Rio de Janeiro, onde foi sepultado.

[fonte: http://ritaefrank.blogspot.com.br/2012/08/de-que-doenca-faleceu-o-marechal.html]

Tinha apenas 56 anos.

O Amargo Legado do Café


O Palácio do Catete, atual Museu da República.
Construído em 1858 para ser a residência do Barão de Nova Friburgo na cidade do Rio de Janeiro, então sede da corte imperial de D. Pedro II. Como era o mais belo palacete da corte, em 1897 o Governo Federal adquiriu o imóvel (também chamado, a partir de 1910, de Palácio das Águias ou Harpias). O primeiro presidente a residir foi Prudente de Moraes e o último Juscelino Kubitschek, que, em 1960, transferiu a Capital Federal para Brasília-DF.

Em 1894, Floriano foi sucedido pelo paulista Prudente de Moraes (1841-1902), o primeiro presidente civil do Brasil, que iniciou a “República Oligárquica ou do Café com Leite” (1894-1914), nome pelo qual ficaram conhecidos os governos federais que representaram apenas interesses das oligarquias ou plutocracias agrárias, latifundiárias, monocultoras e exportadoras, principalmente do café.

Foto do embarque do café no porto (início do século XX).

BRASIL: A GRANDE FAZENDA DOS BARÕES

A política econômica do Brasil da República Velha se concentrava, em grande parte, em torno do café exportador. Diversas decisões de afetação pública eram tomadas em caráter privado, a exemplo do Convênio de Taubaté (1906): cafeicultores reuniram-se na dita localidade paulista para que os governos de SP, MG e RJ comprassem toda a produção cafeeira em diante, a fim de garantir estoques reguladores, aumentar o preço do café e manter o lucro dos produtores.

Até hoje, na república atual, interesses e decisões políticas particulares (de grupos poderosos, brasileiros ou estrangeiros) se prevalessem sobre os reais interesses públicos que beneficiam a população. A oligarquia (governo de poucos) republicana ainda persiste enrustida de democracia.

Nesse período, o bem-estar e a participação político-administrativa da maior parte da população foram praticamente desprezadas, enquanto as elites se revezavam no poder, sobretudo entre SP, MG e RJ. A insatisfação popular – Guerra de Canudos (1896-97), Revolta da Vacina (1904), da Chibata (1910), Guerra do Contestado (1912-16) etc. - semelhante ao governo de Floriano, foi combatida com extrema violência.


Prisioneiros da Guerra de Canudos (foto de 1897): a maioria composta por mulheres, velhos e crianças, pois os demais, que não conseguiram fugir do cerco do exército republicano, estavam mortos. Sobre esses sobreviventes, segundo Euclides da Cunha, em Os Sertões (1902), misteriosamente nunca mais se teve notícia.
Os governos republicanos nunca divulgaram números oficiais de suas vítimas, pois muitas foram mortas ilegalmente. Estimam-se que 20 mil revoltosos morreram em Canudos (BA); cerca de 30 na Revolta da Vacina (no Rio de Janeiro-RJ); mais de 500 na Revolta da Chibata (também no Rio); entre 5 mil a 8 mil mortos, feridos e desaparecidos na Guerra do Contestado (no PR e SC). Os dois conflitos anteriores, a Revolta da Armada (no Rio) e a Revolução Federalista (RS), geraram juntos cerca de 10 mil mortes (entre revoltosos, legalistas e civis inocentes).

As guerras civis transformaram a República em uma espécie de Saturno, divindade que devorou os próprios filhos.


O marinheiro de 1ª classe João Cândido Felisberto (1880-1969) (à direita na foto), dito o "Almirante Negro", foi o principal líder da Revolta da Chibata (1910), que protestava contra os castigos físicos dos oficiais (na maioria brancos) aos subalternos (em maior parte negros).

Durante toda a vida e até postumamente por um tempo, João Cândido não foi reconhecido como herói nacional ou mesmo destacado participante de parte da história do país pelas autoridades brasileiras, sobretudo a Marinha, que nem ao menos lhe pagou a devida aposentadoria, já que foi anistiado anos depois da Revolta. Muito diferente do caso do herói afro-americano, da Guerra Civil dos EUA (1861-65), Robert Smalls (1839-1915):



Diante dos distúrbios e levantes, o período republicano do final do século XIX e início do século XX ficou marcado pelos "Estados de Sítio ou de Exceção", ou seja, a preservação da ordem político-institucional, através da suspensão de direitos e garantias constitucionais, como o fechamento do Congresso.

As interpretações desse Estado, durante a década de 1890, lembraram, em parte, os moldes de república propostos na época da Proclamação. Foram quatro: a Liberal, de Rui Barbosa; a Jacobina, de José Isidoro Martins Júnior; a Puritana, de Quintino Bocaiúva; a Conservadora, de Campos Sales. Esta última interpretação prevaleceu e transformou o sítio em instrumento rotineiro de governo, empregado em benefício da dominação oligárquica.

A presidência de outro paulista, Campos Sales, de 1898 a 1902, foi a arquiteta do arranjo institucional com a "Política dos Governadores" ou "dos Estados", que deu certo grau de estabilidade ao sistema político. Entretanto, não significou maior equilíbrio de forças entre os governos estaduais ou ampliação dos direitos de cidadania (vide as figuras dominantes dos coronéis e jagunços, nas zonas ruais, e capoeiras, nas grandes cidades).


Manuel Ferraz de Campos Sales (1841-1913).
Um dos presidentes republicanos que personificaram as oligarquias do café paulista. Membro-fundador do Partido Republicano Paulista, o 4º presidente foi responsável por medidas que desgostaram os setores populares, como o imposto sobre o selo (fato que lhe rendeu o apelido de "Campos Selos"), e a retirada de circulação de papel-moeda (para tentar frear a forte inflação, mas que prejudicou o comércio interno).

Antigos aspectos sócio-políticos e antidemocráticos foram mantidos, como o coronelismo, apadrinhamento, nepotismo, voto de cabresto, política latifundiária, fraudes eleitorais etc. Estes elementos encontram eco até hoje na sociedade.



Fotos, do início do século XX, de coronéis e jagunços (força armada dos primeiros).


Os coronéis da República, "senhores feudais" modernos, eram os herdeiros dos aristocratas chefes das milícias locais da Guarda Nacional, criada em 1831, para manter a unidade do Império (as raízes talvez sejam mais antigas, datam dos donos das sesmarias e Capitanias Hereditárias do início da época colonial).

Um exemplo disso foi a guerra entre coronéis disputando terras na região da antiga Ilha de Tinharé ou Ilhéus (BA). Entre 1890 e 1920, tropas mercenárias sertanejas (jagunços e até militares da polícia e Exército) lutaram em sangrentas batalhas disputando espaços para a plantação do rendoso cacau (outra monocultura em voga voltada à exportação, além do café e da borracha natural). Diante desse "faroeste caboclo", o Estado, como de costume, fez vistas grossas: eram "Estados particulares" dentro do Estado oficial, visto que os grandes donos de terras "faziam as leis" e controlavam a administração local na prática, a exemplo das nomeações dos seus afilhados ou apadrinhados (nepotismo).

A Política dos Governadores e República da Degola


Era um mecanismo estadual. Uma espécie de "federalismo do toma-lá-da-cá": os governadores dos estados-membros apoiavam o presidente da República (através de parlamentares no Congresso) e em troca o governo federal não intervinha nos assuntos estaduais (eternizando as oligarquias locais). A fraude eleitoral era praticamente a regra geral. Além disso, a Comissão Verificadora de Poderes (CVP) poderia não permitir que um agente político de oposição (deputado ou senador), que não seguisse as orientações, não fosse diplomado e tomasse posse; era a famosa "degola".

O Coronelismo


Era um mecanismo municipal. Grandes latifundiários da lavoura de exportação, vulgo "coronéis", tinham poder econômico e político em suas localidades. Utilizavam a fraude eleitoral, muito comum, para eleger quem desejavam. Havia um clientelismo junto aos eleitores mais pobres, pois a falta de serviços públicos (aliado ao desinteresse dos governos) gerava um assistencialismo primitivo da população local que dependia dos coronéis, e por isso eram fiéis a eles. A dependência nutria o "curral eleitoral" do "voto de cabresto", pois o coronel podia utilizar até da violência para que o eleitorado votasse em seu candidato.

Roubo de urnas, falsificação de títulos de eleitor e outras fraudes garantiam grande números de votos, para que os coronéis barganhassem com os governadores do estado deles benefícios. Assim, elegia-se governadores e presidentes das oligarquias, na República Velha, geralmente paulistas ou mineiros.


A REPÚBLICA TROUXE ENFIM A UNIVERSIDADE

Durante o período colonial as universidades foram proibidas no Brasil. No Império houve faculdades no Recife, em São Paulo, no Rio. Mas a primeira universidade foi criada apenas em 1920, a Universidade do Brasil, atual UFRJ. Temos, como país incorporado à cultura ocidental, 515 anos. Nossa mais antiga universidade não chega a 100.

Trecho da coluna de Marcio Tavares D'amaral: http://oglobo.globo.com/cultura/conversa-sem-educacao-16306601

A República da Belle Époque e do Bota-abaixo 

No intuito de se equipar às grandes nações ditas "civilizadas", a República oligárquica recorreu a modelos europeus de desenvolvimento, com ênfase especial no modelo francês. O Rio de Janeiro, como capital federal, deveria servir de exemplo para o restante do Brasil, ser a vitrine do tão almejado progresso.

A Cidade Maravilhosa, entre os séculos XIX e XX, ainda conservava uma arquitetura colonial com precária infraestrutura, com antigos casarões transformados em cortiços, ruas estreitas e insalubres, muitas com valas abertas. O meio ideal para a propagação de epidemias, como a febre amarela, que desde a colonização grassavam pela cidade. Era o retrato do atraso que a República queria extirpar perante o mundo.

A tentativa da "mudança civilizatória" foi iniciada durante o governo de Campos Sales (1898-1902) e intensificada por Rodrigues Alves (1902-06), que nomeou o famoso Pereira Passos (1836-1913). Este prefeito fluminense foi o primeiro a impulsionar os canteiros de obras da modernização urbana. Nitidamente baseado nas reformas da cidade de Paris, Passos tornou-se o "Haussmann dos Trópicos" (referência ao barão e prefeito que remodelou a capital da França, durante o império de Napoleão III).

A Reforma Urbana de Passos foi a principal marca da Belle Époque carioca. Antigos edifícios, alguns ainda coloniais, foram ao chão (daí surgiu o popular termo "bota-abaixo"), ruas foram alargadas e novas praças e jardins foram criados. A remodelação teve na abertura da Avenida Central o seu mais notável símbolo. Com sua moderna iluminação e bondes elétricos, a arquitetura art noveau combinada com o ecletismo presente nos diversos edifícios, a avenida materializou o espírito republicano modernizador da época.


Rua do Ouvidor, Centro do Rio, em 1896.
Machado de Assis uma vez escreveu que se o Rio de Janeiro tivesse um rosto, este seria a Rua do Ouvidor. A via era realmente o grande cenário do final do século XIX. O escritor não só a retratava em suas obras, como também era frequentador assíduo da rua mais charmosa da cidade. Toda a agitação se concentrava naquele local: as lojas mais chiques, as livrarias, as discussões intelectuais nas confeitarias. Era a principal artéria do centro do Rio de Janeiro. [...] E tudo que acontecia aqui, irradiava para o resto do país [Fonte: http://puc-riodigital.com.puc-rio.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1873&sid=55].
A partir do século XX, a abertura da Av. Central e demais vias modernas destituíram aos poucos o "status supremo" da estreita e antiquada Ouvidor.


 A recém-aberta, em 1905, Avenida Central (atual Rio Branco, no Centro do Rio). O Theatro Municipal (à esquerda), feito de materiais nobres - como mármore, ônix e bronze - é quase uma cópia menor do L'Opéra de Paris. O palácio da Escola Nacional de Belas Artes (à direita), fundado em 1826, foi remodelado e hoje é o Museu Nacional de Belas Artes.


Foto do Theatro Municipal nos anos de 1920 (nota-se o belo calçamento de pedras portuguesas do teatro e da praça Mal. Floriano, em frente). À esquerda a avenida Treze de Maio (antiga rua da Guarda Velha; o nome ainda vigente refere-se ao dia da assinatura da Lei Áurea) e à direita a avenida Rio Branco (ex-avenida Central; nome em homenagem ao Barão do Rio Branco, Ministro das Relações Exteriores falecido em 1912, ano da mudança do nome).


Av. Central, atual Rio Branco (c.1908). A baixo duas fotos mostrando os avançados (para época) postes de luz elétrica (anos 1920).






Av. Rio Branco, à esquerda edifício da Escola Nacional de Belas Artes (atual Museu) inaugurado em 1908.


Avenida já renomeada "Rio Branco", ponto de vista elevado de uma das laterais da Biblioteca Nacional (anos 1930).

As reformas e saneamentos do século XX renomearam a "Cidade da Morte" (apelido colonial por causa das epidemias) em "Cidade Maravilhosa", graças ao político e literato Coelho Neto.



As fotos acima mostram o Pão de Açúcar (ao fundo no centro) e o Morro do Castelo (à esquerda). Este último sediou a ocupação definitiva da cidade, transferida do Morro Cara de Cão, a partir de fins do século XVI. No alto deste morro, foi erguida uma fortificação (castelo) e um mosteiro e igreja jesuítas. Com o desenvolvimento urbano, ao longo dos séculos, os habitantes mais abastados foram residir em outras áreas; ficaram para trás os mais pobres. Visto como um obstáculo à modernização, a partir do início do século XX, o histórico morro foi sendo desmontado para abrir espaço à Avenida Central e aos imóveis mais valorizados. O progresso republicano botou abaixo até mesmo o antigo complexo arquitetônico dos jesuítas (o material do morro, que terminou de ser totalmente derrubado nos anos de 1930, foi usado para aterrar parte da Baía de Guanabara, com o intuito de abrir novas vias, a exemplo da Avenida Beira Mar).

Rio de Janeiro, 14 de julho de 2016




Hoje foi dia de celebrar os 107 anos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

Mas gostaria que não celebrássemos em clima de festinha vazia. Temos de pensar muito a respeito deste prédio cuja águia dourada enfeita uma praça com vista para o Pão de Açúcar. O que isto tudo significa? Numa cidade volátil como a nossa, que já viu o trator da história passar por cima de pedras, vidas, memórias e tantas outras construções. Quem olha para este belo prédio com detalhes em dourado, mármore e vitral, pode até pensar que ele já está ali desde tempos imemoriais, mas longe disso.

Muitos pensam que é o teatro mais antigo do Brasil, mas ao fazê-lo, estão apenas sepultando uma memória que, materialmente já foi demolida há muito tempo: nesta mesma cidade, já houve os Teatros São João, São Pedro, Lyrico, Lyrico Fluminense, Teatro Provisório e muitos outros, com uma história riquíssima ao longo de todo o século XIX (em outras cidades brasileiras, como Salvador, Belém, Manaus e Vila Rica, a história também remonta a um passado muito mais distante).

Este teatro foi construído com muita dor. Onde ele existe hoje, já houve casas, comércios, igrejas, seminários, becos, praças e ruas cheias de vida, num lugar chamado Largo da Mãe do Bispo.


Acontece que um projeto político megalomaníaco e poderoso representado pelo poder autoritário de um prefeito chamado Pereira Passos e presidente Rodrigues Alves fecharam os ouvidos a quem vivia, trabalhava, morava e passava por amplas regiões do centro da cidade do Rio. Se puseram a serviço de um modelo de desapropriações forçadas, demolições e destruição de patrimônio sem precedentes nesta cidade. Numa época em que se estava ás vésperas de uma Exposição Internacional (comemorando o centenário dos portos, em 1908), o prefeito e seus apoiadores achavam que aquelas construções eram pequenas demais, desorganizadas demais, as ruas apertadas e mal-traçadas, uma vergonha: era necessário se fazer o mesmo que este prefeito assistiu em Paris: um prefeito (Haussmann) tratou de tirar de seu escritório um plano urbanístico geométrico, racional, que botasse abaixo tudo aquilo que era velho e sem valor.

Não é necessário dizer que o custo social deste eterno bota-abaixo continua exigindo suas multas, mais de um século depois. O mesmo pensamento que desistorizou a cidade, e acabou por jogar no lixo mais de 300 anos de ocupação e arrasou (ao longo de todo o século XX) o centro histórico da cidade para dar lugar a uma cidade moderna condenou aquela moderníssima Avenida Central a sua própria destruição: edifícios em estilos que estavam na moda em 1905, foram substituídos por monstruosas caixas de fósforos sem a menor personalidade.

Hoje o Theatro Municipal resiste como um monumento ao passado. Este que já foi o edifício mais alto da Cinelândia, hoje parece um anãozinho entre os gigantes feiosos que lhe fazem sombra. Que ironia, aquilo que representava a modernidade e o progresso inexorável estar afogado hoje nesta selva de pedra.


O que quero dizer é que temos de estar atentos, pois ainda vivemos numa cidade que aplaude um prefeito autoritário e debochado que se acha dono do progresso passar por cima da memória coletiva, da identidade da cidade e (muito mais importante) das vidas que as pessoas construíram ao longo de seus anos, seus sonhos, anseios, barracos, pequenos comércios, lugares de culto, bens culturais e mesmo as pracinhas que são locais fundamentais no processo de identidade enquanto ser humano. Em nome de que se continua destruindo vidas? Sempre o mesmo discurso: mostrar para os estrangeiros que somos capazes.

Capazes de que? Capazes de construir um teatro de ópera de acordo com o que qualquer capital civilizada do mundo tenha (quase tão bonito quanto o de Paris!!!). Capazes de rasgar largas avenidas que nem as tem em Paris!!! Capazes de mover cidadãos que não servem mais. Capazes de destruir e reconstruir toda uma cidade de acordo com os modelos que venham do exterior, na esperança de que consigamos impressionar os "gringos". Nunca a motivação é: queremos um teatro de ópera legal, queremos abrir ruas novas expandindo a cidade (em outro lugar, abrindo um centro novo).


Gostaria de acreditar que edifícios e instituições como o Theatro Municipal estariam aí para sempre e que tivessem finalmente conseguido pagar a imensa dívida de sangue com as quais já nasceram. Temos que pensar se precisamos de um teatro de ópera e balé como este. Se não pensarmos nós mesmos, fiquem tranquilos que alguém tratará de impor suas convicções. Enquanto não abraçarmos o direito á permanência de edifícios e instituições que passam a ser vistos como descartáveis para as autoridades, estaremos sempre suscetíveis ao próximo prefeito autoritário que se aliar com poderosas empreiteiras, gastando o dinheiro de impostos para promover a destruição, desemprego e violência.

Texto de Carlos Bertão, músico (fagotista) do Theatro Minicipal-RJ, via Facebook.


A foto, tirada no ponto de vista da atual av. Treze de Maio, mostra as obras das fundações do Theatro Municipal (23/05/1905). Ao fundo, nota-se o início do desmonte do Morro do Castelo.


Theatro Municipal do RJ em construção (c.1907). Ponto de vista do Morro do Castelo, antes de ser completamente arrasado. Notamos ao fundo o Morro de Santo Antônio, o qual desapareceria quase por completo entre os anos de 1960 e 1970 para dar lugar a Av. República do Chile. Grande parte do material do desmonte serviu para construir o Aterro do Flamengo.


Fotos tiradas com o Morro do Castelo quase intacto (c.1903), época em que ainda estavam construindo os ainda existentes prédios do Museu Nacional de Belas Artes e da Biblioteca Nacional.

Foto tirada no alto do Morro do Castelo, ao fundo parte do complexo arquitetônico jesuíta.




As duas fotos acima: Demolição da Igreja de São Sebastião e Convento dos Capuchinhos (Morro do Castelo), em 11/03/1922. Os restos mortais do fundador da cidade, Estácio de Sá, foram trasladados para a igreja da ordem no bairro da Tijuca, onde se encontram até hoje.

Até seu desmonte em 1922 [a tempo para as comemorações do centenário da independência do país], o morro do Castelo abrigava nas humildes casas muitas adivinhas. Elas sabiam de tudo, mesmo de política, e, em época de eleição, indicavam qual daqueles inacreditáveis candidatos seria o melhor para cidade.

Tanto que Machado de Assis põe uma delas na primeira página de seu penúltimo romance, não tão falado mas excelente "Esaú e Jacó". Bárbara, conhecida como "cabocla", recebe Natividade, senhorinha da rica sociedade de Botafogo. Esta quer descobrir o destino dos filhos gêmeos, Pedro e Paulo, que tinham acabado de nascer. Bárbara fuma, mira o retrato dos dois, anuncia: "Cousas futuras!".

Fonte (com adição): http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2014/10/1526577-diario-do-rio---o-point-dos-cronistas-e-o-app-do-machado.shtml

Sobre mais morros desmontados do Centro do Rio: http://www.riodejaneiroaqui.com/pt/centro-do-rio-1873.html




Principal acesso ao extinto Morro do Castelo (fotos de c.2008):
O que restou da Ladeira da Misericórdia, no final do largo que leva o mesmo nome (ao lado dos fundos do Museu Histórico Nacional). No sopé dos vestígios da ladeira - que leva a lugar nenhum (trecho de rua sem saída) - está a Igreja de Nossa Senhora do Bonsucesso, anexa à Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. 


Vista do alto do Castelo voltada para atual Praça XV (c.1890).


Foto tirada diante de uma das vistas do alto do Morro do Castelo durante o desmonte (anos de 1910-20). Nota-se a Igreja de Santa Luzia (além da Santa Casa da Misericórdia, hoje é um dos raros imóveis da região do Castelo que sobreviveram) e, em frente dela, a Ilha de Villegagnon (sede da Escola Naval): toda essa parte costeira da Baía de Guanabara foi aterrada com o material retirado do morro, como mostra a foto a baixo dos anos 1930-40.


Casa de banhos de mar da extinta Praia de Santa Luzia (c.1910).


Foto do desmonte do Morro do Castelo feito por enormes mangueiras d'água de alta pressão (c.1922). Além dessa colina, o Morro de Santo Antônio e partes de demais vizinhos foram arrasados para aterrar o litoral dos bairros do Centro, Lapa, Glória e Flamengo.


Foto de 1929: grande descampado do Castelo (área do Centro onde está a av. Pres. Antônio Carlos) deixado pelo desaparecimento do morro. No alto, à esquerda, o longo e baixo prédio da bem antiga Santa Casa de Misericórdia (hospital), ainda existente.


Foto aérea (c.1940-50) mostrando nitidamente o aterro, de parte da baía, que alcançaria a Ilha de Villegagnon (atual Escola Naval, no alto à esquerda) e que compreenderia as pistas e jardins do Aterro do Flamengo, graças ao material dos morros do entorno. Na parte baixa da foto, estão as ilhas Fiscal e das Cobras (Arsenal dentre outros departamentos da Marinha).


Foto colorizada da Av. Beira-Mar (recém aterrada), altura do Passeio Público, em festividade por volta de 1908. Ao fundo, o bairro da Glória.

A República da Belle Époque também modificou a esfera social, como a moda e os costumes. As varandas e salões coloniais foram abandonados em favor dos footing (palavra inglesa) ou da prática da flânerie (termo francês), ou seja, dos passeios pelas novas avenidas, palácios, praças e jardins, bem à moda parisiense. A burguesia flanava ostentando chapéus, bengalas, sombrinhas, espartilhos e demais modismos europeus vendidos em lojas de luxo - como nos já tradicionais estabelecimentos da Rua do Ouvidor - e divulgados nas revistas sociais e demais publicações.


 Mulheres da alta sociedade carioca na Expo de 1908.

As Grandes Vitrines da República

As grandes exposições mundiais, universais ou internacionais eram formas organizadas por países industrializados, para divulgarem, aos demais países amigos, o potencial de desenvolvimento, e, assim, fomentar, dentre outros benefícios, relações comerciais entre as nações participantes. Tais eventos surgiram na Europa em fins do século XVIII. As mais célebres foram a de Londres (1851) e Paris (1889, marcada pela inauguração da Torre Eiffel). O Brasil, embora pouco industrializado, participou de diversas delas entre o século XIX e XX, para divulgar, sobretudo os produtos agrícolas (a exemplo do café e da borracha natural). Tais grandes "Expos" ainda são organizadas.

Durante a Primeira República, houve duas grandes exposições no Brasil, ambas na Capital Federal do Rio de Janeiro, em 1908 e 1922. A primeira, nacional (com participação de Portugal), em comemoração ao centenário da Abertura dos Portos e a segunda, internacional (com 14 países), pelos cem anos da Independência.

Nas duas "Expos", os belos e imponentes pavilhões temporários sobre os Estados brasileiros e países convidados - que foram erguidos na Urca e a Praia Vermelha (1908) e no Centro (1922) - visavam mostrar a todos o quão desenvolvido estava o Brasil, e o futuro promissor do progresso republicano. Alguns dos temas dos pavilhões eram ciências e artes; mecânica; eletricidade; engenharia civil e transporte; agricultura; mineração e metalurgia; decoração e mobiliário; tecidos e vestuários; indústria química; higiene e assistência; comércio e esportes.



  

Exemplo de um belo pavilhão na Praia Vermelha: Sociedade Nacional de Agricultura.


CUSTOS MATERIAIS E HUMANOS NOS PRINCIPAIS EVENTOS INTERNACIONAIS SEDIADOS NA EX-CAPITAL FEDERAL (RIO DE JANEIRO-RJ) NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX.

Exposição Nacional de 1908
Rio de Janeiro, agosto a novembro de 1908.

Custos:Os gastos foram divididos entre governos estaduais e federal. A União, o menor investidor, gastou 5.000:000$000 – cerca de 1% do orçamento anual. Grande quantidade de moradores pobres das regiões nobres foi expulsa para a periferia.

Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil
Rio de janeiro, 7 de setembro de 1922 a 7 de setembro de 1923.

Custos:Os gastos da União foram de 105.000:000$000. Em época de crise econômica, o investimento de vultosa quantia em festejo gerou insatisfação. Parte dos gastos foi em arquitetura efêmera. Centenas de famílias foram despejadas do Centro, migrando principalmente para a região portuária. A imprensa foi contra, mas ao receber dinheiro de publicidade estatal, mudou a postura.

Copa do Mundo de futebol de 1950
Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Curitiba, Porto Alegre, de 24 de junho a 16 de julho de 1950.

Custos: A verba usada no Maracanã era pública. Segundo dados do livro 1950: O preço de uma Copa, o orçamento original do estádio era de 150 milhões de cruzeiros, mas a conta fechou, oficialmente, em 230 milhões de cruzeiros, algo em torno de R$ 410,3 milhões. Fifa e CBF não souberam dar informações sobre o assunto.




REMOÇÕES DOS JOGOS OLÍMPICOS DO RIO DE JANEIRO EM 2016

Desde 2009, ano em que a cidade foi escolhida para sediar os Jogos, mais de 77 mil pessoas perderam suas casas no Rio. São tantos casos que se tornou impossível nomear todas as comunidades neste mapa. Eduardo Paes removeu famílias utilizando argumentos mentirosos, como o da construção das vias expressas e o de riscos de desabamento, sem nunca discutir com os afetados alternativas às remoções, como alterações de trajetos e obras de contenção.

Alguns casos de remoção e de resistência se tornaram símbolos dessa política. A favela Metrô Mangueira, por exemplo, foi removida por estar a menos de 1km do Maracanã, sendo que nunca foi apresentada oficialmente uma justificativa para sua retirada. Ao lado do Parque Olímpico temos a Vila Autódromo, que foi reduzida de cerca de 600 casas para 20, também apenas por estar ao lado de uma área de intensa valorização imobiliária. A construção da TransOeste, por sua vez, levou a destruição completa da Vila Recreio II (235 famílias) e da Vila Harmonia (125 famílias), que saíriam, segundo a prefeitura, por estarem exatamente no local por onde a via passaria. Hoje são terrenos vazios ao lado da TransOeste, apenas aguardando a chegada de um novo empreendimento imobiliário.

Este foi o maior processo de remoções da história do Rio. É uma política que utilizou os megaeventos como desculpa e que certamente usará novos argumentos para seguir no processo de expulsão das camadas mais pobres da população de áreas de interesse empresarial.








As confeitarias e cafés - como também os luxuosos restaurantes de rua, hotéis, clubes e cassinos - satisfaziam os prazeres da sofisticada culinária francesa. O inglês e, sobretudo, o francês passaram a ser as demais línguas da burguesia, desde a segunda metade do século XIX. Assistiam-se as partidas de football, andava-se de carro com chauffeur, liam-se sob a luz do abat-jour no menu (com ou sem o auxílio do pince-nez) o nome das iguarias do buffet, como foie gras, ceuis broulliés aux truffes, chaud-froid e crêpe suzette, "regados" com champagne ou cognac e doces da bonbonnière.


A Confeitaria Colombo, inaugurada em 1894, é, junto com o Theatro Municipal, uma das jóias da Belle Époque carioca. O estabelecimento, semelhante a outros, funcionava como uma verdadeira esfera pública; um espaço de discussão frequentado por políticos, literatos, artistas e pela elite em geral, como Olavo Bilac, Rui Barbosa, Machado de Assis, José do Patrocínio, Lima Barreto, Villa-Lobos, Lamartine Babo, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e demais vultos.


ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL)
A intelectualidade nos moldes franceses

No fim do século XIX, Afonso Celso Júnior, ainda no Império, e Medeiros e Albuquerque, já na República, manifestaram-se a favor da criação de uma academia literária nacional, nos moldes da Academia Francesa. O êxito social e cultural da "Revista Brasileira", de José Veríssimo, daria coesão a um grupo de escritores e, assim, possibilidade à idéia.

Fizeram parte das cadeiras fundadoras os maiores nomes, ainda vivos, das Letras do Brasil naquela época. Eram quarenta, semelhante ao modelos da Academia Francesa: Araripe Júnior, Artur Azevedo, Graça Aranha, Guimarães Passos, Inglês de Sousa, Joaquim Nabuco, José Veríssimo, Lúcio de Mendonça, Machado de Assis (presidente), Medeiros e Albuquerque, Olavo Bilac, Pedro Rabelo, Rodrigo Otávio, Silva Ramos, Teixeira de Melo, Visconde de Taunay, Coelho Neto, Filinto de Almeida, José do Patrocínio, Luís Murat, Valentim Magalhães, Afonso Celso Júnior, Alberto de Oliveira, Alcindo Guanabara, Carlos de Laet, Garcia Redondo, Pereira da Silva, Rui Barbosa, Sílvio Romero, Urbano Duarte, Aluísio Azevedo, Barão de Loreto, Clóvis Beviláqua, Domício da Gama, Eduardo Prado, Luís Guimarães Júnior, Magalhães de Azeredo, Oliveira Lima, Raimundo Correia e Salvador de Mendonça.

Em 1923, o governo francês doou à Academia Brasileira de Letras um prédio, réplica do Petit Trianon de Versailles, construído no ano anterior para abrigar o pavilhão da França na Exposição Internacional comemorativa do Centenário da Independência do Brasil, no Rio de Janeiro.


Primeira sede própria da Academia, o prédio funciona até os dias de hoje como local para as reuniões regulares dos Acadêmicos e para as Sessões Solenes comemorativas e de posse de novos membros da ABL.

Fonte: http://www.academia.org.br/

A vida cosmopolita dos novos burgueses substituiu as provincianas convenções sociais aristocráticas do período monárquico, geralmente afastadas dos olhares comuns. A nova burguesia adorava mostrar-se, e não apenas nos teatros e palacetes. Em 1898, chegou ao Brasil o cinematógrafo ou cinema, novo entretenimento que começou a se desenvolver em 1907 com o melhor fornecimento de energia elétrica. Antes da sonorização, os filmes mudos eram acompanhados por música ao vivo. O compositor Ernesto Nazareth, que também era excelente pianista, foi músico de cinematógrafo (diziam que os espectadores gostavam mais de ouvi-lo, do que assistir a fita).


A baixo, fotos da Praça Marechal Floriano ou Cinelândia (dos anos de 1900 a 1920)


 Foto de 1905: à esquerda da avenida Central (recém-aberta) está a Biblioteca Nacional em construção, à direita o Convento da Ajuda (fundado no século XVIII) e demais edifícios que logo desapareceriam.


Foto de 1909 do ponto de vista da calçada do Theatro Municipal. Na recém-inaugurada praça, havia canteiros e jardins (hoje desaparecidos). À esquerda está a Biblioteca já completa, logo ao fundo dela o Palácio da Justiça Federal e, ao fundo à direita, o Palácio Monroe (antigo Senado Federal).

Foto de 1911 de um ponto de vista elevado do Palácio Monroe.
Uma verdadeira cópia de uma praça parisiense.

Praça por volta de 1925.
No centro, o monumento à memória do Mal. Floriano (que deu nome à praça), ao fundo o Theatro Municipal e à direita dele o atual Museu Nacional de Belas Artes.



Foto de 1908 da fachada do Cinematógrapho Pathé (inaugurado no ano anterior).

Foto dos anos 1950-60 da Praça Marechal Floriano Peixoto, que até hoje é mais conhecida como Cinelândia, nome que recebeu nos anos de 1920, visto que concentrava as principais salas de cinema da cidade, como o Pathé, Palais, Glória, Capitólio e Odeon. Hoje somente o último ainda está em funcionamento (ao fundo, vê-se o extinto palácio do Senado Federal, o Monroe).

Palácio Monroe: 
O bota-abaixo tardio da Av. Central

Seu projeto foi desenvolvido pelo engenheiro militar Francisco Marcelino de Souza Aguiar (mais tarde eleito prefeito do DF, ou seja, do Rio) para representar o Brasil durante a Exposição de Saint Louis (Louisiana Purchase Exposition) em 1904 nos Estados Unidos. Erguido no dia 24 de maio do dito ano. Tanto que foi chamado a princípio de Palácio Saint-Luís. Na ocasião, a obra foi premiada com a medalha de ouro no Grande Prêmio Mundial de Arquitetura. O Saint-Luís, depois rebatizado de Palácio Monroe por Joaquim Nabuco, em homenagem a James Monroe: o quinto presidente dos Estados Unidos, eleito em 1816 e reeleito em 1820. Em 1904, foi realizada a comemoração do centenário da aquisição do território da Louisiana, que James Monroe negociara com a França em 1803.

Um tesouro arquitetônico perdido: 
o belíssimo Palácio Monroe resistiu por 70 anos (foto da época da inauguração).


Foto-registro da remontagem do Monroe (c.1905).

 Foi completamente desmontado e trazido para o Rio de Janeiro de navio, para ser reerguido em 23 de julho de 1906, época da inauguração da Avenida Central. Imagine fazer algo assim nos dias de hoje!




Três fotos mostrando vistas internas do Monroe: salão de entrada, escadarias e vista do segundo piso voltada pra Cinelândia.

O prédio de inspiração eclética afinava-se perfeitamente a proposta do então prefeito Pereira Passos, que na ocasião, expandia a malha urbana e modificava a paisagem e o contexto social carioca. Enquanto o Brasil colonial ia abaixo, modernas estruturas eram erguidas na Avenida Central (atual Rio Branco). O espaço acabou abrigando a sede da Câmara dos Deputados e depois do Senado Federal, em 27 de abril de 1925. Quando a capital foi transferida para Brasília, o Monroe virou escritório de representação do Senado no Rio de Janeiro e logo depois tornou-se sede do Estado Maior das Forças Armadas.


Foto dos anos de 1950.

A década de 1970 trazia um novo traçado para a cidade que, mesmo perdendo o status de capital federal, não parava de crescer e apontar novos projetos de modernidade. Bondes, ônibus e trens não eram mais o bastante e a estação de metrô da Cinelândia foi tirada do papel. Na época, pensou-se em desviar o traçado dos túneis para não afetar as fundações do Palácio Monroe. Pensaram em tombá-lo como patrimônio histórico. Porém, prevaleceu a corrente que era a favor da demolição do edifício (dizem que Lúcio Costa, um dos projetistas de Brasília, sugeriu a demolição, pois o Monroe atrapalhava a vista para o Monumento aos Mortos da Segunda Guerra, bem mais moderno). Em 1976, ele foi abaixo. Em seu lugar está a Praça Mahatma Gandhi e um grande chafariz do século XIX transladado da Praça da Bandeira.


Vista do Monroe e da Av. Beira-Mar entre os anos 1920 e 30.





No último suspiro: duas fotos dos anos 1970.

O RIO DAS REFORMAS (excludentes)


A cidade do Rio de Janeiro foi, em boa parte, desenvolvida em área aterrada (visto que diversos terrenos do núcleo inicial de urbanização eram alagadiços). Muito também se demoliu, tornando comum a expressão "bota-abaixo". Metrópole de confluência do país, o Rio foi fundamental nos primeiros anos de sua fundação; foi inclusive capital do Brasil, depois de Salvador (BA), já que passou a ser o porto de embarque (exportado para Portugal) do ouro extraído de Minas Gerais no século XVIII, por quase dois séculos (1763-1960), até a sede administrativa nacional ser transferida para Brasília - uma das tantas viradas abruptas que ditaram as direções da urbanização carioca. O desmonte do Morro do Castelo contém a gênese das contradições e máculas da formação da cidade.  

A população carioca duplicou - de 274 mil para 522 mil habitantes - entre 1872 e 1890, por ter atraído estrangeiros em virtude da Guerra do Paraguai e ex-escravos oriundos da abolição da escravatura, dentre outros motivos. A partir dos ideais de modernidade europeus, deu-se então o urbanismo de embelezamento (1875-1930), com foco no progresso, no saneamento, no combate a doenças e na remoção de populações pobres sem grandes análises estruturais e sociais.

Pereira Passos (prefeito carioca de 1902 a 1906) é o governante mais citado deste período por ter transformado a cidade na Belle Époque Tropical. Dentre muitas outras intervenções, demoliu cerca de 1700 imóveis e desmontou, em 1904, uma das encostas do Morro do Castelo para dois fins: abrir espaço para o alargamento da avenida Central, atual avenida Rio Branco, e utilizar os resíduos no aterramento da Baía de Guanabara, onde construiu a avenida Beira-Mar - ambas hoje, descaracterizadas.



Se antes, as mudanças da economia e de ocupação da cidade já haviam iniciado o esvaziamento do Castelo, foi inevitável a intensificação do círculo vicioso de decadência e insalubridade após a sua primewira demolição, atraindo, como os outros morros, moradias populares devido às desapropriações e destruições das casas e dos cortiços.

A gestão de Carlos Sampaio (1920-1922) determinou a continuação da derrubada do Morro do Castelo dentro da mesma linha de saneamento e deslocamento da pobreza das zonas nobres para as periferias da cidade, preparando-a para o evento do Centenário da Independência em 1922 - ocorrido exatamente no terreno do morro posto ao chão. Seu arrasamento, no entanto, só foi concluído em definitivo na gestão de Prado Júnior (1926-1930, o último prefeito carioca da República Velha), época em que foi elaborado o primeiro plano diretor do município (na época capital federal) - o Plano Agache, de autoria do arquiteto francês Donald Alfred Agache.

Já no segundo período de urbanização, chamado por alguns de "Planos de Conjunto" (1930-1965) - quando as vias passam a ser pensadas não só em termos estéticos, mas também em função das necessidades do território amplo das cidades e dos transportes -, o prefeito Henrique Dodsworth (mandato de 1937 a 1945, mesmo período do ditatorial Estado Novo do presidente Getúlio Vargas, que o nomeou) determinou a construção da avenida Presidente Vargas, aumentado as estatísticas de demolições com quase mil imóveis postos abaixo, entre os quais quatro igrejas seculares.

Outro desmantelamento importante foi o do Morro de Santo Antônio, no Largo da Carioca, desmontado em 1952 (resta atualmente apenas a igreja e o mosteiro homônimo do morro), servindo ao encobrimento do Aterro do Flamengo a partir de 1961, ligando o centro da cidade às praias da zona sul. Dos morros de fundação, foram preservados, afinal, o de São Bento e o da Conceição, excelentes locais de visitação.



FAVELAS DA CATACUMBA E DO PASMADO: HERDEIRAS DO CASTELO E PROVIDÊNCIA

Por volta de 1925, o Estado dividiu a Chácara das Catacumbas [às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, área nobre na zona sul do Rio] em 32 lotes. Os primeiros barracos da futura favela começaram a ser erguidos ainda nos anos 1930. Mas a explosão demográfica só aconteceu mesmo na década de 1940, com a chegada de uma leva de migrantes vindos, principalmente, do estado do Maranhão.

A Favela da Catacumba foi removida em 1970 pelo antigo governador da Guanabara, Negrão de Lima. A Catacumba era uma favela sem nenhum modo de ser urbanizada e num local de alto risco de desabamentos. Junto com as outras favelas do entorno da Lagoa (da Praia do Pinto, da Macedo Sobrinho e da Ilha das Dragas, todas extintas), a Catacumba contribuía com o esgoto in natura que era despejado direto na Lagoa Rodrigo de Freitas. A comunidade tinha 2.320 barracos (a maioria de madeira) e cerca de 15 mil habitantes. Não existia serviço de água potável na comunidade. Para 89% dos moradores, o dia começava cedo nas 15 bicas públicas que existiam já perto do asfalto.

A maioria das famílias da Catacumba foi transferida para o Conjunto Guaporé-Quitungo, construído pela COHAB na Penha, enquanto outras foram removidas para a Cidade de Deus e Parques Proletários do Estado.

Hoje na região foram erguidos edifícios de alto padrão econômico, provas da especulação imobiliária e exclusão social que representou a remoção da Catacumba e outras favelas da Lagoa, excetuando a área de proteção ambiental (Parque da Catacumba).

Fonte: https://valacomum.wordpress.com/2008/10/13/catacumba-a-favela-que-virou-parque/



A favela do Pasmado ficava no morro do mesmo nome em Botafogo, foi removida pelo governador Lacerda, em 1965, e em seu lugar construído um belo parque público na administração Marcos Tamoio, com um mirante, e que em cada ano vai tendo sua vegetação original cobrindo a devastação produzida pela ocupação irregular. Na década de 1990 o parque ganhou o nome de Izaak Rabim, chefe-de-estado pacifista israelense.

Na coluna “Há 50 Anos”, do Jornal O Globo, há a transcrição de editorial de 10 de Novembro de 1958 que dava à favela o nome de “Favela da Prefeitura”, pois, segundo a antiga notícia, a prefeitura se omitiu desde o aparecimento do primeiro barraco surgido logo após a abertura do túnel, em 1952, e em pouco tempo o morro estava tomado de casebres.

Queixava-se o jornal da inércia do poder público, a mesma inércia de sempre, salvo raras exceções, de ver a ocupação irregular como fonte de votos, de “toma lá dá cá”. Onde o político esperto pratica a política da bica d’água e ganha os votos dos desassistidos, que continuarão assim, pois a ele interessa que a miséria permaneça, para pouco antes da eleição praticar mais um pequeno melhoramento na invasão e ser tratado como herói.


Fonte (texto modificado): http://www.rioquepassou.com.br/2008/11/10/favela-do-pasmado/

As reformas levaram ao chão cerca de 2700 imóveis de épocas (de estéticas arquitetônicas) históricas que se sucederam (colonial, imperial, belle époque e eclética), número que vem sendo intensificado até os dias atuais pela especulação imobiliária. A avenida Rio Branco, por exemplo, já está na quarta geração de edificações.

 Em uma nova fase de desenvolvimento ou progresso urbanístico, a cidade passou por uma ampla reestruturação e remodelação  - com novas polêmicas desapropriações de moradias - sob a justificativa de sedias a Copa do Mundo de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Os maiores marcos deste momento são a implosão do viaduto da Perimetral e a construção das vias Expressas e Binário do Porto, que visam a revitalização da Zona Portuária (nos morros próximos da qual parte da população pobre expulsa do Castelo fixou-se), além da ampliação das malhas metroviária e rodoviária.

O investimento em um local histórico como o porto gerou achados arqueológicos, como o Cais do Valongo, uma das vias de chegada de escravos neste que foi seu maior destino no mundo, resgatando esta história há muito silenciada. Que este tesouro seja restaurado, preservado e divulgado na cidade de mais de 450 anos, rompendo o ciclo de tamponamento da nossa história.


Fonte: Texto modificado do artigo "450 Anos e as Reformas Urbanas", de Fernanda Hallack, em Revista da Travessa, nov. de 2014 e jan. de 2015, pp. 25-26  

Os Cidadãos Excluídos

Entretanto, como em diversos movimentos transformadores da história do Brasil, esse deslumbramento da nova burguesia, da crença no progresso, no liberalismo, no utilitarismo e no desenvolvimento concreto em vários setores econômicos e sociais, foi limitado.

A "regeneração" ou modernização urbana não se fez sem grandes perdas para a camada mais pobre da população, que foi expulsa do centro da cidade, durante esse processo, passando a habitar nos morros e periferias. O povo e a cultura "popular" brasileira não se encaixavam na modernidade de moldes ingleses e franceses, e foram deixados de fora. Foi uma república "bela", porém excludente (e ainda é, em muitos casos), que manteve como quase inexistente o exercício efetivo da cidadania: o Estado servindo a todos e não apenas as elites. A exclusão não era apenas racial, mas sócio-econômica.



Cortiços das ruas dos Inválidos e do Senado, ambos no Centro do Rio


Crianças de um cortiço da rua da Alfândega em 1903.

Esses imóveis foram abaixo no início do século XX, pois eram considerados focos de doenças epidêmicas, como a febre amarela e varíola. Foram os principais alvos do prefeito Pereira Passos e do médico sanitarista Oswaldo Cruz.

(sem)Providência, a primeira favela do país


Inauguração da Estação de Estrada de Ferro D. Pedro II, na Corte do Rio (1858), pintura de J.G. da Costa. O Morro da Providência está ao fundo.


Foto da Central do Brasil, em 1899, de Marc Ferrez.

No século seguinte, os sopés e encostas dos morros do entorno perderiam as casas de pequenas propriedades rurais, para dar lugar aos primeiros barracos de favelas (áreas invadidas pela população mais pobre).

Atual local da Estação Ferroviária da Central do Brasil, no Rio de Janeiro (a Estação foi erguida no lugar da Igreja de Sant'anna, que deu nome ao Campo de Santana). Atrás está o Morro da Providência, antigo Morro da Favela: a primeira área de favelização do Brasil, próximo ao antigo Campo da Aclamação, local da Proclamação da República.

Após o término da Guerra de Canudos, em 1897, alguns ex-combatentes, cerca de 10 mil soldados, se fixaram nas encostas do morro que ficava próximo à sede do governo federal na época (na atual Praça da República). Aguardavam a promessa feita pelos governantes: receber residências na então capital federal. Como os entraves políticos e burocráticos impossibilitaram a construção dos alojamentos, os soldados empobrecidos, residindo em casebres por eles construídos, por lá acabaram ficando.


Vista do alto do Morro da Favela ou da Providência no início do século XX.

A origem do nome "favela" remete à guerra travada, no sertão baiano, entre o Exército Republicano e seguidores de Antônio Conselheiro. Favela é um morro nas proximidades de Canudos e serviu de base e acampamento para os soldados. Assim também foi batizado o morro carioca (favela ou faveleiro é também um arbusto típico do sertão nordestino). Com o aumento das desapropriações e derrubadas dos cortiços cariocas, e da vinda de emigrantes de outras regiões do país, todo local onde os mais pobres passaram a residir - vivendo sobretudo em barracos nos morros - passou a ser chamado pejorativamente de favela.

Um desprestígio injusto, pois quase 60 anos antes da ocupação do Morro da Favela, o maior nome da literatura brasileira, Machado de Assis, nasceu em lugar próximo, numa casa humilde do Morro do Livramento.

Vemos que a modernização da República pôs de lado o planejamento urbano mais amplo e a reorganização espacial da população em geral.

***


... O nome Providência só passou a ser usado a partir da década de [19]40 porque a capela da Divina Providência ficava no local.

“É importante ressaltar que até esse período o termo favela só era usado em referência ao Morro da Providência, inclusive na música. Em 1943, o cantor Herivelto Martins cantava: ‘Favela, Salgueiro, Mangueira, Estação Primeira, guardai os vossos pandeiros’. Ele citava os nomes das comunidades e não usava o termo se referindo a todas”, atenta José Baptista Ferreira de Mello. “Os soldados se instalaram nas encostas com restos de madeira, zinco, papelão e de latas de querosene. Esse cenário só era bonito na música porque, na verdade, era uma fornalha já que madeira e zinco armazenam calor”, avalia.

Para Milton Teixeira, mesmo com as dificuldades, antigamente os nomes tinham ligações com as histórias das comunidades. O que, para ele, não ocorre mais. “Os nomes das favelas mais atuais são tirados de modismos, como novelas. No Complexo da Maré, tem uma favela chamada Buraco da Lacraia. Não é nada eufônico e, sim, dissonante”, finaliza o historiador.


http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/rj/conheca+a+origem+dos+nomes+de+algumas+favelas+do+rio/n1237967511709.html


Primeiros barracos e moradores (descendentes de escravos), em 1906, no Morro da Providência. Foto de Marc Ferrez.

Dois fatores históricos importantes contribuíram para as primeiras ocupações na região: o grande número de soldados vitoriosos da Guerra de Canudos, que desembarcaram no Rio em 5 de novembro de 1897 sem moradia, e a grande concentração de negros que lotavam a cidade após a abolição da escravatura.

Com a lei do ventre livre em 1871, a cidade do Rio se encheu de ex-escravos em busca de trabalho. Nessa época começam a surgir uma grande quantidade de cortiços na região Central, que até então era considerada área nobre da cidade e se tornou uma importante região de concentração de trabalho com a construção da Central do Brasil, em 1858.

Mansões que não tinham mais como se sustentar sem os escravos foram transformadas em casas de cômodo. Na mesma época, na segunda metade do século 19, surgiu o maior e mais famoso cortiço da cidade, o “Cabeça de Porco”. “Era um cortiço monumental, com quatro mil residências. O local exato onde ele ficava é onde existe hoje o Túnel João Ricardo, ao lado da Central do Brasil”, ressalta o historiador Milton Teixeira.

O Cabeça de Porco foi destruído em 1893 por ordem do prefeito Cândido Barata Ribeiro, fazendo com que muitas famílias fossem para a travessa Felicidade. Justamente nessa região teve início a primeira comunidade, então denominada “Morro da Favela”.

A origem do termo surgiu após a Guerra de Canudos, onde ficava o Morro da Favela original, graças a uma planta conhecida como faveleira, farta no local. Alguns dos soldados, ao regressarem vitoriosos ao Rio em 1897, não receberem o prometido soldo e foram invadindo uma antiga chácara, com o apoio de um oficial, no Morro da Providência, que ganhou então o "apelido" referente a Canudos.

“Depois de uma confusão em que tentaram matar o prefeito, estabeleceu-se um caos, uma grande desordem. Em função disso, os soldados foram desmobilizados. Eles saem do Ministério do Exército desempregados e sem ter como viver. Atrás dali tinha o Morro da Providência e eles ocupam esse morro”, lembra Milton, ressaltando que nessa época a região já estava lotada de cortiços.

Mas foi com a total abolição da escravatura que a cidade ficou cheia e sem ter moradias para todos. “Todos os escravos do Vale do Paraíba – 200 mil – invadem a cidade do Rio de Janeiro. Aqui eles não tinham onde morar, começam a surgir os primeiros mendigos e o conceito de multidão”, explica o historiador.

O morro da Providência se tornou o local ideal para abrigar as famílias de baixa renda. Cercado de um lado por uma pedreira, fábricas e pelas linhas da Estrada de Ferro Central do Brasil, e tendo do outro um cemitério de protestantes e a região portuária, os terrenos estavam, então, bem desvalorizados e livres.

As primeiras casas da Providência começaram a ser construídas na parte baixa do morro, com o mesmo formato das casas existentes em Canudos. Atualmente, nenhuma dessas residências existe mais, pois essa parte do morro começou a ser explorada para a extração de pedras para as obras da região central da cidade.

“Aquela era a única favela autofágica do mundo, pois consumia o próprio morro onde estava. Os moradores trabalhavam na pedreira que destruía o morro onde eles moravam”, afirma o historiador, lembrando que a pedreira foi explorada durante décadas até que, em 1968, uma explosão inesperada soterrou 36 pessoas. Os corpos dessas vítimas nunca foram localizados", conta o historiador.

Em 1904, o governo tentou a primeira remoção da favela da Providência, frustrada por uma revolta popular batizada de “Revolta da Vacina”, onde muitos favelados participaram combatendo as tropas do governo. Depois disso, a situação se acalmou. O próprio governo percebeu que aquela população era fundamental como mão de obra barata para trabalhar na pedreira, nas obras públicas, no cais do porto e nas fábricas e usinas da região.

Início do domínio do tráfico

A violência nas comunidades começou muitos anos depois. Segundo Milton Teixeira, na época da ditadura militar, o governo e a polícia denominavam o pobre e desempregado como “classe perigosa”. “Todo ser humano que não pertence ao estado ou à classe que apoia o estado é potencialmente culpado”. Mas é apenas no final da década de 70 que o tráfico começa a dominar os morros da cidade. Até então, essas regiões eram controladas por contraventores que exploravam o jogo do bicho.

Segundo Teixeira, uma série de fatores “empurraram” o tráfico para o morro. “A corrupção policial, o despreparo da polícia, que era mais preocupada em reprimir assuntos políticos do que a criminalidade, a extrema violência que chegou no asfalto... Quem viveu naquela época sabe que a polícia matava tudo que era bandido”, lembra, ressaltando que a conjuntura mundial também favoreceu a passagem do tráfico pelo Rio de Janeiro.

O período foi o apogeu do narcotráfico na Colômbia e o governo americano começou a treinar a sua polícia marítima, a guarda costeira americana, para fechar o Caribe como porta de entrada de drogas. “Com a rota do Caribe fechada, a rota do México fechada, eles encontraram uma rota para distribuir a droga pelo Brasil, encontrando um governo fraco, desorganizado, um país corrompido, muita miséria e área onde o governo não entrava”, explica o historiador.


Fonte: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/rio-450-anos/noticia/2015/01/conheca-historia-da-1-favela-do-rio-criada-ha-quase-120-anos.html

Samba: o filho bastardo e mulato da República branca

Sob influencia da musicalidade africana, o ritmo caracteristicamente brasileiro teve origem nas favelas cariocas. Samba derivado do ritmo Angolano Semba traduzido como "umbigada", que é organizado em roda e os dançarinos dão "umbigadas" nos companheiros. Esta dança sofreu inúmeras alterações até o modelo que conhecemos hoje batuque, dança de roda, lundu, chula, maxixe, batucada e partido alto, entre outros, muitos deles convivendo simultaneamente foram os nomes e variações encontradas.

O samba surgiu originariamente na Bahia, muitos desses escravos migraram para o Rio de Janeiro e levaram a dança consigo entre o final do século XIX e início do século XX. Muitos desses negros se estabeleceram nos bairros da região do centro do Rio, e ali surgiu a casa das “tias” como a tia Ciata, onde tinham festas que se tocavam sambas.

A baiana Hilária Batista de Almeida, a “Tia Ciata”, era uma “quituteira” da Praça Onze, região carioca que concentrou os negros mais pobres que tiveram que sair do centro da cidade durante a grande reforma urbana do Rio de Janeiro, entre 1902 e 1910. Tia Ciata vendia doces de tabuleiro vestida com a indumentária típica de baiana e, para aumentar a renda, abria sua casa para políticos, figurões da sociedade, autoridades civis e militares, e jornalistas que se deleitavam com sua comida baiana e com a musica. Quatro fraquentadores dessas festas tiveram papel fundamental na criação do samba carioca, Ernesto dos Santos (Donga), João Machado Neves (João da Baiana), e Alfredo Vianna Filho (o Pixinguinha).

Mas, o samba era considerado um gênero musical “maldito”, sendo perseguido como “caso de polícia” justamente por estar identificado em sua maioria pela população negra e mulata, que sempre sofreram com o preconceito da chamada “boa sociedade” , não faltando ataques explícitos, que, segundo o historiador Adalberto Paranhos, utilizavam formas como “samba, coisa de negros e vadios” ou “música das camadas baixas”. Essas “camadas” da sociedade foram “empurradas” pelas políticas de modernização e saneamento da antiga Capital Federal – Rio de Janeiro – para os morros e bairros distantes do centro, ainda no final do século XIX e início do século XX, no Rio de Janeiro.

Assim vão surgindo os sambas nos morros e nas favelas da cidade. O primeiro samba gravado da história foi o “Pelo Telefone” composto por Donga, outras músicas foram gravadas antes , porém não tiveram a mesma repercussão.

Nos anos de 1930, um grupo de músicos liderados por Ismael Silva fundou, na vizinhança do bairro de Estácio de Sá, a primeira escola de samba, Deixa Falar. Eles transformaram o gênero, dando-lhe os contornos atuais, inclusive coma introdução de novos instrumentos, como o surdo e a cuíca, para que melhor se adequasse ao desfile de carnaval. Nesta mesma época, um importante personagem também foi muito importante para a popularização do samba: Noel Rosa. Noel é responsável pela união do samba do morro com o do asfalto. É considerado o primeiro cronista da música popular brasileira. Nesta época, a rádio difundiu a popularidade do samba por todo o país, e com o suporte do presidente Getúlio Vargas, o samba ganhou status de "música oficial" do Brasil.

No início da década de 1980, depois de um período de esquecimento onde as rádios eram dominadas pela música de discoteca e pelo rock brasileiro, o samba reapareceu no cenário brasileiro com um novo movimento chamado de pagode. Nascido nos subúrbios cariocas, o pagode era um samba renovado, que utilizava novos instrumentos, como o banjo e o tantã, e uma linguagem mais popular. Os nomes mais famosos foram Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Grupo Fundo de Quintal, Jorge Aragão e Jovelina Pérola Negra.

Texto: "A Origem dos Bambas": Karen Eline, Guia de Turismo e Pesquisadora da História e Cultura Afro Brasileira. Equipe Nostalgia Tour

***
Importante relato sobre a escravidão no Brasil, uma entrevista de 1973 transcrita e publicada no blog Spirito Santo, traz conversa com Maria Teresa, ex-escrava, de 117 anos na época, e iniciada no Jongo. O áudio da entrevista foi captado na quadra da Escola de Samba “GRES Arranco de Engenho de Dentro”, localizada entre Cascadura e Engenho de Dentro, no subúrbio carioca. Também faz um registro do Jongo como importante manifestação cultural afro-brasileira (música e dança), uma das raízes do samba e de suas escolas.


Ver em: https://spiritosanto.wordpress.com/2014/09/03/a-roca-de-teresa-revisitada/

TIA CIATA, a madrinha do samba

As chamadas "tias" baianas tiveram um papel preponderante no cenário de surgimento do samba no Rio de Janeiro, no final do século XIX e início do XX. Além de transmissoras da cultura popular trazida da Bahia e sacerdotisas de cultos e ritos de tradição africana, eram grandes quituteiras e festeiras, reunindo em torno de si a comunidade que inundava de música e dança suas celebrações – as festas chegavam a durar dias seguidos. Nessa época, viviam Tia Amélia (mãe de Donga), Tia Prisciliana (mãe de João de Baiana), Tia Veridiana (mãe de Chico da Baiana) e Tia Mônica (mãe de Pendengo e Carmen do Xibuca). Mas a mais famosa de todas foi Tia Ciata, em cuja casa nasceu o samba.


Ver mais na fonte: http://antigo.acordacultura.org.br/herois/heroi/tiaciata

Por que nos EUA não tem batucada?
Porque houve uma grande rebelião dos escravos lá e 
os tambores foram usados como instrumentos de guerra

Não é curioso que os Estados Unidos não usem tambores em sua música como todos os outros países que tiveram mão-de-obra escrava vinda da África? Eu sempre fiquei me perguntando isso. Por que a música dos negros norte-americanos é tão diferente da música brasileira, de Cuba, do Caribe? Onde foram parar os tambores? Cadê a batucada?

Pense em todos os grandes ídolos da música afro-americana: Charlie “Bird” Parker tocava sax. Louis Armstrong tocava trompete. Nina Simone tocava piano, assim como Stevie Wonder e Ray Charles. Miles Davis tocava trompete. E Wynton Marsalis, idem. Robert Johnson tocava guitarra. Chuck Berry, idem. Leadbelly tocava um violão de 12 cordas.

Os negros chegaram aos EUA vindos, em sua maioria, de regiões que hoje se conhecem como Senegal, Gâmbia, Nigéria, Camarões, Namíbia, Congo, Angola e Costa do Marfim. Os negros brasileiros vieram de Moçambique, do Benin, da Nigéria, e também de Angola, Congo e da Costa do Marfim. Com todas as diferenças existentes entre estas nações africanas, todas elas faziam uso de tambores com fins musicais e de comunicação. Por que então nós temos o samba e os gringos não? Por que não tem atabaque, agogô e cuíca na música afro-americana e sim saxofone, clarinete, trompete, instrumentos “de brancos” que os negros, aliás, aprenderam a tocar com maestria? Simplesmente porque os tambores foram proibidos na terra do tio Sam durante mais de 100 anos.

No dia 9 de setembro de 1739, um domingo, em uma localidade próxima a Charleston, na Carolina do Sul, um grupo de escravos iniciou uma marcha gritando por liberdade, liderados por um angolano chamado Jemmy (ou Cato). Ninguém sabe o que detonou a rebelião, conhecida como a “Insurreição de Stono” (por causa do rio Stono) e que é considerada a primeira revolta de escravos nos EUA. Conta-se que eles entraram numa loja de armas e munição, se armaram e mataram os dois brancos empregados do lugar. Também mataram um senhor de escravos e seus filhos e queimaram sua casa. Cerca de 25 brancos foram assassinados no total. Os rebeldes acabaram mortos em um tiroteio com os brancos ou foram recapturados e executados nos meses seguintes.

O Tio Sam está querendo conhecer a nossa batucada
Anda dizendo que o molho da baiana melhorou seu prato,
Vai entrar no cuzcuz, acarajé e abará
Na Casa Branca já dançou a batucada de ioiô, iaiá.

[Trecho do samba "Brasil Pandeiro", de Assis Valente.
A Primeira gravação foi feita pelos Anjos do Inferno em 1941]

A reação dos senhores foi severa. O governo da Carolina do Sul baixou o “Ato Negro” (Negro Act) em 1740, trazendo uma série de proibições: os escravos foram proibidos de plantar seus próprios alimentos, de aprender a ler e escrever, de se reunir em grupos, de usar boas roupas, de matar qualquer pessoa “mais branca” que eles e especialmente de incitar a rebelião. Como os brancos suspeitavam que os tambores eram utilizados como uma forma de comunicação pelos negros, foram sumariamente vetados. “Fica proibido bater tambores, soprar cornetas ou qualquer instrumento que cause barulho”, diz o texto.

A proibição se espalhou pelo país e só foi abolida após a guerra civil, mais de um século depois, em 1866. Antes disso, o único lugar onde os negros podiam se reunir com certa liberdade eram as igrejas; daí o surgimento dos spirituals, a música gospel, com letras inspiradas pela Bíblia, que eles cantavam muitas vezes à capela (sem instrumentos) ou marcando o ritmo com palmas. As mãos batendo no corpo e os pés batendo no chão foram os substitutos que os escravos encontraram para os tambores, resultando em formas de dança e música conhecidas como “pattin’ juba”, “hambone” e “tap dance” (sapateado), ainda hoje utilizados por artistas negros (e também brancos) dos EUA.

Os brancos sabiam que as rebeliões de escravos eram organizadas durante encontros que envolviam dança e que a cadência dos tambores podia ser um convite à insurreição, com o uso dos tambores falantes. “Proibidos os tambores, o corpo humano, o mais primitivo de todos os instrumentos, se tornou a principal forma de ritmo e de comunicação entre os escravos. “Usando o corpo como percussão, em uma tentativa de imitar os sofisticados ritmos e cadências dos tambores, com o elaborado uso de batidas dos saltos e do bico do sapato, surgiu o que chamamos de ‘tap dance’. Mesmo hoje em dia, quando dois sapateadores mantêm uma conversação com seus pés, é como se estivessem telegrafando mensagens, como faziam originalmente os tambores africanos”, afirma Knowles [coreógrafo norte-americano Mark Knowles, autor do livro Tap Roots: the Early History of Tap Dance].

[...]

Nos rincões do Mississippi, driblou-se a proibição dos tambores com bandas de flautas e tarol (caixa), instrumentos que eram aceitos e inclusive tocados no Exército durante a guerra civil [...].

[...]

Enquanto nos Estados protestantes os tambores eram banidos, na católica Louisiana eles foram permitidos até o século 19 e eram utilizados sobretudo nas cerimônias de vodu, religião afro-americana levada para os EUA pelos escravos do Benin, antigo Daomé – de onde vieram também a maioria dos negros da Bahia. Assim como em Salvador, havia muito sincretismo em New Orleans até começar a perseguição ao vodu e por conseguinte aos tambores.

A partir de 1850 o uso de tambores passou a ser restringido até mesmo na Congo Square, uma praça da cidade onde tradicionalmente os negros se reuniam para tocar tambores, dançar e entrar em transe espiritual ao som de música. Nos anos 1970 a praça foi reabilitada e até hoje rola um batuque de primeira por lá.

Apesar desta “percussofobia”, como alguns chamam, a música negra dos EUA é maravilhosa, sem sombra de dúvidas. Mas como seria ela se os tambores não tivessem sido proibidos? Mais parecida com a brasileira? Nunca saberemos.

Ver mais detalhes, como vídeos, em:
http://www.socialistamorena.com.br/por-que-nos-eua-nao-tem-batucada/


Gangues do Rio: a capoeira marginal

A capoeira surgiu em fins do século XVI, quando já era praticada por escravos negros de diversas origens africanas. Eles a desenvolveram das antigas artes marciais de tribos da África. Para evitar a repressão dos senhores contra a luta, os escravos camuflaram-na através de uma espécie de "dança de guerra", com a utilização de canções acompanhadas de instrumentos típicos. Fizeram algo parecido com a religião: o sincretismo das crenças africanas com a católica.

Mesmo assim, os "brancos" se sentiam ameaçados pela presença marcante dos capoeiristas (ou "capoeiras") nas ruas. Enquanto as gangues de lutadores usavam sua arte marcial para disputar território e se defender da polícia, os senhores assistiam a essa agitação temendo que os escravos resolvessem se rebelar para valer.

A maioria dos escravos urbanos tinha como rotina fazer compras em armazéns e quitandas, livrar-se do lixo e, principalmente, trazer água limpa para uso doméstico. As fontes da cidade estavam sempre rodeadas de gente. O maior reservatório público ficava no largo da Carioca. Seu chafariz, construído em 1723 (e demolido em 1925), assistiu a exibições dos capoeiras.

Foto de jogo de capoeira (talvez por volta de 1970).

Em poucos anos de Império, a arbitrariedade na aplicação das penas aos capoeiras parecia sem limite. O forro Manoel Crioulo, por exemplo, foi sentenciado a dois anos de trabalhos em obras públicas e mandado ao Arsenal da Marinha em 14 de maio de 1827, por ter dado "uma bofetada de mão aberta". Mas, mesmo sendo considerados marginais e desordeiros pelo Estado, os capoeiras acabaram sendo solicitados para, quem diria, manter a ordem. Em junho de 1828, as tropas estrangeiras do Exército Imperial, formadas principalmente por irlandeses e alemães, ameaçaram um levante militar por conta do atraso no pagamento de seus soldos. Armados, com o apoio das autoridades, escravos e capoeiras formaram milícias e conseguiram conter a agitação dos mercenários amotinados. Foi uma demonstração de poder e tanto.

Nem mesmo a abolição da escravidão e a proclamação da República serviram para acabar com a repressão contra os capoeiras. Em 11 de outubro de 1890, foi promulgado o código penal do novo regime. Em seu artigo 402, ficou estabelecida uma pena de dois a seis meses de prisão para quem praticasse a arte marcial nas ruas. Para os chefes das maltas, essa punição seria aplicada em dobro, enquanto os reincidentes poderiam ficar presos por até três anos. A capoeira, finalmente, havia se tornado oficialmente um crime, para o alívio da elite que vivera amedrontada por mais de um século.

Nos anos de 1930, um importante capoeirista brasileiro, mestre Bimba, apresentou a luta para o então presidente Getúlio Vargas. O presidente gostou tanto da "luta-dança" que a legalizou e transformou em esporte nacional brasileiro.

Fonte: Abadá-Capoeira Fronteira, por Antônio Neto.

UMA REFLEXÃO SOBRE A CONSTANTE AMEAÇA DO NEGRO POBRE
(trechos do texto de Eliane Brum)

“Mãe, onde dormem as pessoas marrons?”
A pergunta de criança denuncia a vida entre muros do condomínio chamado Brasil

Outra mãe, esta de um menino, ficou sem respostas diante de duas perguntas sequencias do filho pequeno: “Por que ela é marrom?”, o menino perguntou, referindo-se à empregada. E, logo em seguida: “Onde dormem as pessoas marrons?”, já que as “pessoas marrons” deixavam os muros ao final do dia, tanto na casa dela quanto na casa dos amiguinhos, mas ele não sabia para onde iam. Outro condomínio?

A História já nos mostrou o que acontece quando o Estado determina que um tipo de outro encarna a ameaça e deve, portanto, ser separado e confinado. E depois, qual é o próximo passo ou qual é a solução final? Pena de morte, extermínio? Cuidado. Em algum momento aqueles que se iludem que estão seguros por trás dos muros que ergueram podem se tornar o outro a ser eliminado. Uma sociedade fundada em muros cada vez mais altos sempre vai precisar de uma ameaça no lado de fora para culpar pelo seu mal-estar, para que as engrenagens continuem funcionando, garantindo a desigualdade e enriquecendo os mesmos de sempre.

Uma sociedade de muros sempre vai precisar forjar monstros para seguir justificando a desumanização e o sistema não oficial de castas. Aqueles que tentam se sentir seguros e criar seus filhos em segurança não estão inseguros porque há um outro ameaçador do lado de fora. Essa é só a aparência que mantém tudo como está. O que precisamos não é erguer muros cada vez mais altos, mas derrubá-los e nos misturarmos nas ruas da cidade.

O que acontece quando aquele que está fora decide entrar? Nesta altura, imagino que boa parte dos leitores possa pensar em assalto. Não. Lembro aqui os “rolezinhos”, ocorridos entre o final de 2013 e os primeiros meses de 2014. O momento em que jovens da periferia, a maioria deles negros, decidiram marcar pela internet passeios coletivos nos shoppings e foram humilhados, reprimidos e criminalizados. Qual foi a lei que quebraram? Jovens pretos e pobres não podem frequentar shoppings em grande número? É esta a lei não escrita? O fato é que seu passeio, chamado então de “rolezinho”, foi decodificado pela clientela habitual dos shoppings e pelas forças de segurança do Estado como “assalto”. Mas, de fato, o que se “assaltava” ali, na reivindicação de ocupar o lado de dentro do condomínio que é o shopping, para se divertir com os amigos?

... no Brasil atual, para ter legitimidade não é suficiente falar sobre, é preciso falar com. Para isso também é necessário que todos – todos mesmo – compreendam que “com” significa “com” – e não “só nós”. Do contrário a lógica dos muros permanece a mesma, ainda que se mude os personagens de lugar. Hoje, é urgente estar de fato com o outro e se arriscar ao que isso significa. Arriscar-se, portanto, à rebelião.


Ler a coluna aqui: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/22/opinion/1434983312_399365.html

A Reação: Uma Gota de Democracia na Chávena do Café com Leite


Em relação às eleições, vale lembrar que o voto não era secreto, como hoje. O eleitor votava sob o olhar do presidente da mesa eleitoral. Assim, o governo dominante em cada estado ganhava geralmente as eleições porque controlava todo o processo eletivo, desde o registro de eleitores e candidatos até a apuração dos votos, o reconhecimento e a diplomação dos candidatos eleitos por meio da Comissão de Verificação de Poderes, no Congresso Nacional, que era uma comissão especial controlada pelos governistas que estavam no poder que analisava se o eleito era a favor ou contra o governo, se fosse contra era impedido de tomar posse, isto se chamava de degola.

Para esse mecanismo de controle funcionar, era preciso do apoio dos chefes políticos regionais e locais, os coronéis, que garantiam o voto dos eleitores de sua área de influência aos candidatos governistas.



Entre 1920 e 1921 surgiu a dita Reação Republicana, chapa oposicionista contra o domínio de SP e MG, os quais revesavam-se na presidência da República. Com o objetivo de construir um eixo alternativo de poder, Estados importantes como RJ, PE, BA e RS se mobilizaram durante a campanha eleitoral daquele período. O candidato da Reação era Nilo Peçanha, que (por ter sido vice) chegou a ser presidente do país, apenas de 1909 a 1910, quando Afonso Pena faleceu sem completar o mandato.

A Reação propunha mudanças na organização política e econômica do país, defendendo maior equilíbrio federativo, solução da crise financeira, diversificação agrícola, expansão da educação pública, incentivo ao desenvolvimento econômico e regeneração dos costumes políticos.

Aconteceu uma fissura no pacto oligárquico da Primeira República, que tinha duas faces: o poder central apoiando os grupos dominantes nos Estados, e estes, em troca, apoiando a política do presidente da República; a Política do Café com Leite, segundo a qual as oligarquias paulista e mineira escolhiam o candidato oficial (quase sempre vencedor) e travavam o rumo das políticas nacionais.

Pela primeira vez na história da República, realizou-se uma campanha política de amplo alcance geográfico, com a formação de comitês eleitorais em diversas cidades do Brasil. Nilo Peçanha e seus aliados fretaram um navio (Íris) para viajar pelo país: a busca por uma república com real unidade nacional.


Nilo Procópio Peçanha (1867-1924)
Diferente da maior parte dos políticos oligárquicos, Peçanha nasceu em um sítio pobre no Norte Fluminense e foi filho de um padeiro. Com muito esforço, formou-se em Direito, em Recife (PE), e entrou para a política. Talvez tenha sido o primeiro presidente a representar etnicamente grande parte do povo brasileiro, pois era considerado mulato.

A Reação, porém, estava em desvantagem em relação à chapa oficial que detinha o domínio nacional do jogo político. O voto não era secreto e as fraudes eram uma prática comum. Entretanto, os "reacionários" acreditavam ser possível reverter a diferença, assim como inibir as fraudes, mediante o convencimento da sociedade a favor da causa.

Embora fosse um movimento das elites políticas, a Reação Republicana atraiu a simpatia e conquistou a adesão de vários segmentos sociais insatisfeitos com o governo, como a maçonaria (enfraquecida em relação ao poder que detinha no passado), as feministas, setores médios urbanos e a imprensa que promovia a campanha. Além deles, o apoio dos militares, sobretudo dos de menores patentes, foi fundamental para a força e amplitude geográfica da campanha.

Sob forte tensão, pois o pleito foi marcado por denúncias de fraude generalizada, o candidato oficial, Arthur Bernardes, foi eleito presidente em 1922. Antes da posse do adversário, a Reação não reconheceu o resultado e reivindicou a criação de um Tribunal de Honra, que arbitrasse o processo eleitoral. Tentaram mobilizar a opinião pública e buscaram encontrar uma solução política para reverter a situação. Tudo em vão. Após Afonso Pena, Venceslau Brás e Delfim Moreira, Bernardes foi outro mineiro no Palácio do Catete.

Durante a República oligárquica, tomaram posse presidentes que não foram paulistas ou mineiros: O marechal Hermes da Fonseca era gaúcho, Rodrigues Alves paraibano e Washington Luís fluminense. Porém, todos, com maior ou menor relevância, representaram os interesses das elites de SP, MG ou RJ.


Revolução e Fim da República Velha

O resultado da eleição produziu uma reação bem mais enérgica: em 05 de julho de 1922, jovens militares - grupo que apoiou a Reação, mas que tinha ideologia e demandas próprias - se rebelaram no Forte de Copacabana, no Rio, e foram reprimidos com violência. O fato foi o marco inicial do tenentismo, movimento que iria derrubar, oito anos depois, a já desgastada República Velha.



O Levante dos 18 do Forte, formado por 17 militares e 1 civil, inspirou o movimento tenentista pela enorme coragem de seus integrantes. Os 18 remanescentes, dos mais de 300 revoltosos que tomaram o forte, saíram da fortificação para combaterem milhares de soldados do governo (apenas dois sobreviveram ao tiroteio). Aqueles eram tempos de idealismo ferrenho.

Os governos das oligarquias do Café com Leite estavam com seus dias contados. A partir de 1914, com o romper da Primeira Guerra Mundial, a crise do café (falta de compradores no exterior) enfraqueceu as elites ligadas ao produto; crise agravada com a Quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929.

Abriu-se espaço de decisão política para outros setores, como a burguesia industrial, o proletariado, a classe média urbana e, é claro, diversos jovens oficiais do Exército. Entre estes últimos estava Luís Carlos Prestes, que após a queda dos 18 do Forte organizou uma expedição pelo interior do Brasil, a fim de angariar apoio, divulgar e estimular uma revolução nacional contra à República Velha. Era a Coluna Prestes (1925-27), que foi caçada pelas elites dominantes até alcançarem o exílio na Bolívia. O militar e gaúcho Prestes abriu caminho para outro conterrâneo, que encabeçaria a revolução que por fim derrubou os republicanos do Café com Leite: Getúlio Vargas.

O tenentismo, dos anos de 1920, foi a fagulha que gerou a Revolução de 1930, quando outro golpe de Estado, protagonizado novamente por militares, representou a busca aparente por uma república mais popular (início do populismo político). Morreu, assim, a República Velha.

No entanto, como era de se esperar, novamente saíram de cena certas elites para entrarem outras. Portanto, como veremos na conclusão deste estudo, historicamente a detenção do poder no Brasil sempre esteve nas mãos de poucos, ou seja, das oligarquias.

Durante o início dos movimentos que geraram a Revolução de 1930, os defensores da República Velha escarnearam os militares revoltosos gaúchos, liderados em parte por Getúlio Vargas, que disseram que marchariam até a Capital Federal (Rio de Janeiro-RJ), para amarrarem seus cavalos no obelisco da Avenida Central. E assim fizeram.

A CORRUPÇÃO ANTES E DURANTE A REPÚBLICA

As raízes da corrupção no Brasil são bem antigas, vieram com os colonizadores e, evidentemente, continuou com a República. Assim analisou o Jornal do Brasil On Line:

... com a proclamação da República em 1889, veio a Política dos Governadores, a influência dos coronéis e o voto de cabresto. Acabava o  "voto censitário", que definia renda mínima para qualificar o eleitor, mas vinham outras formas de controlar quem poderia chegar ao poder. Entre 1894 e 1930, o país teve o governo de presidentes civis ligados ao setor agrário, que controlavam as eleições mantendo-se no poder de maneira alternada.

O professor e autor de livros didáticos de história Roberto Catelli Jr., no artigo A República do Voto, relata que, como o voto não era obrigatório nem secreto, o coronel oferecia dinheiro, roupas e chapéus para que os eleitores comparecessem às urnas, e os capangas verificavam o preenchimento da cédula. Ao apurar os votos, eleitores eram inventados e atas com resultados eram adulteradas. Ainda havia a Comissão de Verificação de Poderes, para criar argumentos para não empossar candidatos da oposição (degola) e diplomar representantes da oligarquia. Muitos outros casos foram surgindo ao longo do século seguinte, como o caso de corrupção eleitoral que levou Getúlio Vargas ao seu primeiro ciclo de poder e os casos de corrupção e desvio de verbas na construção de Brasília no governo JK. Da ditadura, também não faltam histórias.


Fonte: http://www.jb.com.br/pais/noticias/2014/12/14/corrupcao-no-brasil-das-colonias-a-todas-as-esferas-da-politica-e-do-mercado/

O árduo caminho à uma república 

verdadeiramente

democrática continua...

A Era Vargas (1930-45) foi uma refundação da República visando a centralização do Estado e a integração real deste com o povo. Para isso, Getúlio, na chefia do governo provisório, em vez de organizar uma nova constituição, manteve-se na presidência ao não aceitar a eleição de Júlio Prestes (nome ligado às antigas oligarquias). Os paulistas, inconformados com a diminuição do poder, combateram armados o novo governo federal na Revolução Constitucionalista de 1932. Esta nova guerra civil ceifou a vida de mais de 3 mil brasileiros, somando os dois lados.

Após a derrota do povo de SP e aliados, surgiu a Constituição de 1934. A partir dessa Carta, as mulheres e clérigos de todo país puderam, finalmente, votar e se candidatar a cargos políticos; os soldados na ativa, porém, ainda não podiam (até hoje os jovens praças, suscetíveis às ordens de militares superiores, que poderiam dirigir o voto deles, são impedidos de ir ao pleito). O voto tornou-se obrigatório, e nasceu a Justiça Eleitoral.

Essa democracia não durou muito tempo, pois o popular Vargas, "inspirado" nos regimes totalitários da Alemanha e Itália, em voga na época, conseguiu apoio para instaurar o Estado Novo (1937-45). Embora ditatorial, esse governo garantiu benefícios populares NUNCA antes vistos por aqui, como as leis do trabalho, a aposentadoria, assistência social, garantia ao sindicalismo (embora bem controlado pelo Estado) e demais direitos públicos. O grande desafio das gerações atuais e futuras é proteger, perdurar e melhorar tais direitos.



De 1945 a 1964, o país viveu um curto período democrático (pelo menos na teoria). As eleições agora eram de responsabilidade do poder público, sendo fiscalizadas por tribunais eleitorais. O voto secreto, surgido na Constituição de 1946, garantiu a lisura dos pleitos; fortaleceram-se os vínculos entre partidos e eleitorado: sistema partidário-eleitoral de caráter nacional que expressava as diversas correntes de opinião da sociedade brasileira (pluripartidarismo).

Graças a ilustres nomes como Jorge Amado e Gilberto Freire, a Constituição de 1946 foi a primeira Carta Magna brasileira a garantir a liberdade de religião :

Todos sabemos que temos a liberdade de escolher a religião que desejamos seguir, pois no Brasil há liberdade de religião. Mas, poucos sabem a quem devemos o direito de ser espíritas, ou umbandistas, ou protestantes, ou esotéricos. Sim, a emenda da liberdade religiosa custou muito trabalho e muita astúcia ao grande escritor e amante da cultura popular Jorge Amado. Ele a preparou, porque viu a violência desmedida com que eram atacados os valores culturais provenientes da África. Tentavam de todos os modos exterminar tradições, costumes, deidades, línguas tribais, enfim, crenças do nosso povo. Jorge Amado conviveu com ialorixás, baianas, babalaôs, ekedes, escritores de magia, gente do axé. Os viu espancados e presos. Em 1946 no Ceará viu protestantes saqueados por fanáticos com uma cruz à frente. Então escreveu a emenda da liberdade religiosa e saiu em busca de quem a assinaria junto com ele. O primeiro foi Gilberto Freire (autor de Casa Grande e Senzala), o sábio das coisas brasileiras, e depois, mais de oitenta parlamentares, de Otávio Mangabeira a Nestor Duarte, a assinaram. Com a aprovação da emenda, a liberdade religiosa tornou-se lei. Foi na Constituição Democrática de 1946. Acabara-se a perseguição aos protestantes, a violência contra o Candomblé e a Umbanda. Graças ao nosso maior escritor (permitam chamá-lo assim, pois o amo) Jorge Amado, hoje temos o direito de ter nossas Casas de Santo abertas e aceitas.

[Texto de Maria Helena Farelli: http://terreirodeumbanda.wordpress.com/artigos/como-surgiu-a-liberdade-religiosa-no-brasil/ ]

Mas houve limitações ao jogo democrático, pois os analfabetos ainda não podiam votar, e o Partido Comunista do Brasil (PCB) teve o registro cassado, atendendo aos interesses do bloco capitalista mundial, no qual o Brasil estava inserido, dentro do contexto da Guerra Fria.

Em relação aos direitos civis, ocorreram avanços, como a liberdade de imprensa, de religião, de organização e de livre expressão da opinião. Contudo, para os trabalhadores os direitos civis eram precários em muitos aspectos; negros e mulheres sofriam discriminações, enquanto o acesso à Justiça continuou a ser privilégio das elites.

A democracia, porém, sentiu outro duro golpe, em 1964, encabeçado novamente por militares (“herdeiros legítimos” do sanguinário Floriano) em aliança com setores civis conservadores, ambos dirigidos, sobretudo, pelo capital estadunidense. O autoritarismo, com a desculpa de eliminar a "ameaça" comunista, pôs por terra os avanços democráticos anteriores e as intenções de democratização do poder e melhor distribuição da riqueza do país. As constituições desse período, de 1967 e 1969, visaram apenas legitimar a ditadura (vide os atos institucionais).

Democracia vem da junção de duas palavras gregas, dêmos (povo) e krátos (poder), é uma forma de governo no qual o poder pertence a todos os cidadãos. No Brasil, como na maioria das repúblicas, a democracia é representativa, votamos em representantes que ocupam cargos políticos por tempo determinado: vereadores, deputados, senadores para o legislativo e prefeitos, governadores e o presidente para o executivo. De acordo com a Constituição Brasileira, Art. 1º, parágrafo único: "todo poder emana do povo [...]".

Do latim vem o termo dictadura, do verbo dicere e particípio passado dictum, aquele que diz. Na Roma Antiga, um magistrado investido pelo senado podia ditar leis e fazer com que fossem cumpridas, por um breve período, em tempos de crise. Júlio César foi nomeado ditador, mas este não devolveu o poder aos senadores. O nome César deu origem à palavra czar (tsar), a partir da proclamação de Ivan, "o terrível", na Rússia e, ao título kaiser (cáiser), na Alemanha. Essas expressões eram utilizadas pelos soberanos.

Em uma ditadura, nos dias de hoje, um indivíduo ou grupo restrito dá pleno poderes a um representante, à revelia das leis e do povo.

[...]

No Brasil, em 1964, foram restringidos os direitos dos cidadãos. Nesse estado de exceção, qualquer manifestação política era uma ameaça ao governo [...].

A II Guerra Mundial terminou em 1945, dando início à guerra fria, que levava esse nome porque os principais adversários, EUA e URSS, não se atacavam diretamente. As duas grandes potências procuravam influenciar a forma de governo de outros países, dividindo o mundo entre os capitalistas, aliados dos Estados Unidos, e os socialistas, aliados da União Soviética.

Os EUA temiam que a América do Sul fosse governada por regimes de esquerda (socialistas, comunistas, anarquistas), pela proximidade de seu território e interesses econômicos. Portanto, apoiou golpes militares e ditaduras. Isto porque, em 1959, guerrilheiros cubanos tiraram do poder o ditador Fulgêncio Batista, aliado dos EUA, substituindo por outro ditador, Fidel Castro, aliado da URSS.

Em 1964, os militares brasileiros apoiados pelos EUA deram um golpe, que depôs o presidente eleito João Goulart. Assim, começava a ditadura no Brasil. A crise política e social, as greves e o medo dos comunistas por parte de alguns setores da sociedade, como a classe média, foram algumas das causas dos golpe.

Em 1968, o general-presidente Costa e Silva decretou o AI-5, Ato Institucional nº 5, fechando o Congresso, dando a si plenos poderes como o de confiscar bens e suspender o habeas corpus. Habeas corpus é uma garantia constitucional que permite ao acusado esperar o julgamento em liberdade ou recorrer em caso de injustiça cometida no momento de sua prisão. Com o fim dessa garantia, violências praticadas pelo Estado não estão sujeitas a investigação ou julgamento. Dentre elas, a tortura.

Jornais eram monitorados pela censura e suas publicações de denúncias e opiniões divergentes eram proibidas. A imprensa alternativa, apelidada de "nanica", por ser de baixo custo e formato menor, tentava driblar o controle do Governo. Muitos daqueles que se opuseram ao regime foram condenados ao exílio ou detidos como presos políticos.

A pressão popular exigia a redemocratização e um dos caminhos adotados foi a anistia, ato que declara impuníveis ações praticadas por motivos políticos, anula as condenações e suspende as perseguições. Esse caminho permite que o povo recobre a soberania e volte a participar das decisões políticas como cidadãos.


[Parte do texto do fôlder de mediação sobre a exposição artística Resistir é Preciso..., no Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, de 12 de fevereiro a 28 de abril de 2014, com modificações]. Esse site resume qual era a situação do país durante o Regime Militar: http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2014/03/22/10-motivos-para-nao-ter-saudades-da-ditadura.htm



A PÁTRIA DE CHUTEIRAS 
(e de venda nos olhos, tampão nos ouvidos e mordaça)
Futebol e propaganda política
Além da tortura e da repressão, o governo [do general, presidente e ditador temporário] Médici usou a propaganda como arma política. O presidente Médici era apresentado como um "homem do povo" e "apaixonado por futebol". A vitória da seleção brasileira sobre a seleção italiana por 4 a 1, na final, foi bastante explorada pela propaganda do governo Médici em slogans do tipo "Ninguém segura este país" ou "Brasil; ame-o ou deixe-o"

Fundamental é conhecer nossa história e o valor do verdadeiro nacionalismo. Pois durante o último período ditatorial tais conceitos foram ensinados de maneira errada aos mais jovens. A imposição ameaçadora sobre o que seria o patriotismo, segundo a visão dos repressores da democracia, causou aversão a diversos adultos de hoje sobre a exaltação da brasilidade.

... uma aversão quase instintiva a cantar o hino nacional, aos desfiles e festas da Independência e outros símbolos patrióticos, festejados com naturalidade em tantos países da América Latina. Um caso exemplar foi uma comemoração de “Dia da Árvore” (21 de setembro) com direito a hinos, jograis, desfile pseudomilitar, discurso cívico e desfraldar da bandeira, tudo para acompanhar o plantio de uma muda em frente à escola. No dia seguinte, a pobre arvorezinha e a cerquinha que a protegia apareceram completamente despedaçadas, como se tivessem alguma culpa daquilo tudo.

[ Antonio Luiz M. C. Costa é editor da seção Nosso Mundo de CartaCapital. Seu relato é o segundo de uma série de 50 depoimentos coletados para o especial Ecos da Ditadura, que lembra os 50 anos do golpe militar. Fonte: Fonte: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/a-ditadura-vista-da-escola-uma-memoria-945.html ].

O jornalista Luis Nassif fez uma interessante análise sobre a situação atual do Brasil na ocasião do cinquentenário do Golpe Militar de 1964: http://jornalggn.com.br/noticia/as-semelhancas-entre-1964-e-2014

O Brasil, finalmente, fundamentou sua revolução industrial ("milagres econômicos"), na década de 1970, entretanto, a custo de elevados endividamentos externos e internos, que ruíram as bases dos governos ditatoriais expondo, desta forma, a incompetência e o descaso econômico e administrativo.

Houve também prejuízos intelectuais na ciência e tecnologia. No pós-guerra, com a primeira reunião da ONU, é que se começou a ver: de um lado os EUA, do outro a Índia, de um lado a Inglaterra, do outro a Libéria. Quem domina a tecnologia, domina o mundo, domina a economia. Vinícius Fonseca, Presidente da Fiocruz em 1975, responsável pelo início de sua reconstrução.

Antigamente, observávamos a ditadura apenas como um golpe militar, mas hoje todos admitem que foi um movimento civil-militar. O apoio de segmentos da sociedade já foi reconhecido: empresários, por exemplo, apoiaram a ditaduraNara Azevedo, pesquisadora da Fiocruz.


Sobre a perseguição contra cientistas e pesquisadores das áreas da saúde pública (fato que causou danos na população e atrasou o desenvolvimento tecno-científico do Brasil), especificamente da Fiocruz, vide o artigo: http://jornalggn.com.br/noticia/ditadura-militar-deixou-marcas-no-campo-da-ciencia .

O último regime militar do Brasil perdurou até 1985. O processo de redemocratização observou intensa mobilização e participação de amplos setores da sociedade brasileira, e não apenas das elites políticas, como tradicionalmente esperava-se. Em 1988, foi outorgada a atual Constituição, a mais democrática já produzida, dita "Constituição Cidadã".


O caminho percorrido pela nossa República até agora foi bastante tortuoso. Em pouco mais de um século de existência enfrentou 12 estados de sítio, 17 atos institucionais, 6 dissoluções do Congresso, 19 revoluções ou intervenções militares, 2 renúncias presidenciais, 3 presidentes impedidos de tomar posse, 4 presidentes depostos, 7 Constituições diferentes, 4 ditaduras e 9 governos autoritários.


Do ano 1500 a 2016.

NA HISTÓRIA DO BRASIL, OS GOLPES SÃO MAIS COMUNS DO QUE IMAGINAMOS

Golpe, a praga que envenenou a República, voltou ao cotidiano. Há genes golpistas nas almas mais puras. Milton Campos (1900-1972), um liberal exemplar, serviu como ministro da Justiça à ditadura envergonhada do marechal Castelo Branco. O golpismo afeta cabeças à direita ou à esquerda. Como ninguém gosta de ser chamado de golpista, derrubado o governo que se detesta, inventa-se outra palavra e saúda-se a nova ordem.

Sempre é bom lembrar que o governo mais estável da História nacional, o de D. Pedro II, durou 49 anos e nasceu com o golpe parlamentar que proclamou sua maioridade aos 14 anos.

Aqui vai um teste com dez episódios para que cada um possa examinar seu DNA. Indo em direção ao passado, marque a situação em que ocorreu um golpe. Ele pode ter sido parlamentar, vindo do Congresso, militar, trazido pelos tanques, ou misto.

1969: O presidente da República, marechal Costa e Silva, teve uma isquemia cerebral e estava incapacitado. Os três ministros militares chamaram o vice Pedro Aleixo, disseram que não assumiria e formaram uma Junta Militar. Seriam chamados de “os três patetas”. Foi golpe?

1968: O marechal Costa e Silva baixou o Ato Institucional nº 5, fechou o Congresso e suspendeu liberdades públicas. Golpe?

1964: Depois de uma revolta militar, o presidente do Congresso declarou vaga a presidência da República e extinguiu o mandato de João Goulart. Os vitoriosos chamaram o movimento de “Revolução”. Durante a ditadura, falar em golpe podia trazer problemas. Hoje, falar em “Revolução” é politicamente incorreto.

1961: Depois da renúncia de Jânio Quadros, os ministros militares recusaram-se a empossar o vice-presidente João Goulart. Com o país à beira de uma guerra civil, em poucos dias o Congresso votou uma emenda parlamentarista, mutilando os poderes de Jango, e ele assumiu. Até agora, o teste havia sido fácil. Foi golpe?

1955: O presidente Café Filho teve um enfarte, e assumiu o deputado Carlos Luz. Ele demitiu o ministro da Guerra, Henrique Lott, e em poucas horas foi deposto pela tropa. O Congresso votou o impedimento de Luz e empossou o presidente do Senado, Nereu Ramos. Café tentou reassumir, a tropa voltou a se mover, e o Congresso votou seu impeachment. Foi golpe?

1945: A tropa depôs o ditador Getulio Vargas, que convocara eleições para eleger seu sucessor. Elas deveriam ser realizadas no dia 2 de dezembro, mas Getulio foi deposto em outubro, e tomou posse o presidente do Supremo Tribunal Federal. O general Eurico Dutra foi eleito, e em 1946 instalou-se uma Assembleia Constituinte. Foi golpe?

1937: Com o apoio da tropa, Getulio Vargas fechou o Congresso, suspendeu a eleição presidencial que marcara e criou o Estado Novo. Fácil.

1930: Candidato derrotado na eleição presidencial, Getulio Vargas liderou uma revolta, e a guarnição do Rio de Janeiro depôs o presidente Washington Luís. Foi golpe ou foi a “Revolução de 1930”?

1891: O marechal Deodoro da Fonseca renunciou ao cargo, e assumiu o vice, Floriano Peixoto. A Constituição mandava que fossem realizadas novas eleições. Floriano botou pra quebrar e governou até 1894. Chamaram-no “Marechal de Ferro”. Deu golpe?

1889: No 49º ano de seu reinado, D. Pedro II foi deposto pela guarnição do Rio de Janeiro e banido do país com toda sua família. Proclamou-se a República. Golpe?

Quem marcou que houve golpe em todos os dez casos tem algo de Joaquim Nabuco ou Sobral Pinto no seu DNA. Fernando Henrique Cardoso marcou nove casos, excluindo o episódio da emenda parlamentarista de 1961. Quem não viu golpe em 1889, 1930 e 1945 tem uma inclinação para apoiar “golpes para o bem”. Quem aceitou as intervenções de 1937, 1964, 1968 e 1969 é um golpista de plantão.


Em todos os dez episódios listados, houve um ingrediente que felizmente saiu do baralho em 1985 com a eleição de Tancredo Neves: a anarquia militar. Salvo no golpe de 1969, nunca houve intervenção militar sem que houvesse civis pedindo-a. Em quase todos os casos, haviam perdido eleições ou temiam perdê-las.

Fonte: http://noblat.oglobo.globo.com/geral/noticia/2015/07/um-teste-para-seu-dna-golpista.html

No Brasil, além da "cultura" das leis que "pegam ou não pegam" (são obedecidas ou não), há o costume da mudança das regras do jogo político durante a partida para favorecer ou prejudicar um lado. É o JEITINHO BRASILEIRO observado em tudo. A democracia sempre sai perdendo.

"... foi um pequeno golpe a emenda da reeleição em pleno mandato presidencial de [iniciada por Fernando Henrique Cardoso]. Sarney se tornar presidente antes da posse de Tancredo [mesmo ele gravemente enfermo] foi de certa forma um golpe. E até a Independência do Brasil foi um golpe de Estado contra o parlamento português (que também deu um golpe contra o monarca D. João VI), dado por D. Pedro I, assim como o fechamento do congresso pelo mesmo D. Pedro. Também foi golpe a maioridade de D. Pedro II. Como podem ver, o espírito golpista está no DNA da nação e pequenos golpes do dia a dia como a aprovação da emenda da maioridade pelo presidente da Câmera dos Deputados, Eduardo Cunha."

Gustavo Adolfo de Medeiros, via Facebook, em 13/07/2015.



UM PAÍS FORJADO A GOLPES (com ou sem armas)


As definições correntes dizem-nos que os golpes de Estado se caracterizam pela surpresa, pela violência militar ou civil e pela ilegalidade.

Ilegalidade, evidentemente, em face da ordem legal que fraturam, pois, na sequência, o golpe de Estado vitorioso (e só esse conta) impõe sua própria legalidade.

Malogrado, o golpe de Estado é condenado como crime político; vitorioso, transforma-se em fonte de poder e de direito, autoritário ou não.

Nossa história é farta em exemplos de golpes de Estado, desde o Primeiro Reinado, mas nem todos podem ser classificados como ilegais, exatamente por terem sido operados dentro da ‘ordem’ e, portanto, sem violência e sem determinarem rupturas constitucionais.

Assim, por exemplo, a insubordinação das tropas que 1831 levou o primeiro Pedro à abdicação do trono, e, mais tarde o ‘Golpe da maioridade’ (assim foi registrado pela História) que levaria seu filho ao trono em 1840, aos 15 anos incompletos.

O fato histórico Proclamação da República, porém, apresenta as características clássicas dos golpes de Estado, a saber, a ilegalidade (o levante das forças armadas contra seu chefe supremo e o regime que juraram defender) e a ruptura da ordem constitucional, com a queda do Império.

A rigor, a implantação da República tem no golpe de 1889 apenas o seu parto, pois o novo regime só se consolidaria, ainda criança, com o golpe, de explícita ilegalidade, do marechal Floriano Peixoto (1891), investindo-se na presidência após a renúncia de Deodoro, contra o ditado da Constituição republicana recém aprovada.   

Nesta República de muitos golpes e contragolpes dois golpes clássicos merecem destaque, a saber, um, que rasgando a Constituição de 1934 instituiu a ditadura do ‘Estado Novo’ (1937), e aquele outro que em 1º de abril de 1964 instaurou a ditadura militar, decaída em 1984.

A característica comum de todos eles, é a ruptura da ordem constitucional, nos dois últimos casos mediante a violência, compreendendo alteração institucional e instauração de regimes de exceção caracterizados pela repressão policial-militar, a revogação dos direitos individuais e das garantias constitucionais, a supressão das liberdades – especificamente das liberdades de imprensa, de reunião e de associação – e  a revogação dos mecanismos da democracia representativa (‘Estado Novo’) ou sua vigência custodiada pelo novo regime (1964-1984).

Mas a história republicana está a sugerir uma categoria de golpe de Estado que, alterando a composição do Poder, a função e o objeto de todo e qualquer golpe ou insurreição ou revolução, se opera dentro da ordem institucional-legal vigente.

Lembro, a propósito, dois episódios recentes de nossa história, o 11 de novembro de 1955 e a instituição, em 1961, do parlamentarismo. Ambos formalmente legais e ambos curatelados pelos militares e ambos operados pelo Congresso Nacional

O primeiro decorreu de reação de setores militares legalistas, comandados pelo ministro da Guerra, o general Henrique Lott, à manobra comandada pelo presidente da República e seus ministros da Aeronáutica, da Marinha e da Casa Militar, visando a impedir a posse de Juscelino Kubitschek e João Goulart, eleitos presidente e vice-presidente da República. 

Diante da reação do Exército, o Congresso decretou numa assentada o impedimento do presidente em exercício (Carlos Luz, presidente da Câmara dos Deputados) e, seguindo a ordem da sucessão constitucional, empossou Nereu Ramos, vice-presidente do Senado, no cargo.

O fato foi apresentado como ‘contragolpe legalista’ e, assim, festejado. Em outras palavras, o Congresso, atendendo à voz majoritária das Forças Armadas, e no rigor de sua competência constitucional, dava um golpe de Estado (o impedimento dos presidentes), para impedir, eis sua justificativa em busca de legitimação, o golpe de Estado que visava a fraturar a Constituição, impedindo a posse dos eleitos.

De forma similar, tivemos o golpe parlamentarista de 1961, já referido, quando o Congresso Nacional, diante da sublevação militar que intentava impedir a posse do vice João Goulart (episódio decorrente da renúncia de Jânio Quadros), revogou o presidencialismo e aprovou a implantação pro tempore do parlamentarismo.

Nas duas situações agiu o Congresso Nacional nos termos de sua competência constitucional.

E, lamentavelmente, parece que  fizemos escola.

Similarmente o Congresso paraguaio, em 2012, revogou, mediante impeachment, o mandato do presidente Fernando Lugo e o Judiciário hondurenho decretou, em 2009, a deposição e prisão do presidente José Manuel Zelaya.

Se o golpe de Estado, em regra, é promovido contra um governante, em 1937, no Brasil, foi a arma de que lançou mão o próprio governante, para fazer-se ditador, donde não ter havido mudança de mando nem de controle do poder.

O golpe clássico – com a deposição do governante - é substituído pela mudança de governo, mantido o governante.

O golpe, faz-se por dentro, manipulado pela burocracia estatal associada a segmentos da classe dominante. É quando o golpe também pode operar-se de forma lenta e continuada, sem ruptura institucional mas determinando alterações na ordem constitucional.

Neste caso, o que caracterizaria o golpe de Estado (ou essa espécie de golpe por dentro do sistema) seria a alteração de poder sem violência e dentro da ordem legal, ou seja, utilizando-se da própria ordem legal para fazer as alterações requeridas pelo novo projeto de poder. 

Permanece a definição de golpe de Estado porque sua efetividade determina uma nova coalizão de poder, ao arrepio da soberania popular.

É um golpe de Estado que não pode ser acoimado de ilegal.

Essas reflexões tentam compreender a crise constituinte brasileira de hoje ao identificar  a operação de um ‘golpe’ dentro do Estado, comandado internamente por uma burocracia estatal, autônoma em face da soberania popular e dos instrumentos da democracia representativa. 

Essa burocracia governativa opera em condomínio com forças poderosas do capital concentrado, cujo objetivo é, na contramão do pronunciamento eleitoral de 2014, restaurar o controle neoliberal sobre a economia e o Estado.

O cerco do Estado em função dessa política sem voto mas representativa do poder econômico revela seus primeiros movimentos ainda em 2014, quando, perdidas as eleições, decide o grande capital a tomada do governo, impondo-lhe a política rejeitada eleitoralmente.

Nesse sentido, operou e opera de forma desabusada a imprensa monopolizada, ecoando o que lhe dita a direita.

Seu primeiro fruto foi o ajuste fiscal, mas a ele não se limitou, impondo todo o receituário neoliberal: privatizações, precarização das relações de trabalho, independência do Banco Central, política de juros altos, as medidas recessivas que constroem o desemprego e, com audácia jamais vista, a fragilização da Petrobrás, para que se torne irrelevante e possibilite que o Pré-Sal, maior reserva de hidrocarbonetos descoberta no planeta nos últimos 30 anos, seja capturado pelas grandes petroleiras privadas mundiais.

Para tanto chegou-se ao requinte: a empresa, atacada por escândalos e pela crise internacional do petróleo, é desmoralizada, a queda de suas ações em bolsa é atingida pela especulação e pela campanha de descrédito da grande imprensa, e nesse quadro anuncia-se a redução dos investimentos e para a venda de ativos na bacia das almas.

A agenda do governo é ditada pelos adversários do governo, e dentro dele estamentos burocráticos autarquizados – setores do Ministério Público, setores do Judiciário, setores da Polícia Federal – associados à grande imprensa – operam no sentido da desestabilização do governo.

Juiz de estranha jurisdição nacional preside como se delegado fosse inquérito que lhe caberia sanear e julgar com isenção; procuradores, promotores e juízes, até mesmo ministros de tribunais superiores, antecipam juízos sobre pessoas que estão sendo ou serão por eles julgadas, a prisão preventiva é transformada em instrumento policial que visa a obter delações premiadas.

A imprensa, irresponsável em sentido pleno, transforma o acusado em condenado sem sursis e o submete à execração pública irreparável. O Congresso, comandado política e ideologicamente por uma oposição numericamente minoritária, opera o desmonte das conquistas sociais das últimas décadas.

O governo, nascido das bases populares da sociedade, opta pelo acordo de cúpula com os Partidos, tornando-se prisioneiro de uma base parlamentar infiel, desleal e extremamente cara.

Necessitado do apoio social, faz concessões às forças conservadoras; afasta-se das massas sem demover a direita de seu projeto golpista.

Quem não se inspira na história está condenado a repeti-la, repetindo seus erros.


Fonte (artigo de Roberto Amaral): http://www.cartacapital.com.br/politica/brasil-de-golpe-a-golpe

Mesmo assim, pode-se dizer que desde 15 de novembro de 1889, a República Brasileira nunca respirou em sua plenitude a democracia, a qual, como o próprio nome designa, em grego (dēmokratía), é o "governo do povo" ou "da maioria". O mesmo aplica-se à "república", que significa, em latim, “bem ou coisa pública” (res publica).

Tanto em repúblicas quanto em monarquias constitucionais (a exemplo da Suécia e Japão, monarquias realmente democráticas), o que existem, na prática, são níveis de democracia. 

Pode-se dizer, por fim, que haverá democracia onde exista soberania popular efetivamente exercida, não importa através de que meios institucionais. [...] O que é necessário é que, para avaliarmos se um determinado Estado é democrático, vejamos, em cada caso, qual o grau de liberdade dos cidadãos, qual o grau de estabilidade e vigor das instituições políticas, qual o grau de participação popular nas decisões públicas, qual o grau de responsabilidade do governo perante os cidadãos, quais os mecanismos de controle real dos abusos de poder, qual a flexibilidade das instituições básicas para atender à exigência de mudanças pacíficas derivadas da vontade popular e uma série de outros aspectos correlatos. Assim, provavelmente, chegaremos à conclusão de que existem muitas democracias, nenhuma delas perfeita em função dos critérios abstratos que desenvolvamos, algumas mais aproximadas deles, outras mais distantes.

[RIBEIRO, João Ubaldo. Política; quem manda, por que manda, como manda. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, pp. 104-5]


A Democracia Pregada X A Democracia Praticada

O filósofo contemporâneo francês Jacques Rancière "rompe" (termo usado com frequência pelo filósofo) vários mitos construídos para inventar aquilo que acreditamos ser uma democracia. De saída, o conceito "pode significar diversas coisas bastante diferentes e contraditórias". E eis outros mitos rompidos: o sufrágio universal e a subsequente representação não são uma forma democrática através dos quais as pessoas exprimem suas preferências políticas. De fato, a alternância entre os partidos Democrata e Republicano nos Estados Unidos, ou entre a direita e os socialistas na França, é apenas uma escolha das minorias. O liberalismo anglo-saxão defendido por essas minorias é antidemocrático, visto que a igualdade, ou pelo menos a possibilidade de igualdade, é um princípio fundamental da democracia.


Leia a entrevista de Rancière: http://www.cartacapital.com.br/revista/819/a-falacia-democratica-198.html

Uma análise, desde Vargas, de como as forças conservadoras sempre se uniram aos meios de comunicação, a fim de manter o status quo contra maiores participações populares no poder e melhorias significativas ao povo: http://jornalggn.com.br/noticia/vargas-jk-jango-lula-dilma-e-a-oposicao-ao-desenvolvimento 


CARTÉIS E CORONÉIS DA MÍDIA, o loteamento nas comunicações


A Constituição Federal de 1988 é objetiva em seu artigo 54 no que diz respeito à proibição da concessão de frequência em rádio e TV. Entre outras coisas, diz a legislação, o parlamentar não pode ser dono de “concessionária de serviço público”. Porém, a realidade é bem distinta do texto constitucional e inúmeros deputados são donos de rádios e TV, o que configura abuso poder, já que os detentores de meio de comunicação expressam a partir de suas frequências posições políticas que lhe favoreçam, deixando os seus adversários em pé de desigualdade na disputa.


Fonte: http://revistaforum.com.br/digital/179/coronelismo-eletronico-partidos-contra-regulacao-da-midia-sao-os-campeoes-de-concessao-em-radio-e-tv/


EM TEMPOS DE DEMOCRACIA, A NOVA CENSURA NA IMPRENSA VEM ATRAVÉS DA POLÍTICA JURÍDICA E DO DINHEIRO


É óbvio que os grupos de mídia têm lado. Denunciam o lado contrário e poupam os aliados.

Doutrinariamente, procuradores entendem que qualquer denúncia da imprensa deve virar uma representação. Mas só consideram imprensa o que sai na velha mídia. Doutrinariamente, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) criou um grupo para impedir o uso de ações judiciais para calar a mídia. Mas só consideram jornalismo a velha mídia.

Cria-se, então, um amplo território de impunidade para aqueles personagens que se aliam aos interesses da velha mídia. E aí entra o papel da nova mídia, blogs e sites, fazendo o contraponto e estendendo a fiscalização àqueles que são blindados pela velha mídia.


Fonte: http://jornalggn.com.br/noticia/a-ameaca-a-liberdade-de-imprensa

Nosso regime republicano, ao longo do tempo, foi manipulado por diversas práticas, tanto democráticas quanto autoritárias, e serviu a diferentes intenções.

A República Brasileira ainda possui muitos ranços antidemocráticos, como a obrigatoriedade do voto (dos 18 aos 69 anos) e do alistamento militar (aos homens de 18 anos).


Uma república realmente democrática jamais deve servir apenas a militares de alta patente, latifundiários, grandes empresários ou financistas, demais elites ou interesses estrangeiros, o que, infelizmente, ainda perdura: a histórica plutocracia brasileira, o governo dos mais ricos e poderosos.

A favor da democracia, precisamos de reformas que tornem o jogo eleitoral mais justo. Veja o exemplo de uma superpotência em democracia, a Suécia:

(...)Campanhas políticas na Suécia são mais focadas em projetos concretos de governo, em comparação com outros países onde o foco está em campanhas negativas e agressivas, como por exemplo comprar espaço na TV apenas para dizer como os seus adversários são ruins”, diz Larsson.

Penso que temos na Suécia um respeito comum pela democracia, que espero que possamos manter. Todos os partidos políticos lutam pelo poder, mas mantendo o respeito mútuo”, acrescenta ele.(...)

(...)Sobre as campanhas milionárias que se produzem no horário eleitoral político do Brasil, Jan Larsson diz que é preciso ter cautela: ”Seria um absurdo da minha parte expressar opiniões pessoais sobre a democracia brasileira, mas naturalmente é preciso ter-se muito cuidado em permitir que o dinheiro controle a informação. Especialmente quando não se tem um sistema rígido para controlar quem financia os partidos políticos. Se a distribuição de recursos para os partidos é justa, então todos têm as mesmas oportunidades. Mas quando você permite que grandes empresas e organizações controlem o financiamento dos partidos, põe-se em risco uma coisa extremamente fundamental, que se chama democracia.

O que deve vencer uma eleição é o melhor argumento, e não a carteira mais gorda”, opina o estrategista.


Leia o artigo: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/eleicao-na-suecia-rivais-nao-fazem-ataques-pessoais-e-dividem-material/

A DEFICIÊNCIA DA DEMOCRACIA BRASILEIRA QUANTO A REPRESENTATIVIDADE


QUOCIENTE ELEITORAL NO CONGRESSO 
(e por extensão as demais casas legislativas)


MENOS DE 10% DOS DEPUTADOS FEDERAIS FORAM ELEITOS DIRETAMENTE PELO POVO (dados a partir das eleições de 2014)

... a grande maioria não foi eleita com votos diretos de seu eleitor. Apenas 36 dos deputados federais brasileiros eleitos em 2014 conseguiram os votos de urnas necessários para obter uma das 513 cadeiras da Câmara na atual legislatura. Isso quer dizer que só 7% dos parlamentares superaram o mínimo necessário de votos – o chamado quociente eleitoral – para garantir um espaço na Casa legislativa, o mesmo número da eleição de 2010. E os outros 477? Como chegaram lá?

Diferentemente das eleições para governador ou presidente, que funciona pelos votos da maioria (eleição majoritária, ou, vence quem tem mais votos no primeiro turno, e 50% dos votos mais um se houver segundo turno), deputados e vereadores se elegem pelo sistema proporcional. O tal quociente eleitoral define o jogo: a soma das vagas de deputados dividido pelo número de votos válidos durante uma eleição. É esse número mágico que define quem passa pelo crivo popular direto de fato.

Os demais 477 acabam entrando beneficiados pelo número que ultrapassa esse quociente e que pode ser distribuído para outros parlamentares do partido dos candidatos mais votados. Os votos de legenda, por exemplo, entram nessa conta do quociente eleitoral. É por isso que as legendas apostam nos chamados “puxadores de votos”: nomes mais famosos que atraem atenção dos eleitores.

Em 12 das 27 unidades da federação, os eleitos em 2014 tiveram de contar com votos que não eram seus, mas que foram dados aos seus partidos ou companheiros de coligação (parceria entre dois ou mais partidos). O Distrito Federal foi um desses locais. O cálculo para eleger um deputado aqui era assim: dividiu-se os 1,45 milhão de votos válidos por oito, que é o número de parlamentares locais. Chega-se ao quociente de 187.100. Só está eleito quem tiver essa votação. Quem não a tiver, precisa somar os votos dos companheiros de coligação ou os de legenda.

Sistema proporcional X majoritário

O debate sobre o modelo de votação é complexo porque a alternativa 'lógica', num primeiro momento, parece ser que a votação por maioria, como a para governador ou presidente ou senadores, fosse mais justa também para os deputados. Mas, cientistas políticos explicam que esse modelo enfraqueceria os partidos e deixaria de fora segmentos importantes da sociedade. “Imagine o que aconteceria com um candidato que defendesse bandeiras LGBT”, pergunta o cientista político Vivaldo de Sousa.

Há, também, um lado do próprio eleitor brasileiro que não se interessa tanto em quem está no Legislativo, ficando mais preocupado em quem será seu presidente ou Governador.


Fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/04/19/politica/1461023531_819960.html

Historicamente, a elite conservadora brasileira não se vê como parte da construção de um país mais igualitário. Pelos motivos óbvios – e porque está acostumada a receber, não a dar. Assim, ter seus estudos, por exemplo, financiados pelo conjunto da população brasileira (através da disparidade referente ao pagamento real de impostos embutidos, sobretudo, em bens e serviços) é interpretado como parte dos seus "direitos" – não como algo que pressupõe também um dever ou uma contrapartida.

Sobre o “nojo” a meninos negros e pobres e a covardia de uma elite vazia: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/01/sobre-o-nojo-meninos-negros-e-pobres-e-covardia-de-uma-elite-vazia.html

O país, de fato, está mudando. Mas o que parece não mudar nunca é a ideia de um ‘apartheid’ social que enche os olhos da classe média alta brasileira, incomodada em dividir o mesmo ar que segmentos antes marginalizados [Redação do site Pragmatismo]. Como vemos em artigos infelizes de jornalistas elitistas: http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/01/por-que-os-pobres-incomodam-tanto/


A Elite Brasileira ainda é dos "Sinhôs" e "Sinhás"

O que os americanos e ingleses mais sofisticados têm em comum? Cultura [conhecimento, alta instrução e educação].

Livros e dinheiro são uma mistura perfeita para elegância, savoir faire e bom gosto.

Infelizmente o Brasil, que copia tanta coisa destes dois grandes países, não aprendeu a copiar essa ainda. A pobreza do rapaz rico dos camarotes, estampada na capa da Vejinha, mostra uma classe alta inculta que beira as raias do constrangimento num país cheio de desigualdades.

[...]

Dinheiro sem livro faz garotos ruidosos e meninas caladas. Gente mal vestida com as melhores grifes. E que não sabe se comportar no mundo.

Gente caipira.

A começar, não sabem falar inglês, inaceitável num mundo global. O mais lamentável ainda é que falam mal português também.

A vida social em Nova York e Londres se passa dentro de universidades e museus, misturando caridade, diversão e cultura. Quando você conversa com pessoas como Tina Brown e Arianna Huffington, elas não são apenas locomotivas sociais, elas são enciclopédias vivas. Sem cultura e sem refinamento intelectual, seremos sempre sinhozinhos e sinhazinhas capiras  mesmo que a gente compre todas as roupas, relógios, fivelas, todos os aviões e carros do mundo.

Este país, apesar de todos os desafios que tem, já é um gigante global. E além de uma nova classe média, ele precisa de uma nova classe alta.

Harvard, Yale, Stanford, Oxford, Cambridge… são centros sociais desse mundo moderno. É lá nessas escolas que se formam o establishment social que vai influir no mundo. No Brasil, nós ainda achamos que esse establishment se forma em Nammos, em Mikonos, ou no Club 55, em St.-Tropez.

[...]

Mas em tudo que forem fazer terão a marca indelével da boa educação. E é isso, educação, que nós, a elite, desejamos e cobramos tanto para os pobres que eu cobro para os ricos. Porque é elite estudada, culta e sensível um dos maiores luxos que este país mais precisa.

Trecho de artigo de Nizan Guanaes.


Fonte: http://siterg.terra.com.br/post/2014/03/18/procura-se-uma-nova-classe-alta-por-nizan-guanaes/


MERITOCRACIA PRA QUEM, CARA-PÁLIDA?!
(no mundo e no Brasil)

... nos Estados Unidos, a pátria da ideologia em torno das “oportunidades iguais”, virou piada falar em meritocracia. Pelo simples motivo de que os filhos dos ricos e poderosos estão cada vez mais aptos a ganhar mais dinheiro e poder que os demais.

Claro que as elites econômicas, em todo lugar, sempre souberam se perpetuar e o nepotismo nunca deixou de ser um instrumento à mão.

Mas agora os americanos se deram conta de que a fração privilegiada das crianças e adolescentes, aquela cujos pais têm curso superior, dinheiro e boa rede de relações, é a que se encaixa melhor nos critérios meritocráticos.

Em outros termos: alguns “merecem” mais do que outros.


O artigo completo: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/flavio-moura/ate-a-biblia-do-liberalismo-reconhece-que-a-194501069.html


O ATAQUE CONSERVADOR CONTRA O MODELO EDUCACIONAL DE PAULO FREIRE É TAMBÉM CONTRA A CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE MAIS JUSTA

“Chega de doutrinação marxista. Basta de Paulo Freire”. “É preciso colocar Paulo Freire em seu devido lugar, que é o lixo da história”. Esses foram alguns ecos decorrentes das manifestações contra o governo do PT [em março 2015], que reuniram pessoas nas ruas de várias capitais brasileiras.

Por que Paulo Freire incomoda? A quem? O que esses discursos revelam? Levamos os questionamentos a alguns especialistas, com o intuito de resgatar parte da história e da contribuição do educador pernambucano, declarado patrono da educação brasileira.

O rechaço a Paulo Freire não é novidade e tampouco recente. Tem início já nos fins dos anos 1950 e começo da década de 1960, momento em que o educador idealiza a educação popular e realiza as primeiras iniciativas de conscientização política do povo, em nome da emancipação social, cultural e política das classes sociais excluídas e oprimidas. Sua metodologia dialógica foi considerada perigosamente subversiva pelo regime militar, o que rendeu a Freire o exílio. O educador, entretanto, não deixou de produzir e nesse período escreveu algumas de suas principais obras, dentre elas, a Pedagogia do Oprimido.

Miguel Arroyo [professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais] entende que as manifestações atuais contra o educador só mostram que os setores conservadores continuam tão reacionários quanto na época da ditadura. “E isso surge em um momento em que o partido político que está no poder foi eleito, majoritariamente, pelo cidadão pobre, negro, nordestino. A rejeição a Freire, a meu ver, revela uma questão premente de nossa história de reconhecer ou não o povo como sujeito de direitos”, garante, ponto sobre o qual o educador se apoia para chamar a pedagogia freiriana de “pedagogia dos oprimidos concretos”.

“O que caracteriza a nossa história é não reconhecer os indígenas, os negros, os pobres, os camponeses, os quilombolas, os ribeirinhos e os favelados como sujeitos humanos”, condena o educador.Em sua análise, essa crença serviu, ao longo da história, como justificativa ideológica para que as classes dominantes escravizassem e espoliassem esses setores sociais. “Tudo isso a partir de uma visão de que somos o símbolo da cultura, civilidade e os outros a expressão da sub-humanidade, subcultura, imoralidade. É isso que nos acompanha ao longo da vida e Paulo Freire se contrapôs a isso, inverteu esse olhar”, analisa Arroyo.

O que ele considera “como um dos pontos mais radicais e politicamente avançados de Freire” é a valorização da cultura, das memórias, dos valores, saberes, racionalidade e matrizes culturais e intelectuais do povo, contrapondo-se à lógica de que era necessária a inferiorização de uns para garantir a dominação de outros. Na educação, sobretudo, essa radicalidade implica em enfrentamentos. “Existe a ideia de que nós, cultos, racionais, conscientes, vamos fazer o favor de, através da educação, conscientizar o povo; para Freire não se tratava de conscientizá-los, moralizá-los, mas de reconhecê-los como sujeitos de uma outra pedagogia, capaz de dialogar com essas culturas, identidades e histórias”, esclarece Arroyo.

Leia o artigo completo: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/04/por-que-e-a-quem-paulo-freire-incomoda.html

IMPOSTOS

Aliás, há uma enorme disparidade quanto ao impacto sobre o pagamento de impostos entre os que possuem maior e menor renda (ricos e pobres), pois os últimos (sobretudo quanto aos poucos benefícios recebidos) são os que mais "sentem nos ombros o peso do sustento da nação". Dever e contrapartida, como se sabe, são para os outros. Eis uma fonte que retifica isso não apenas no Brasil: 
http://outraspalavras.net/blog/2013/07/11/sonegar-esporte-global-das-elites/

O Brasil pode não ter os mais altos impostos do mundo, mas, com certeza, é um dos mais desiguais na hora de cobrá-los e de distribuir seus benefícios. Vide o artigo: http://www.cartacapital.com.br/blogs/outras-palavras/um-mito-e-algumas-verdades-sobre-os-tributos-no-brasil-5576.html

http://mariomarcos.wordpress.com/2014/01/03/ricos/


As casas-grandes e senzalas contemporâneas: condomínios de luxo, do bairro e praia de São Conrado, com a favela da Rocinha ao fundo (Rio de Janeiro-RJ). O abismo econômico-social, causado pela péssima distribuição de renda e de poder político, é um dos maiores problemas que acompanham o Brasil desde o Descobrimento. Os governantes e as elites (representadas pelos primeiros) nunca favoreceram a maior parte da população. Continuamos uma Belgíndia: uma bélgica rica dentro de uma índia pobre.


[...] com as políticas sociais do governo do PT a desigualdade diminuiu, pois segundo o IPEA os 10% mais pobres tiveram entre 2001-2011 um crescimento de renda acumulado de 91,2% enquanto a parte mais rica cresceu 16,6% [seria tal governo um robin hood, que tirou dos ricos para dar aos pobres? Evidente que não]. Mas essa diferença não atingiu a raiz do problema pois o que supera a desigualdade é uma infraestrutura social de saúde, escola, transporte, cultura e lazer que funcione e acessível a todos.

Não é suficiente transferir renda; tem que criar oportunidades e oferecer serviços, coisa que não foi o foco principal do Ministério do Desenvolvimento Social. O "Atlas da Exclusão Social" de Márcio Poschmann (Cortez 2004) nos mostra que há cerca de 60 milhões de famílias, das quais cinco mil famílias extensas detém 45% da riqueza nacional. Democracia sem igualdade, que é seu pressuposto, é farsa e retórica.

Fonte: Trecho de artigo de Leonardo Boff no jornal Pôr do Sol, nº 68, fev. 2014, p.06 (com adição).

A partir da década de 1990, o Brasil, como outros países periféricos, foi inserido na política econômica internacional chamada neoliberalismo. Esse modelo priorizava os interesses do grande capital, sobretudo estrangeiro, sobre a jurisdição que defendia os interesses do bem-estar da população local, a exemplo dos direitos trabalhistas e de assistência social. O neoliberalismo, nas palavras de Rafael Vinícius Losso (ex-jornalista da MTV Brasil),

... aplicado em países em desenvolvimento, é uma doutrina neo-colonial, que visa apenas manter a pobreza e a carência de infraestrutura, bem-estar social e soberania nessas sociedades, usando o disfarce da modernização, do acesso aos bens industrializados dos países centrais, da inclusão no grupo dos ricos. Sob o manto da mentira, a privataria*, a corrupção e a violência policial acontecem em silêncio, sem repercussão na tal grande mídia.Um jogo triste, perverso e que, por pouco, não estamos jogando.

*Onda de privatizações de empresas públicas sem gerar reais benefícios à nação.

O imposto justo sobre grandes patrimônios aliviaria a carga tributária para a maior parte da população brasileira que paga a conta dos mais ricos:

... há brasileiros e brasileiros. Em 2011, a carga tributária bruta chegou a 35,31% do PIB. No Brasil os impostos indiretos, como o IPI e o ICMS, representam 49,22% do total da carga tributária. Como se sabe, esses impostos incidem sobre os gastos da população na aquisição de bens e serviços, independentemente do nível de renda. Pobres e ricos pagam a mesma alíquota para comprar o fogão e a geladeira, mas o Leão “democraticamente” devora uma fração maior das rendas menores. Os chamados encargos sociais representavam 25,76% da carga total e o ônus estava, então, distribuído entre empregados e empregadores.

Já o Imposto de Renda contribui com parcos 19,02% para a formação da carga total, enquanto os impostos sobre o patrimônio são desprezíveis, sempre empenhados a beneficiar a riqueza imobiliária e financeira dos mais ricos. As estimativas sobre a distribuição da carga tributária bruta por nível de renda mostram que ,enquanto os que ganham até dois salários mínimos recolhem ao Tesouro 53,9% da renda, os que ganham acima de 30 mínimos contribuem com 29,0%. “A quem tem, mais se lhe dará, e terá em abundância; mas, ao que quase não tem, até o que tem lhe será tirado.” Feliz ajuste fiscal.

http://www.cartacapital.com.br/revista/832/feliz-ajuste-fiscal-1731.html

OS SUPER-RICOS DO BRASIL, 
"O RIO CORRE PARA O MAR" OU 
A DESIGUALDADE EM FORMA DE TRIBUTOS

Os ricos do Brasil são muito mais ricos do que você imagina. São super-ricos. E ficam mais e mais ricos a cada dia que passa. Existem duas razões principais para isso. Os impostos da classe média e dos pobres vão para o bolso dos ricos. E os ricos pagam menos imposto que a classe média e os pobres.

Só agora a gente está entendendo quem são os super-ricos do Brasil. A análise tradicional, feita com as pesquisas do IBGE, não dão conta da realidade. Um novo estudo realizado pelos economistas Rodrigo Orair e Sérgio Gobetti, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), chega mais perto. Eles  analisaram os dados das declarações de imposto de renda das pessoas físicas. As conclusões são chocantes.

Segundo o IBGE, a renda média do 1% mais rico do país foi de R$ 214 mil em 2012. Mas segundo o estudo do IPEA, a renda anual do 1% mais rico é aproximadamente R$ 575 mil. Explicação: o IBGE não capta toda a renda das pessoas mais ricas, que tem muitas rendas provenientes do capital (como aplicações financeiras, aluguéis, lucros e dividendos).

R$ 575 mil já é uma boa grana: mais de R$ 40 mil por mês. Mas esses 1% ainda não são a elite. Os super-ricos do Brasil ganham acima de 160 salários mínimos por mês. São 0,05% da população economicamente ativa.

Os super-ricos brasileiros possuem um patrimônio de R$ 1,2 trilhão. Isso é 22,7% de toda a riqueza declarada por todos os contribuintes do Brasil. Essas 71.440 pessoas têm renda anual média de R$ 4.17 milhões, uns R$ 350 mil por mês. Tiveram em 2013, ano analisado pela pesquisa, um rendimento conjunto de R$ 298 bilhões.

E em 2015? Não sabemos, mas é seguro dizer que estão bem mais ricos que em 2015. Quem tem muito capital investe e recebe rendimentos financeiros enormes. Os juros no Brasil são sempre muito altos, mas agora estão estratosféricos. Trabalhar não tem nada a ver com a fortuna crescente dessa turma. Neste nível de renda, trabalha quem quer, não porque precisa.



Qual o negócio mais lucrativo e seguro do Brasil? Emprestar dinheiro para o governo. No Brasil, como na maioria dos países, as contas públicas não fecham no final do ano. Se você tem muita grana, não precisa de criatividade para enriquecer mais e mais. Basta comprar títulos públicos do governo, que paga juros altíssimos para financiar sua dívida. E de onde vem esse dinheiro para pagar os juros? Do Tesouro Nacional, dos impostos que todos os brasileiros pagam.

Mas alguns pagam mais que outros. O detalhe mais cruel sobre a desigualdade brasileira está aí. Os super-ricos brasileiros, esses que ganham mais de 160 salários mínimos por mês, pagam só 6,51% de sua renda de imposto de renda. Você leu certo. Um assalariado que ganhe R$ 5 mil por mês paga 27,5% de imposto de renda. A elite paga 6,51%, como demonstra o estudo do IPEA.

Como isso é possível? É que 65,8% da renda total desses super-ricos são rendimentos considerados isentos e não-tributáveis pela legislação brasileira. É o caso dos dividendos e lucros. Na prática, o imposto de renda aqui só é progressivo do pobre até a classe média, que é justamente a fatia da população que mais paga imposto de renda. É uma receita perfeita para aumentar cada vez mais a desigualdade social no Brasil. É garantia de injustiça, ignorância, violência. E até de atraso em outros campos. Se fala muito que o Brasil tem pouca inovação tecnológica, mas quem vai arriscar capital investindo em inovação, se você pode faturar com juros altos e não pagar quase nada de imposto?

Essa bizarria cruel é criação brasileira. Todos os países decentes, sejam ricos ou emergentes, tributam todos os rendimentos das pessoas físicas. Não interessa se a renda do salário, de aluguel ou de dividendos. É o justo. É o mais eficiente para o bom funcionamento dos países.

O estudo do IPEA não captura com precisão absoluta a pirâmidade social brasileira. Não dá conta de dinheiro escamoteado, de caixa 2 ou remessas enviadas ao exterior. Mas já dá uma noção do tamanho do escândalo. Agora, como é focado no Imposto de Renda, não leva em consideração outra grande injustiça do nosso sistema tributário, que são os impostos indiretos.

Os super-ricos pagam o mesmo imposto sobre produtos que você, eu ou a vovó que recebe Bolsa Família. Pagam o mesmo imposto pelo arroz, o café, o remédio, o fogão. Isso significa que proporcionalmente o pobre paga muito mais imposto a classe média. E infinitamente mais que a elite.

[...] existem super-ricos que atuam diretamente para que esse estado de coisas continue exatamente assim: juros altíssimos e taxação mínima. Basta isso para os donos do capital ficarem mais e mais ricos a cada ano que passa, sem trabalho, sem esforço, sem contribuir para o país.

Os super-ricos têm muito poder. Influenciam muito no debate político e econômico. Abundam na imprensa argumentos a favor de que as coisas se mantenham como são. E são super-ricos os financiadores das campanhas da maioria dos políticos, claro.

A recessão radicaliza a injustiça. Penaliza o trabalhador e o empreendedor, o importador e o exportador, o estudante e o aposentado. Esta recessão não veio do espaço sideral. Foram tomadas decisões erradas no passado? Claro, muitas, desde 1500. Mas não dá para mudar o passado. O futuro felizmente está ao nosso alcance.

Matéria completa de André Forastieri: http://jornalggn.com.br/noticia/como-financiamos-os-super-ricos-brasileiros-por-andre-forastieri

ESSAS "JABUTICABAS" SÃO CARAS DE MAIS PARA O POVO BRASILEIRO

Dados recém-divulgados pela Receita Federal mostraram como os ricos pagam pouco imposto no Brasil. Uma das principais razões da boa vida é uma lei prestes a completar vinte anos, a 9.249. Ela garante duas alegrias ao andar de cima. Isenta de Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) o dinheiro recebido por donos e acionistas de empresas na forma de lucros e dividendos. E permite às firmas inventar uma despesa, os juros sobre capital próprio, para reduzir o lucro sobre o qual pagam Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)

Trata-se de verdadeiras “jabuticabas tributárias”, raríssimas pelo mundo, segundo o economista Rodrigo Orair, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do International Policy Centre for Inclusive Growth, uma parceria entre o governo e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

Em entrevista a CartaCapital, o economista explica a injustiça da tributação nacional, defende o fim das “jabuticabas” e desmonta os argumentos de que o fim da isenção seria bitributação. Para ele, o ajuste fiscal seria mais saudável, caso o governo mexesse nas “jabuticabas”. Atacar somente uma delas, a isenção dos lucros e dividendos, poderia render até 50 bilhões de reais por ano.

[...]

CC: O economista José Roberto Afonso acredita que a isenção tributária dos lucros e dividendos está encobrindo um processo de concentração de renda no País. Concorda?

Orair: Sem dúvida. A isenção é a principal responsável pelo fato de os muito ricos pagarem pouco imposto no Brasil e contribui para a concentração no topo da distribuição de renda.

CC: Então deveríamos deveria retomar a cobrança de IRPF sobre os rendimentos hoje isentos pela lei 9.249?

Orair: Sim. Promover justiça tributária é uma questão de cidadania. Um exemplo didático. Tomemos o estrato intermediário dos declarantes do imposto de renda em 2013, cerca de 1,5 milhão de pessoas com rendimentos anuais entre R$ 162,7 mil e R$ 324,4 mil. Em média, um cidadão desse estrato paga ao fisco 11,5% do total da sua renda. A situação é muito distinta no topo. Os muitos ricos, 71.440 pessoas de renda média de R$ 4,2 milhões, pagam apenas 6,1%. Se o cidadão paga muito imposto no Brasil ele mais provavelmente pertence à classe média do que aos muito ricos.

[...]

CC: Em um país com tradição de taxar pouco a renda e o patrimônio, não chega a surpreender a existência de tais jabuticabas.

Orair: Exato. Como manter uma das sociedades mais desiguais do planeta? Isso requer estruturas e instituições voltadas para perpetuação do statos quo. A estrutura tributária é uma delas. Os sistemas político e judiciário são outros. Recentemente, a senadora Gleisi Hoffmann [do PT do Paraná] retirou de uma medida provisória a emenda que poderia acabar com os juros sobre capital próprio, argumentando que não há ambiente político para avançar em tais temas. Nosso Judiciário pode ser progressista em certas pautas de direitos civis, mas não é em temas relacionados à progressividade tributária. Aceitar alíquotas progressivas do IPTU foi uma luta que durou anos e ainda sofre contestações jurídicas. Alguns estados seguem batalhando para conseguir estabelecer alíquotas progressivas do imposto sobre herança. Imagina como seria com um imposto sobre grande fortunas.

CC: Por que o Brasil historicamente prefere taxar o consumo em vez da renda e do patrimônio? Isso revela o que sobre a sociedade brasileira?

Orair: O Brasil é uma experiência bastante curiosa. Por um lado, há um conservadorismo arraigado em relação ao papel progressivo da tributação. Por outro, o País se propôs a construir um Estado de bem-estar social que, com todos seus problemas, desempenha papéis importantes na redistribuição de renda via benefícios sociais e assistenciais e na oferta de serviços sociais básicos (saúde, educação e assistência). Isto tem um custo. Como fechar a conta? Via tributação sobre bens e serviços, que tem um caráter mais invisível, um caminho de menor resistência. O grande problema é que aqueles que mais pagam impostos sobre bens e serviços são justamente os mais pobres, que precisam consumir quase toda sua renda para suprir as necessidades mais básicas. Grande parte da ação redistributiva do Estado brasileiro acaba se resumindo a enxugar gelo. O Estado retira com uma mão dos mais pobres aquilo que devolverá com a outra.



DE IMPOSTO SONEGADO À LAVAGEM DO CRIME, OS BRASILEIROS NA SUÍÇA:

Ter conta na Suíça não é crime. O dinheiro que a abastece pode ter origem nele. Entre as 106 mil contas do HSBC suíço, 50% estão em nome de seus proprietários, 35% são contas numeradas (um artifício para esconder seu titular) e 15% são vinculadas a empresas no exterior, em geral criadas em paraísos fiscais (outra maneira de esconder o dono do dinheiro.).

No caso das contas ligadas a brasileiros, 70% são numeradas e 10% vinculadas a empresas em paraísos fiscais. Somente 20% estão em nome do seu titular. No mínimo, uma forma suspeita de guardar dinheiro. O valor máximo encontrado em uma das contas de brasileiros atingiu US$ 320 milhões [em 2014].

Ler em: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/plinio-fraga/no-escandalo-da-hscb-suico-80-das-contas-de-142939109.html

NO BRASIL, SONEGAÇÃO É MAIOR DO QUE CORRUPÇÃO

Deixa-se de recolher 500 bilhões de reais por ano aos cofres públicos no País, ao passo que o custo anual médio da corrupção no Brasil, em valores de 2013, corresponde a 67 bilhões anuais.

Nenhum assunto rivaliza com as notícias sobre corrupção na cobertura e no destaque dados pela mídia, um sinal da importância devidamente atribuída ao problema pelos cidadãos. Males de proporções maiores, porém, continuam na sombra. A sonegação de impostos, por exemplo, tem sete vezes o tamanho da corrupção, mas recebe atenção mínima da sociedade e do noticiário.

[...]

A livre atuação no Brasil das empresas off shores, ou registradas em paraísos fiscais, agrava a sonegação. Há laços fortes do País com esses redutos de burla dos fiscos dos estados nacionais, na prática nossos grandes parceiros comerciais. A principal razão é o tratamento preferencial dado ao capital externo, subtaxado quando da sua remessa de lucros ao exterior, afirma-se no site Tax Justice Network.

[...] explica a Receita Federal. “A definição de paraíso fiscal na legislação brasileira não leva em conta apenas a tributação de ganhos de capital, mas sim a tributação da renda. A tributação da renda das pessoas físicas é de 27,5% e das pessoas jurídicas é de 25% de imposto de renda, mais 9% de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.” Mas a taxação de ganhos de capital, “em regra de 15%”, é baixa em termos mundiais e o trânsito do dinheiro é facilitado pela parceria comercial com os paraísos fiscais.

Pessoas físicas recorrem também aos paraísos fiscais para não pagar impostos sobre os seus ganhos, lícitos ou não [...].

[...]

Os impostos mais sonegados são o INSS, o ICMS, o imposto de renda e as contribuições sociais pagas com base nas declarações das empresas. Os impostos indiretos, embutidos nos produtos e serviços, e o Imposto de Renda retido na fonte, incidentes sobre as pessoas físicas, são impossíveis de sonegar. A pessoa jurídica cobra os tributos, mas algumas vezes não os repassa ao governo.

[...]

Quem tem mais, deve pagar mais, estabelece a Constituição, em um preceito tão desobedecido quanto o do Imposto sobre Grandes Fortunas, à espera de regulamentação. Nesse assunto, o Brasil está na contramão. A partir de 2012, com a piora da economia e da arrecadação, países europeus que haviam concedido desonerações tributárias e cortado gastos, voltaram a aumentar o imposto de renda nas alíquotas mais altas e elevaram os impostos sobre propriedade, diz a professora Lena Lavinas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

“Aqui, não conseguimos fazer isso porque o IPTU não é arrecadado pela União, mas pelos municípios, então você não mexe na propriedade. Impostos que tratam da concentração da renda, do patrimônio, deveriam estar nas mãos da União. A reforma tributária, segundo algumas visões do Direito, é tratada como uma questão de simplificação. Não é o caso, muito pelo contrário, tem que complexificar mais, dentro de uma estrutura adequada em termos de progressividade, de taxar realmente o patrimônio, os ativos, essa coisa toda.”

[...]

A sonegação é uma possibilidade aberta para as empresas pela estrutura tributária, conforme mencionado acima, e quando pegas, são beneficiadas pela discrição das autoridades. Também nesse quesito, o Brasil segue na contramão. Nos Estados Unidos, por exemplo, os próprios políticos tratam de alardear os nomes das empresas flagradas em irregularidades.

Por que o Brasil, não dá publicidade aos nomes dos grandes sonegadores, o que possivelmente contribuiria para desestimular o não recolhimento de tributos e impostos? Segundo Camargo [presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, Heráclio Camargo], há divulgação, mas ela não é satisfatória. “Existe um sítio na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional que enseja a consulta dos CNPJs ou CFPs dos devedores, mas sem informar quais são os valores devidos. Não temos uma cultura de transparência no Brasil. Essas restrições são inaceitáveis e nós devemos caminhar para uma maior transparência, com a divulgação dos nomes e respectivos valores devidos.”



De acordo com organizações internacionais especializadas, como Tax Justice Network, o Brasil é o 69º país mais corrupto, de um ranking de 175 nações, pesquisadas entre 2011 e 2014, e o 2º que mais sonega no mundo.

MUITO TRIBUTO PRA POUCO BENEFÍCIO

Em 2014, pela quinta vez consecutiva, o Brasil foi o país que proporcionou o pior retorno em qualidade de vida para a sua população através de valores arrecadados com tributos. A conclusão proveio do estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) que comparou 30 países com maior carga tributária em relação ao PIB e verifica se o que é arrecadado pela nações pesquisadas retorna aos contribuintes em serviços de qualidade. O Brasil ficou atrás de, por exemplo, EUA, Austrália, Coréia do Sul, Japão, Bélgica, Argentina e Uruguai. A Recita Federal brasileira revelou que a carga tributária em 2012 ficou em 35,85%.

Leia o artigo em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/04/1434959-brasil-e-o-pior-em-retorno-de-imposto-a-populacao-aponta-estudo.shtml


Quatro das maiores empresas brasileiras pertencem às famílias que se relacionam entre si. O controle de base familiar é uma característica da formação do capital monopolista dos grupos econômicos constituídos no Brasil (João Roberto Lopes Pinto, cientista político da UNIRIO). Mais detalhes: http://www.cartacapital.com.br/revista/805/a-taca-de-assassinatos-e-nossa-4381.html


No Brasil, citando Márcio Pochmann: 

20 mil famílias vivem da aplicação de suas riquezas no circuito da financeirização, portanto, ganharam através da especulação. [...] os 10% mais ricos da população impõem, historicamente, a ditadura da concentração, pois chegam a responder por quase 75% de toda riqueza nacional. Enquanto os 90% mais pobres ficam com apenas 25% (Le Monde Diplomatique, outubro 2007) [Jornal Pôr do Sol, jun. 2014, 07].

O Brasil, segundo órgãos de economia da ONU, chegou ao oitavo lugar, em 2005, no ranking mundial de países mais desiguais em distribuição de riquezas. Porém, as políticas sociais dos últimos dois governos federais (a partir de 2002) fez a desigualdade diminuir em 17%, apesar de continuar bem alta. Piketty e demais estudiosos da economia mundial defendem ações em médio e longo prazo, como a intervenção do Estado e a taxação progressiva sobre os super-ricos em até 80% (fato que os apavora). Algo semelhante ocorreu na França sob o governo de François Hollande, vejamos se o Brasil seguirá esse conceito de crescimento econômico para o bem-estar do povo e não apenas de alguns poucos.

QUEM PAGA A CONTA DO BRASIL SEMPRE FOI O BRASILEIRO POBRE

Eis a prova que o FISCO BRASILEIRO cobra mais de quem ganha menos:

Grande parte da arrecadação brasileira consiste em impostos sobre circulação de mercadorias, bens e serviços, responsáveis por 45% do total da receita, que atingem em maior proporção os contribuintes de menor renda. Além da renúncia fiscal em relação às fortunas, o Brasil tributa de forma pífia a renda e a herança. Hoje sob responsabilidade dos estados, o Imposto de Transmissão Causa mortis e Doação apresenta uma alíquota média de 3,86%, estima a consultoria Ernst & Young. Na França, chega a 60%. O Brasil também não cobra imposto de renda sobre os lucros e dividendos distribuídos por empresas a seus sócios e funcionários.


Leia a reportagem de Miguel Martins: http://www.cartacapital.com.br/revista/842/as-licoes-dos-clientes-do-hsbc-na-suica-2848.html?utm_content=buffer4c6e5&utm_medium=social&utm_source=plus.google.com&utm_campaign=buffer
...

A Constituição atual permite, enfim, que analfabetos possam votar (embora não possam candidatar-se), no entanto, parece lógico que a erradicação do analfabetismo é um dos fatores indispensáveis para que haja avanços sócio-políticos bem maiores no Brasil.

A democracia é um erro estatístico, porque na democracia decide a maioria e a maioria é formada de imbecis (Jorge Luis Borges). Esperamos que o grande autor argentino não tenha tanta razão assim!

Quando reformas que verdadeiramente beneficiam o povo não saem do papel (no âmbito da educação, saúde, transporte, trabalho, tributação, habitação, lazer etc.), quando não há renovação satisfatória nos estratos de decisão política, ou seja, quando notamos que o status quo no Brasil, há mais de 500 anos, continua intocável em sua essência (oligarquias e plutocracias eternas), está mais do que na hora de perguntarmos se a República foi, realmente, proclamada.




Pátria minha… A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra
E urina mar.


Trecho de Pátria Minha, de Vinicius de Moraes, em Poema, sonetos e baladas.

Pátria Amada, 
idolatrada,
salve,
salve-se 
quem puder!

Trecho final da canção Pátria Amada, do grupo brasileiro de punk-rock Inocentes.

Bibliografia:

Nosso Século Brasil. São Paulo: Abril, 1985.


VICENTINO, Cláudio e DORIGO, Gianpaolo. História do Brasil. São Paulo: Scipione, 1997.

Flanando pela Belle Époque carioca [fôlder da exposição do Museu da República]. Rio de Janeiro: 2009.

Nilo Peçanha e a Reação Republicana [fôlder da exposição do Museu da República]. Rio de Janeiro: 2012.


Fotos do Museu Histórico Nacional (Facebook):
http://www.facebook.com/media/set/?set=a.208612672496050.57565.100000419564077&type=1

Neste site, o sociólogo Antônio Cândido indica 20 livros importantes para se conhecer o Brasil no contexto histórico-cultural: 
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/05/20-livros-fundamentais-para-conhecer-o-brasil-2.html

6 comentários:

  1. Obrigado Frank Lucas pela ajuda, suas informações foram muito úteis.

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  2. Amigo, qual a verdadeira localização do enforcamento de Tiradentes?
    Gotei muito dese seu texto e fotos. faltou a foto do local onde foi feita a primeira bandeirada república, na rua benjamin Constant, naquele templo positivista. Grande abraço!

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    1. Infelizmente, amigo Anônimo o local da primeira bandeira, o templo positivista do bairro da glória está em ruínas e o desenho original da bandeira, acho q vc já sabe, foi furtado. Mas esse não é o foco do presente texto. Muito menos o local do suplício de Tiradentes, que, como talvez saiba, foi no extinto Campo de Lampadosa, próximo da praça homônima do mártir da pátria, porém mas para as bandas da atual Praça da República.

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  3. Que rico e maravilhoso material. Muito obrigado!

    - c.a.t.

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